quinta-feira, 26 de abril de 2012

Religião Católica a partir de Macau foi importante para a unificação do país -- jurista



FV - Lusa

Macau, China, 25 abr (Lusa) - Macau teve um papel importante na missão jesuíta no Japão e o catolicismo está muito ligado à unificação daquele país, afirmou hoje o jurista Fernando Vitória, estudioso da epopeia religiosa no final do século XVI.

O investigador, que na quinta-feira profere a palestra "Os 26 mártires de Nagasaki: Macau, Política, Religião e Sangue", parte da execução daquele grupo de cristãos, a 06 de fevereiro de 1597, para abordar as relações entre Portugal e o Japão, já que era a partir de Macau que a "empresa" dos jesuítas preparava a "missão" para o país nipónico, com uma forte vertente comercial.

"A crucificação dos 26 mártires ocorre mais ou menos a meio do século cristão no Japão. E o século cristão no Japão, além de ser particularmente estudado em todo o mundo, para nós portugueses, e para os residentes em Macau mais ainda, é um episódio com muito interesse histórico, sociológico e religioso", disse à agência Lusa o jurista radicado em Macau.

Para Fernando Vitória, "apesar de o episódio ter acabado mal", a execução dos 26 mártires tem um aspeto "contraditório e paradoxal".

"Se não fossem estas perseguições todas, provavelmente a religião católica tinha desaparecido ou estava muito menos viva no Japão do que está agora, sobretudo no sul do país", explicou.

Do "século marcante" na história do Japão, Fernando Vitória destaca as datas de 1614, em que o édito de Hidetada Tokugawa dita a expulsão de todos os missionários e o início da perseguição, tortura e morte dos cristãos; de 1630, em que os japoneses são obrigados a terem certificado de inscrição num templo budista; e ainda de 1637, em que com a rebelião de Shimabara, se assiste ao "fim do cristianismo e política de isolamento" do país.

Fernando Vitória dá ainda o exemplo da ordem de saída dos padres no prazo de 20 dias dada por Toyotomi Hideyoshi, em 1587, "numa altura decisiva da história do Japão, que é a da unificação", e num período em que Portugal tinha uma intervenção "discreta" e "delegada" através de Goa, já que estava sob o domínio espanhol.

"Nesta história do catolicismo no Japão está muito de Portugal, que é uma história que os portugueses não conhecem", resumiu.

Para o jurista, a religião católica deixou "uma semente tão funda, que acabou por construir uma árvore que nunca mais secou, ao contrário de noutros países onde a colonização foi muito fácil e muito rápida, mas em que a religião não é vivida como aqui [Japão]".

"A religião católica está também ligada à unificação do Japão. Com o [Toyotomi] Hideyoshi, os japoneses percebem que é necessário fazer a unificação do Japão, e essa perceção do exterior é dada, em grande parte, pelas conversas das embaixadas que os jesuítas mandavam à corte, sobretudo em Quioto", observou.

Fernando Vitória, que despertou para o tema através do clássico do cinema "Kagemusha - A Sombra do Guerreiro", do cineasta japonês Akira Kurosawa, - onde diz ter percebido a influência dos jesuítas na corte de Oda Nobunaga, o primeiro dos três grandes unificadores do Japão - acredita que este período vai voltar à ribalta agora que Martin Scorcese anunciou que vai fazer a adaptação do livro "Silence", de Shusaku Endo".

Quanto às relações atuais entre Portugal e o Oriente, embora reconheça que estas passam sobretudo pela China, Fernando Vitória considera que há espaço para aprofundar as marcas deixadas pelos portugueses, desde a gastronomia à língua.

"De facto, hoje estamos noutra fase, mas estes laços históricos podem reavivar as ligações entre Portugal e o Japão", concluiu.

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