domingo, 20 de maio de 2012

Relvas acusa PÚBLICO de “jornalismo interpretativo”, Passos nega ataque à imprensa




Documentação enviada à ERC

Isabel Gorjão Santos, com Lusa - Público

O ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares, Miguel Relvas, acusou o PÚBLICO de fazer “jornalismo interpretativo”, segundo a documentação enviada à Entidade Reguladora da Comunicação Social (ERC), que vai esta semana analisar o caso das ameaças feitas pelo governante ao jornal e à jornalista Maria José Oliveira. A jornalista sublinha que “em nenhum momento da exposição [do ministro] existe uma explicação para as ameaças que foram feitas”.

Já o primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, rejeitou, neste domingo, que o ministro tenha “atacado a imprensa” e defendeu que “o Governo tem privilegiado muita transparência”.

Na exposição enviada à ERC, um documento de cinco páginas às quais se juntam dois emails com perguntas de Maria José Oliveira ao ministro sobre o “caso das secretas”, Miguel Relvas salienta o que considera como diversos erros nos artigos do PÚBLICO. “A técnica é conhecida: construir um quadro narrativo inicial e tudo fazer depois para que a realidade se adapte a esse quadro.”

O documento contém diversas críticas, por exemplo, a títulos publicados. O ministro defende que o título da notícia publicado na edição online na sequência da audição a que compareceu junto da Comissão dos Assuntos Constitucionais da Assembleia da República – “Relvas admite relatórios e propostas de nomes para as secretas” – “não correspondia à verdade” e salienta que “nunca havia recebido qualquer relatório proveniente dos serviços de informações” e que o título acabou por ser alterado após “vários contactos” efectuados pelo seu gabinete “junto de responsáveis editoriais do PÚBLICO”.

Esse título acabou por ser alterado para uma versão sem referência a relatório – “Relvas admite ter recebido propostas de nomes para as secretas”, sublinha o ministro, que diz ainda que “a rectificação foi rápida, reconheça-se, mas o mal estava feito”.

No texto que enviou à ERC Relvas faz ainda outras críticas ao PÚBLICO e aos artigos publicados. O ministro refere que “o PÚBLICO tem vindo a publicar, sempre com a assinatura da mesma jornalista, várias peças noticiosas tendentes a construir uma narrativa que os factos não confirmam em pormenores decisivos”. Dá como exemplo a peça publicada na edição de 15 de Maio que diz ser “construída em grande parte pela negativa, sempre num estilo de ‘jornalismo interpretativo’” e cita algumas frases: “Relvas não disse até quando recebeu aquelas informações”; “não especificou se foi nessa altura que se encontraram”; “não respondendo por que motivo não pediu a Jorge Silva Carvalho para lhe deixar de enviar emails e sms”.

Mails trocados com o gabinete de Relvas

Por fim, a documentação enviada por Relvas à ERC inclui também as mensagens trocadas entre a jornalista e o assessor do ministro, António Valle. Relvas refere que o seu gabinete recebeu uma questão de Maria José Oliveira no dia seguinte ao da audição na comissão parlamentar, 16 de Maio, pelas 15h28, com aquilo que considera “um tom imperativo”. Especifica depois que o email de Maria José Oliveira é concluído com a frase: “Aguardo resposta até às 16 horas, uma vez que a notícia será publicada na edição online do PÚBLICO”. Mais à frente classifica como “ultimato” o prazo de 32 minutos dados pela jornalista, dizendo que “por motivos facilmente compreensíveis, não foi possível cumprir”. Esse mail incluía apenas a questão: “O ministro afirmou lembrar-se da primeira notícia que recebeu no ‘clipping’ diário de imprensa: ‘Lembro-me que a primeira era: ‘George W. Bush visita México. Fonte: Reuters’ afirmou. Esta mensagem foi recebida em que altura?”

A resposta a esta questão, no entanto, acabou por chegar às 16h01, adianta Maria José Oliveira. E a resposta do assessor do ministro, António Valle, era: “Todos os esclarecimentos sobre este assunto foram oportunamente prestados em sede própria, ou seja, na 1ª Comissão Parlamentar”.

Mais tarde, pelas 17h15 viria a ser enviado outro mail com mais três perguntas, sendo a primeira: “Afirmou na 1ª comissão que apagou os emails diários com um ‘clipping’ de imprensa que lhe eram enviados por Jorge Silva Carvalho. No entanto, algum tempo depois, disse lembrar-se da primeira mensagem: ‘Lembro-me que a primeira era: George Bush visita o México. Fonte: Reuters’. Pode esclarecer se apagou ou não os emails?” E a segunda: “Disse ter conhecido Jorge Silva Carvalho quando era secretário-geral do PSD (entre Março de 2010 e Junho de 2011). A última notícia da Reuters sobre uma viagem de Bush ao México data de 2007 e desde então a agência noticiosa não tem mais ‘takes’ sobre qualquer viagem do antigo presidente dos EUA ao México. Com explica o hiato e desde quando começou a receber o ‘clipping’?”A resposta acabaria por chegar pelas 17h16, segundo Maria José Oliveira, com um texto idêntico ao que já tinha sido enviada à primeira questão, acrescentando-se apenas a frase: “O Ministro-adjunto reafirma que só conhecer o Dr. Silva Carvalho quando era secretário-geral do PSD”.

Ao comentar a documentação enviada pelo ministro, Maria José Oliveira sublinha: “Em momento nenhum existe uma explicação para as ameaças que foram feitas a mim e ao jornal”.

Passos: “Não há nenhum ataque”

Em Chicago, Estados Unidos, à margem da cimeira da NATO, Passos Coelho escusou-se a responder se Relvas tem condições para continuar no Governo, recusando falar sobre “questões de política interna” no estrangeiro.

O primeiro-ministro rejeitou, contudo, ter havido um ataque à imprensa por parte do ministro-Adjunto e dos Assuntos Parlamentares.

“Não há nenhum ataque a coisa nenhuma. Se há coisa que o governo tem privilegiado é muita transparência nesse aspecto”, disse o primeiro-ministro, escusando-se a responder a mais questões sobre o assunto.

Em dois telefonemas na passada quarta-feira, Miguel Relvas ameaçou promover um “blackout” ao PÚBLICO e divulgar dados da vida pessoal da jornalista Maria José Oliveira na Internet, na sequência das perguntas feitas pela jornalista acerca de incongruências nas declarações do ministro no Parlamento.

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