João Marcelino – Diário de Notícias, opinião
1 - O chamado caso Relvas-'Público' tinha de acabar assim e por várias razões. A primeira é que era impossível obter uma prova material. A "coisa" (pressões ou ameaças, má disposição ou excesso de proximidade) ficou desde o primeiro momento remetida para o âmbito da fé, e crentes, de um lado e do outro, não faltam. Foram, no entanto, precisas 48 páginas de parecer, e um mês de trabalho, para sabermos que não ficaram "provadas pressões ilícitas". E depois de tanto trabalho o PSD ganhou ao PS, na votação do documento na interior da ERC, pela mesma margem com que Portugal despachou a Dinamarca: 3-2. Um resultado previsível, de resto, no interior de um organismo cujo elenco demorou semanas a ser negociado. Cada qual votou de acordo com o partido a quem deve a nomeação. A unanimidade na ERC fica reservada para aquelas decisões que não mexam com os partidos e as suas figuras. Quero dizer aos leitores que acho tudo isto normal. Absoluta e infelizmente normal. Só me custa admitir que tenhamos de continuar a pagar quatro milhões por ano para um organismo que não atrasa nem adianta.
2 - O Tribunal de Contas, com Guilherme D'Oliveira Martins, é um caso emblemático do que deve ser servir o País. As contas públicas não têm partido. Apenas precisam de cumprir regras, normas, leis. Cada caso é um caso, substantivo, sem política. E os relatórios não escondem nem mascaram. A maior condenação das PPP, das empresas que faziam e fazem negócios com os nossos impostos, como o mais recente sobre a Parque Escolar, é um serviço à democracia que não se prende com amigos, camaradas, irmãos. Guilherme D'Oliveira Martins é socialista de ideias, não é socialista de lealdades pessoais, de submissões. Nunca transportou o partido para o aparelho do Estado. Seria incapaz de fechar os olhos a uma desonestidade, numa empresa, numa autarquia, num governo, regional ou nacional, num qualquer organismo. É um homem sério, ilustre, daqueles que fazem falta a um país saudável. Durante muitos anos, infelizmente, o trabalho do Tribunal de Contas não teve consequências.
3 - Portugal precisa mesmo de se reformar, nos hospitais, nos tribunais, nas escolas, nas repartições de finanças. O problema está em que, com diz e bem Jorge Moreira da Silva, o número dois de Pedro Passos Coelho no PSD, esta racionalização de estruturas não se pode fazer "nos mesmos territórios", ou seja, nos mesmos concelhos. Ou se dividem todas estas necessárias reformas de maneira equilibrada pelo País, ou, como sempre, estaremos a promover o desequilíbrio e a desertificação do território. Esta é uma matéria em que o Governo central pode e deve ouvir os autarcas e não fazer desenhos de regra e esquadro a partir do Terreiro do Paço. Com um ponto prévio: as reformas são mesmo para executar porque as contas assim exigem.
4 - Mário Soares disse esta semana estar disponível para apoiar Carvalho da Silva nas eleições presidenciais de 2016, aquelas a que querem concorrer pelo menos uns seis dirigentes do PSD, com Marcelo Rebelo de Sousa à cabeça, e outros tantos do PS, se Durão Barroso e António Guterres deixarem. Este apoio de Mário Soares, como sempre, vai à frente do tempo, vê mais longe. Anda toda a gente à procura do nosso Syriza onde ele não está, no Bloco de Esquerda de Francisco Louçã. E, no entanto, há em Portugal um homem que, de facto, pode liderar um vasto movimento político, de esquerda, e mexer no equilíbrio partidário que vigora há 38 anos no País. Esse homem é Carvalho da Silva, e Mário Soares, como sempre, está a analisar a atualidade com sagacidade.
Miguel Cadilhe volta a insistir num imposto extraordinário de 4% sobre toda a riqueza produzida, para abater diretamente na dívida externa. É bom saber que o País, no seu todo, ainda pode pagar mais...
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