segunda-feira, 9 de julho de 2012

Brasil: O HOMEM QUE TODOS AMAM ODIAR





Nunca antes neste país se viu um político detentor de enorme popularidade sofrer rejeição tão extremada e generalizada quanto a que o ex-presidente Luiz Inácio Lula experimentou ao serem divulgadas as fotos de sua alegre contraternização com Paulo Maluf (foto).

É óbvio que tal reação foi principalmente a de um público bem informado, que se interessa pela política, acompanhando-a pela imprensa ou internet (nas quais aquelas imagens repercutiram da forma mais negativa possível). Até agora não se aferiu a impressão causada naqueles que veem Lula como o novo pai dos pobres. Terão se indignado? Pelo menos sabem quem é Maluf?

E os bem pensantes, sabem?

Eu, que acompanho a carreira de Maluf desde os primórdios, sempre estranhei que estes últimos o erigissem no mais execrável de todos os execráveis políticos direitistas.

Em bateboca memorável num debate eleitoral, Leonel Brizola o qualificou várias vezes de “filhote da ditadura”, o que não é toda a verdade.

Os filhotes paradigmáticos eram aqueles políticos inexpressivos e servis que só governaram São Paulo unicamente graças ao beneplácito dos ditadores, como Laudo Natel e Paulo Egydio Martins.

Maluf foi, isto sim, um sapo direitista que a ditadura ultradireitista engoliu. Com sorte e muita habilidade para cooptar e corromper delegados, três vezes conseguiu arrobar a festa.

O governador Abreu Sodré escolheu Luiz Arroba Martins para ser nomeado prefeito de São Paulo, mas o dito cujo cometeu o deslize de, numa reunião no Palácio dos Bandeirantes, criticar o poder central. Imediatamente os militares o vetaram e Sodré foi obrigado a digerir a nomeação do pretendente alternativo, aquele presidente da Associação Comercial que Delfim Netto protegia. Assim Maluf se tornou prefeito (1969-1971).

Com seu estilo de tocador de obras, fez muitas, tanto como prefeito quanto como secretário dos Transportes do Governo de Natel (1971-1975). E, claro, a corrupção correu solta – o que nunca foi novidade no Brasil. Vide seu antecessor mais célebre em SP, o interventor federal, prefeito e governador Adhemar de Barros, popularmente conhecido como o rouba-mas-faz .

Agradeceria a Natel pelo trampolim disponibilizado para sua ascensão política… traindo-o e o derrotando de forma vexatória. Natel foi escolhido pelos militares para governar São Paulo pela terceira vez e pensou que os convencionais da Arena bateriam continência; não deu a mínima para eles.

Maluf visitou os 1.261, um por um e, com os argumentos sonantes habituais, acabou seduzindo 617 e ganhando a convenção por diferença de 28 votos. Os fardados, estupefatos, cogitaram virar a mesa, mas acabaram se conformando.

VALORES DISTORCIDOS

Até hoje me indigna que Maluf haja se tornado um criminoso procurado pela Interpol em razão de crimes financeiros e não como patrono e incentivador de assassinos seriais, responsável último por uma infinidade de execuções maquiladas em resistência à prisão. Isto dá uma boa idéia da escala desumana de valores do sistema capitalista…

Nos estertores da ditadura, Maluf repetiu a proeza de conquistar os convencionais do partido governista, convencendo-os a não endossarem a candidatura oficial de Mário Andreazza. Mas, uma parte deles preferiu debandar e constituir o PFL, garantindo sua permanência no poder como aliados do PMDB.

Foi o fim das chances presidenciais de Maluf, que chegou perto mas não levou… felizmente! Teve de contentar-se em ser mais uma vez prefeito de São Paulo (1993-1996), mas a tentativa de nova decolagem enguiçou quando o sucessor que elegeu, Celso Pitta, teve gestão escandalosa e acabou rejeitado, como ruim ou péssimo, por 83% dos paulistanos.

E Maluf acabou sendo mais execrado ainda do que Fernando Collor, o outro populista de direita importante das últimas décadas. Merece sê-lo por seu absoluto desprezo pelos direitos humanos, principalmente dos pobres e excluídos. Mas, no restante, corrupção inclusa, os dois são farinha do mesmíssimo saco.

Quanto a Lula, considero tão infame sua cumplicidade com Maluf como com outros três grandes vilãos da direita: Collor (que, aliás, havia exposto e explorado eleitoralmente seu adultério e a existência de uma filha ilegítima), Sarney (o pau mandado da ditadura que deu um jeito de continuar emporcalhando a cena política depois de 1985) e ACM (o coronelão nordestino que mais poder acumulou durante a ditadura).

Sei lá por que foi desta vez que o copo transbordou. Mas, a intuição do Lula parece ter evaporado, pois a consequência daquelas fotos era mais do que previsível.

Artigo publicado no jornal O Grito Cidadão

*Celso Lungaretti é jornalista, escritor e ex-preso político. http://naufrago-da-utopia.blogspot.com

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