sexta-feira, 20 de julho de 2012

A AMPLA CIDADE



Rui Peralta

Israel

45 anos depois da Guerra dos 6 dias, 30 anos após a primeira Invasão ao Líbano e 25 anos passados desde a primeira Intifada, o silêncio da imprensa israelita sobre estes assuntos é ensurdecedor. Aliás o silêncio da imprensa israelita sobre qualquer assunto referente aos palestinianos é um comportamento algo esquizofrénico, como se estivesse em curso um “limpar de memória” em relação á História recente, assim como aquela pancado do Estaline em relação às fotografias dos eus ex-camaradas, que iam “desaparecendo” dos registos fotográficos á medida que fossem acusados de “inimigos do socialismo” e “agentes do capitalismo”.

Os palestinianos não são o único povo do mundo que carece de um estado independente. Existem muitos outros como, por exemplo, os tibetanos, os bascos, os curdos…Mas existe uma diferença entre a ocupação israelita na Palestina em relação á Espanha nas Terras Bascas, á Turquia e outros estados com os Curdos, ou á China com o Tibete: Em todos estes casos – e nos outros que não mencionei – o país ocupante anexou o território e converteu a população desses territórios em cidadãos seus. Israel nunca fez isso. Entregou os territórios ocupados á administração militar. Também em relação á ocupação dos USA no Iraque ou no Afeganistão existe uma diferença fundamental: É que Israel considera como seus os territórios ocupados. A particularidade da ocupação sionista é considera que os territórios que ocupou são seus, mas as populações que habitavam nesses territórios não passaram a ser seus cidadãos. As terras são suas mas as pessoas não.

Neste sentido a ocupação israelita é um fenómeno único. Metade da população sob controlo de Israel não goza dos direitos civis mais básicos nem tem representação politica alguma. Israel é uma democracia para os cidadãos judaicos mas uma ditadura brutal para os palestinianos, que nem são cidadãos. A vida de cada palestiniano da Cisjordânia ou de Gaza, está á mercê da decisão de qualquer soldado israelita. São milhões de pessoas que não têm as mais elementares garantias que qualquer população civil tem noutras partes do mundo. Os palestinianos são julgados por tribunais militares, onde fiscais e juízes vestem o mesmo uniforme do exército israelita. Não têm permissão para sair da Cisjordânia ou de Gaza sem um visto dos militares israelitas, são submetidos a longas esperas nos checkpoints e a revistas constantes, sempre que se cruzam com um militar. Os soldados entram nas suas casas a qualquer hora do dia ou da noite sem ordem judicial. Quando são maltratados pelas autoridades militares sionistas não têm a quem apresentar queixa. Os palestinianos não são israelitas com menos direitos. São prisioneiros dos israelitas.

Em cima de tudo isto ainda há os colonatos. Depois da Guerra dos 6 dias tiveram a bênção da esquerda sionista, então a força politica israelita dominante (o Bloco Trabalhista governou Israel de 1948 até aos finais da década de 70). Nunca existiu uma discussão séria, na sociedade israelita, sobre os colonatos, excepto sobre a localização, tipo e tamanho. Colonizar Jerusalém oriental, Cisjordânia e Gaza era – e é – justo, na maioria das mentes israelitas. Como resultado: Hoje mais de meio milhão de israelitas vive a Este da “Linha Verde”.

O Knesset – parlamento israelita - participou em todas estas decisões, abrangendo a maioria do espectro politico israelita: Trabalhistas, Likud, extrema-direita…Nos finais dos anos 70 Israel decidiu que toda a terra estatal nos territórios ocupados estava disponível para seu uso. As agencias governamentais facilitaram a construção para habitação de israelitas na Cisjordânia e o

Supremo Tribunal aprovou o confisco de terras e o uso maciço dos recursos palestinianos. Após os Acordos de Oslo a Cisjordânia ficou dividida em 3 áreas, ficando a maior delas – a Área C – sob controlo israelita. A ideia era, num prazo de 6 anos, obter um mútuo acordo definitivo que colocaria um ponto final na ocupação. Mas isso nunca ocorreu. Em lugar de deixar que o Acordo de Oslo expirasse, Israel começou a actuar como se houvesse tomado oficialmente a Área C. Hoje Israel constrói estradas e autoestradas, novos bairros, espaços comerciais e centros culturais para a sua população na Cisjordânia, ao mesmo tempo que empurra a população palestina para fora da Área C. Centenas de casas consideradas “ilegais”, dos palestinianos, são demolidas por ano e não são concedidas licenças para construção de novas casas.

Nos últimos anos a ocupação alcançou o seu nível mais sofisticado. Nela participam a indústria de alta tecnologia, com novas ferramentas e métodos de controlo e supervisão da população ocupada (Israel esporta o conhecimento que o seu exército adquiriu na Cisjordânia e em Gaza, para outras forças armadas de países ocupantes e tecnologia de luta antiterrorista), juristas e académicos de Direito idealizam e ensaiam legislação e normas para permitirem uma base legal de apropriação de bens e privação de direitos e o corpo diplomático participa numa guerra de propaganda cujo fim é convencer o mundo de que os palestinianos são os culpados da ocupação.

Todos os esforços para “juntar” israelitas e palestinianos, num assomo de “boa vontade” ou de “construção de pontes”, “de vasos comunicantes”, está condenada ao fracasso. Por uma razão muito simples que até os mais esforçados pacifistas e “homens de bom coração” conseguem entender: a única relação possível, na actual situação, é a de carcereiro e prisioneiro. E com essa relação ninguém espere resultados. A não ser que queiram prisioneiros adestrados e bem comportados e carcereiros bem-educados e melhor intencionados…

Ausência

A alma dorida dos teus rascunhos dedicados, mudos, sussurrados em novos versos de velhas melodias cantadas. Os teus silêncios já não são a tua alma perdida nas savanas. O teu silencio é a minha masmorra onde morro em cada segundo da tua ausência.

A cidade das sombras

O totalitarismo global do século XXI não tem rosto. Não porque use uma burka ou um véu a tapar-lhe o rosto. Não! É que pura e simplesmente não tem rosto. Varia segundo cada continente e modifica-se de acordo com a História e os antropemas e é de uma circularidade sem igual. Caracteriza-se por um fosso abismal e incontornável entre pobres e ricos, mas onde os pobres podem ser divididos em círculos concêntricos, de forma a criar uma pobreza que evolui na pobreza, mas que são pobres menos pobres que os pobres do século passado, ou da ultima década e os pobres do centro são menos pobres – por muito pobres que sejam – do que os pobres dos círculos periféricos. E os ricos são sempre mais ricos, também em círculos concêntricos e periféricos.

Outra das suas características é o consumismo acéfalo que consome o questionamento, ou seja, a capacidade critica. Os indivíduos deixam de o ser, na sua plenitude e passam a identidades individuais e colectivas. Vivem para ter e perdem a noção do gozo de ter para viver. Os pobres são os inimigos, o resto são os amigos, os concorrentes e os ídolos. A Historia passa á Historia e torna-se num imenso cesto de papéis, porque tem tão pouco significado que nem vale a pena substitui-la por uma daquelas máquinas de triturar papel.

O totalitarismo global produz pobreza em grandes quantidades, famílias sem tectos e promove a exclusão. Já lá vai o tempo das reservas keinesianas de mão-de-obra. Agora geram-se pobres, exactamente para demonstrar que os ricos são ricos. Só por isso, sem qualquer matemática keinesiana ou sem qualquer sentido tipo: “Temos muitos pobres vamos praticar muita caridade”. Hoje geram-se pobres. Uns mais, outros menos, mas pobres. E mede-se os rendimentos da pobreza, para que, hipocritamente, possa-se apregoar aos ventos todos que os pobres de hoje são em maior número mas são menos pobres que os pobres de ontem. E os que não são pobres de facto mas são pobres de espirito abanam as cabecitas e batem palmas, contentes por manterem os empregos, as reformas, os rendimentos…que o resto não interessa o que interessa é o interesse. Próprio. Mesmo que esse seja o interesse dos que são mais ricos do que os menos ricos, que não são ricos, mas também não são pobres.

Que fizemos com a vida? Em quê que a convertemos? Que fazer com uma vida desgastada, vazia de conteúdo, oca? Será que ainda vivemos ou somos apenas vermes num organismo tóxico, num predador, que passa o tempo em busca da maximização dos lucros? Que fazer? E se nada fizermos? Ou se fizermos, apenas, um doce nada fazer, um laissez-faire radical? E se a vida tornar-se um grito, o individuo um selvagem, as multidões fundirem-se num murmúrio urbano? Que aconteceria se os pobres destruíssem o gueto do capital e quebrassem o gelo dos Gulags construídos em seu nome?

Ausência

Ouvias-me, na alma, em adágio de saudade. No meu olhar vias calma, na minha voz serenidade. E proclamavas a saudade, alimentando de pura água, o meu mar de tranquilidade.

Hoje resta a mágoa.

Colômbia

Apesar da estratégia da oligarquia para impedir a plenitude da liberdade politica e a transformação do regime numa sociedade democrática, comandada pela soberania popular, o povo colombiano cria formas de organização e processos de luta que articulam as aspirações comunitárias, sindicais e politicas. A Marcha Patriótica é um recente exemplo da criatividade organizativa popular. A sua organização e funcionamento inclui os esquemas clássicos da tradição operária com formas alternativas de agrupamento e de acçäo, desde as assembleias populares às redes informáticas alternativas, criando centros de deliberação e de mobilização.

Uma das ferramentas essenciais á sua força transformadora são as paralisações e greves locais, municipais, sectoriais, regionais e nacionais. Estas paralisações cívicas expressam as reclamações das populações em todos os departamentos do país, num vastíssimo leque de problemáticas, levantadas e discutidas. A exigência de Paz, a denúncia dos abusos e da violência policial e militar, as denúncias de corrupção e das negociatas dos políticos da oligarquia, as exigências sindicais pelos direitos dos trabalhadores, as reclamações das associações camponesas, a voz das comunidades indígenas, dos estudantes, dos funcionários públicos, dos desempregados, são motes de discussão e mobilização e ensaios de uma democracia participativa.

É uma nova Colômbia a tomar forma com as experiencias e saberes de todas as lutas: da greve á guerrilha. É uma nova Colômbia que renasce sobre o que serão os escombros da oligarquia.

Ausência

Roubei mais uma rosa vermelha e guardei-a na tua ausência.

India

Um dos meios mais utilizados para manter largas camadas da população afastadas da controvérsia da luta armada ou das simples reivindicações laborais, sociais ou as mais elementares reivindicações do género, é a TV. Primeiro que tudo as cadeias de TV são um excelente negócio. Não só atraem investidores e seus capitais, como são geradoras de lucros tão grandes que elas próprias acabam por adquirir companhias e diversificar os seus investimentos, havendo assim cadeias televisivas que são proprietárias de jornais, rádios, agências publicitarias, minas, empresas de segurança, projectos de alto risco de novas tecnologias, agronegócios e até participações em bancos e seguradoras. E claro, não esqueci, produções cinematográficas. Bollywood é para o capitalismo indiano, aquilo que Hollywood nunca conseguiu ser para o capitalismo norte-americano, ou a Globo e a Record para o capitalismo brasileiro. Aquilo näo é uma fábrica de ilusões. Aquilo é a Ilusäo!

As cadeias de TV da India apanharam bem a mensagem de Bolywood. Documentários, ou pequenos comentários que sejam, sobre a insurreição Adivasi é coisa que não existe. Mostrar a pobreza, a exploração, a destruição da cintura florestal, a corrupção e a violência policial ou as operações militares nem pensar! Isso estraga o negócio e é necessário vender, para o consumo interno e externo, a imagem da India “progressista” em “progresso”. Nada de soldados em Manipur a executarem suspeitos, nem de dezenas de milhares de aldeões de centenas de aldeias reunidas em Koodankulam para protestarem contra a construção de mais uma central nuclear, ou os milhares de manifestantes que fizeram frente á polícia e às mafias mineiras em Jagatsinghpur ou Kalinganagar, ou Niyamgiri, ou Bastar, ou Jaitapur.

Mas em contrapartida, para além das imagens cor-de-rosa da India cor-de-rosa do capitalismo brics, podemos seguir o “modelo de desenvolvimento” proposto por um tenebroso personagem que dirigiu os pogrom contra os muçulmanos em 2002 e que apresenta em diversos canais de TV a sua “visão” para uma India mais pura, isenta de muçulmanos, maoistas e adivasi, visão que é partilhada não só pela extrema-direita nacionalista hindu, como também por largos sectores do Partido do Congresso. E podemos também seguir as luxuosas campanhas pela privatização, que já ninguém sabe de quê, porque já tudo está privatizado e o que não está é administrado por fantoches que representam os interesses dos seus patrões (Policia, Exercito, administração do Estado, governos estaduais e outras instituições).

Talvez as castas superiores ainda criem uma Holding para tomar, definitivamente, a vez do Estado e a India seja governada por um imenso conselho de administração e que em vez de tero um presidente e um primeiro-ministro tenha um CEO. Talvez seja esse o último passo…para uma India Corporated cujo slogan seja, cinicamente, “A Gandhi Dream”.

Fontes
Noam Sheizaf; No end in sight occupation marks 45th anniversary; http://972mag.com
John Berger; Para salvar el momento presente; http://www.jornada.unam.mx
Horacio Duque Giraldo; La Marcha Patriótica teje un Paro Cívico/Político Nacional; http://www.rebelion.org

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