Orlando Castro*, jornalista – Alto Hama*
E assim, de face oculta em face oculta, quase sempre no calor da noite e entre pérolas negras, lá vai o jornalismo português cantando e rindo a bem dos donos do poder.
“Há uma razão que sintetiza todas as outras: o poder, seja lá de que natureza for, persegue e odeia os homens livres, mas favorece, protege e promove os medíocres e os sabujadores”, afirma, preto no branco, Pinto Nogueira, procurador-geral distrital do Porto (Portugal).
Permitam-me que, tomando como premissa esta basilar afirmação de Pinto Nogueira, vos diga que os poucos jornalistas que existem em Portugal (muitos estão no desemprego) continuam a “chorar” sobre o leite derramado. Ainda pensam que a informação é um bem público.
Deveria ser. Mas é um bem tão público que as forças ditas públicas o querem privado e por isso são, ou procuram ser, donas dos donos dos jornalistas.
“Uma informação livre, pluralista, de qualidade, eticamente responsável e deontologicamente comprometida é essencial ao exercício pleno da cidadania, nas múltiplas dimensões que encerra o direito dos cidadãos à informação consagrado nas convenções internacionais e nas leis constitucionais e nas leis ordinárias dos estados. É através da imprensa livre que as democracias respiram”, diz o Sindicato dos Jornalistas baseado numa utopia que – acredito – gostasse que fosse realidade.
Em Portugal todos sabem que isso é mesmo uma utopia, sobretudo porque não “há imprensa livre”, razão pela qual a democracia só consegue respirar porque está ligada a um ventilador. A qualquer altura, quando mais jeito der aos donos do poder, poderá ser desligada.
Em Portugal, tanto o PS como o PSD chegaram tão cedo ao sector da comunicação social que conseguiram, sem grande esforço e em muitos casos apenas por um pratinho de lentilhas, fazer com que os seus sipaios, titulares, ou não, de Carteira Profissional de Jornalista, fizesse da “imprensa o tapete do poder”.
Chegaram tão cedo que conseguiram, sem grande esforço e em muitos casos apenas por um pratinho de lentilhas, transformar jornalistas em “criados de luxo do poder vigente".
Chegaram tão cedo que conseguiram, sem grande esforço e em muitos casos apenas por um pratinho de lentilhas, garantir que esses criados regressarão mais tarde ou mais cedo (muitos já lá estão) para lugares de direcção, de administração etc..
Mais do que as questões, objectivas ou não, que envolvem o plano de todos os governos para dominar ainda mais a comunicação social, a mim preocupa-me não só a promiscuidade do jornalismo com a política (sobram os exemplos de jornalistas-assessores e de assessores-jornalistas), mas também o enxovalhar da ética, da competência, entre os próprios jornalistas ou, pelo menos, entre os que se dizem jornalistas.
Preocupação pouco relevante num contexto que agora é de todos a monte fé em Miguel Relvas, onde ser enxovalhado pode significar – basta olhar para muitas das Redacções -meio caminho andado para ser director ou administrador. Portanto...
Em matéria de jornalistas, a ética e a competência tornaram-se aquele regra fundamental que aparece a seguir à última... quando aparece. E assim, de face oculta em face oculta, quase sempre no calor da noite e entre pérolas negras, lá vai o jornalismo português cantando e rindo a bem, é claro, de uma qualquer nação que, na maioria dos casos, se confunde com servilismo político e económico.
Servilismo que, por regra, tem boas compensações monetárias. Registemos os factos e também os nomes. Daqui a uns tempos alguns destes supostos jornalistas vão estar a assessorar partidos e ou empresas para, tempos depois, assumirem cargos de direcção ou administração em empresas, mesmo que privadas, onde o Estado põe e dispõe.
Tem sido assim e, pelos vistos, assim tem de continuar a ser. O forrobodó no bordel continua a marcar pontos. Alguns jornalistas lá vão “ladrando” mas, é claro, a caravana dos donos da verdade e do país passa, passa sempre.
É claro que a decência (mais do que limpo e asseado deve significar honesto, decoroso) evitaria muitos dos males recentes de um país que, ao que parece, até já foi Pátria. Mas também isso foi banido.
Portugal vive agora, como sempre viveu nas últimas décadas, uma realidade marcada pela corrupção, pela promiscuidade entre a política, a economia, a justiça, o desporto, o jornalismo etc. Agora é mais visível apenas pela simples razão de que o actual poder político quis ser mais papista do que o Papa e pensou ser possível comprar todos os jornalistas por atacado.
Os seus antecessores, tanto do PSD como também do PS, limitavam-se a comprar o essencial, deixando válvulas de escape para o acessório. E o país ia vivendo com esse acessório no convencimento de que era o essencial.
Durante décadas era uma espécie de Fátima, Futebol e Fado. O povo estava entretido, tinha o essencial para viver e lá ia cantando e rindo. Ao permitir que a válvula de escape da sociedade, protagonizada por uma numericamente expressiva classe média, desse o berro, o Governo provocou a implosão da própria sociedade.
E dos cacos que vão sobrando dessa implosão é difícil restabelecer qualquer clima de confiança nas instituições e, muito menos, nos seus arautos ou artífices. Os portugueses sabem que o critério, que deveria ser sagrado para dirigir as instituições, não é o da competência mas, antes e sobretudo, o da subserviência.
E sabendo isso por experiência própria, dificilmente voltarão a acreditar num país que vive no sistema de todos a monte e fé no Estado, que o importante não é ser mas antes parecer.
E como se tudo isso não fosse mais do que suficiente, fica a certeza de que há cidadãos que estão acima da lei, vingando a tese de que o crime compensa. E quando tal acontece, lá vamos todos defender a estratégia de olho por olho, dente por dente.
E se assim for, e assim será com certeza mais dia menos dia, o resultado não estará à vista porque vamos ficar todos cegos e... desdentados.
Mas se tiver que ser... seja!
* Orlando Castro, jornalista angolano-português - O poder das ideias acima das ideias de poder, porque não se é Jornalista (digo eu) seis ou sete horas por dia a uns tantos euros por mês, mas sim 24 horas por dia, mesmo estando (des)empregado.
Título anterior do autor, compilado em Página Global: SARKOZY, HOLLANDE E O REI EDUARDO
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