sábado, 19 de maio de 2012

Moda de pulseiras feitas de preservativos femininos compromete luta contra a sida



André Catueira, da Agência Lusa

Chimoio, Moçambique, 19 mai (Lusa) - Ivete Santos, 16 anos, passa numa rua de Manica, Moçambique, de uniforme escolar, na companhia de amigas, mochila às costas e um brilho no seu pulso esquerdo: seis argolas de preservativos femininos, que ela usa como pulseiras.

"Agora, tornou-se moda andar com estas pulseiras entre as meninas. Veja que no meu grupo (cinco raparigas) só ela não tem. O que me encanta é o brilho que isso tem quanto mais molhas no banho", diz Ivete à Lusa.

A moda de uso de argolas de preservativos femininos entre as raparigas, nas províncias de Sofala e Manica, centro de Moçambique, tem vindo a preocupar as autoridades de saúde, justificando que a "onda das pulseiras" pode comprometer esforços na luta contra a propagação do HIV-SIDA.

Não raras vezes, nas ruas de Chimoio e da Beira, veem-se raparigas com seis a oito "pulseiras" no braço ou o dobro quando optam por usar nos dois pulsos. Cada preservativo feminino tem duas argolas, mas apenas a inferior é aproveitada como "pulseira".

As argolas, geralmente, são retiradas de preservativos femininos de distribuição gratuita, disponíveis em várias instituições públicas e privadas, em cumprimento do plano governamental sobre o acesso aos contracetivos, situação que tem levado ultimamente à escassez deste produto.

Nas clínicas privadas, um preservativo feminino custa em média 70 meticais (1,94 euros).

"Ficámos muito alegres quando começámos a ver os cestos de preservativo feminino vazar, pois achámos que as mulheres já estavam realmente a usar. Mas ficámos estupefactos quando soubemos que são desviados para serem usados como pulseiras", disse à Lusa Aarão Uaquiço, coordenador do Núcleo Provincial de Combate à SIDA (NPCS) de Manica.

A moda tem levado a que alguns jovens desenvolvam negócios com a venda das argolas dos preservativos. Cada argola custa cinco meticais (0,14 euros) e o que não tem faltado são as clientes "candidatas à nova onda".

"Alguns moços aparecem a vender estas pulseiras na escola e muitas meninas costumam comprar porque são bonitas. Não sei onde as apanham, mas sei que no bazar não as tem à venda", explica à Lusa Verónica Bernardo, enquanto exibe o contraste da luz das pulseiras e a pele cor de café.

As autoridades receiam que, com a escassez do preservativo nos locais disponíveis, sobretudo nas instituições públicas, os vendedores e as clientes optem por apanhar preservativos usados, o que pode tornar-se numa ameaça para a sua saúde.

"Temos sido chamados a reforçar os preservativos nalgumas instituições, quer públicas, quer privadas, tal como entregámos agora à polícia cinco mil preservativos", disse à Lusa Esperança Tavele, gestora do programa de HIV/SIDA na Direção Provincial de Saúde (DPS) de Manica.

Estatísticas do NPCS de Manica indicam que, em 2011, 2.478.800 preservativos masculinos e femininos foram distribuídos entre instituições públicas, associações comunitárias e comunidades.

Com uma população estimada em 1.610.728 habitantes, sendo 773.772 homens e 836.956 mulheres, o NPCS pretende alcançar 14 por cento da população vulnerável, ou seja, que cada jovem tenha no mínimo, durante o ano, 48 preservativos. A medida pode ser reduzida com o desvio dos preservativos dos seus fins.

E há muitas crianças em Chimoio, região central de Moçambique, que fazem bolas de futebol a partir de preservativos masculinos, que obtêm junto de familiares ou em campanhas de combate à SIDA, mas também não se importam quando a "matéria-prima" já foi usada.

Governo lembra "epidemia séria" de sida face à redução do apoio externo

Lusa

Maputo, 19 mai (Lusa) - O Conselho de Combate à sida de Moçambique alertou para "uma maior atenção" na luta contra o flagelo face à redução drástica da ajuda externa ao país, que tem pela "frente uma epidemia séria, de grande dimensão".

Desde 2009, os parceiros internacionais baixaram de 2,5 milhões de euros para 825 mil euros o apoio ao Conselho de Combate à sida de Moçambique, apesar de alguns contribuições de larga escala serem direcionadas para o Ministério da Saúde visando atender, essencialmente, aspetos clínicos de tratamento.

Em entrevista à Lusa, a secretária executiva do Conselho Nacional de Combate à Sida (CNCS) de Moçambique, Joana Mangueira, assinalou o impacto das ajudas ao país, onde a sida continua a ser um dos problemas de saúde pública mais sérios. "Estamos conscientes de que, apesar de não haver fundos da comunidade internacional, temos à nossa frente uma epidemia séria, de grande dimensão, uma epidemia que tem uma taxa de prevalência de 11,5 por cento e que continua a ser alimentada, diariamente, por cerca de 450 novas infeções", disse.

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