quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Cabo Verde: TRAFULHICE E CINISMO DO “NOVO” DISCURSO DE JOSÉ MARIA NEVES



Liberal (cv), editorial

O “novo” discurso do Primeiro-ministro, a que a imprensa da “situação” e da “oposição” deu grande destaque, é facilmente desmontável e decorre de duas circunstâncias: as derrotas consecutivas do PAICV no terreno eleitoral, no último ano; e o ascenso de contestação ao Governo e ao seu chefe

No rescaldo da tomada de posse de todos os órgãos autárquicos do país, que teve o seu términus na passada semana, ressalta um facto político que já fez correr muita tinta e que, nalguns casos, traz por arrasto a ideia – errónea, demagógica - de que o Primeiro-ministro teria sido acometido de um “benigno” rasgo de humildade democrática.

A “surpresa” do “novo” discurso de José Maria Neves suscitou, inclusive, o aplauso condescendente de alguns autarcas da oposição (que, por ingenuidade, oportunismo ou impreparação política) vieram a terreiro mostrar satisfação pelas palavras “bonitas” do Primeiro-ministro e de outros membros do seu executivo, esquecendo as vilanias de que as câmaras da oposição têm sido alvo nos últimos anos.

O “novo” discurso nevista das “portas escancaradas” para todas as câmaras e de que para este Governo “não há câmaras da situação e câmaras da posição” revela a trafulhice e o cinismo que enformam as declarações de José Maria Neves e reforçam a ideia, já levantada aqui nas páginas do Liberal, que releva a bipolaridade comportamental e política deste Primeiro-ministro.

Como também já todos sabem, JMN tem por hábito dizer uma coisa e fazer o seu oposto, pelo que este apelo para “djunta mon” às câmaras do adversário não é mais do que verborreia do mesmo saco e areia para os olhos dos incautos. Basta ver o que este Governo fez no último ano: quase todas as câmaras do PAICV tiveram transferências de verbas extras ou viram implementados "contratos programas"; foram beneficiadas com a enigmática verba do Orçamento do Estado "outras transferências"; ou favorecidas através de "receitas de investimento do Estado". E, como também se sabe, houve mesmo transferências de milhões para câmaras do PAICV nas vésperas das eleições.

O “novo” discurso do Primeiro-ministro, a que a imprensa da “situação” e da “oposição” deu grande destaque, é facilmente desmontável e decorre de duas circunstâncias: as derrotas consecutivas do PAICV no terreno eleitoral, no último ano; e o ascenso de contestação ao Governo e ao seu chefe. Cada vez mais isolado na sociedade e no partido, José Maria Neves havia que tentar uma fuga para a frente, alimentando o discurso da “unidade nacional” para um objectivo comum, uma ideia enfatizada pelo ministro Humberto Brito que, recentemente, veio a público dizer que “temos de falar a uma única voz”. Como se ainda vivêssemos na ditadura do partido único, como se a diversidade de opiniões não fosse, em si, a génese da democracia.

A intenção é clara: passada a mensagem das “portas escancaradas”, enfatizada a blague da grande “unidade nacional”, sempre que a partir de agora alguém vier a terreiro contrariar o Governo lá surgirão os costumeiros agentes de serviço verberar contra a atitude “antipatriótica”… Até parece uma história repetida, mas por outros meios.

Pouco tempo antes de garantir a Augusto Neves que a Câmara de São Vicente tinha “escancaradas” as portas do Governo, José Maria Neves havia assinado, no jornal da Filó, um artigo de opinião [“Um olhar sobre a luz da razão eleitoral”, um laudo para consumo interno tambarina] onde disse aguardar as “cenas dos próximos episódios”, numa alusão à promessa eleitoral do edil em criar mais empregos e melhorar a qualidade de vida dos são-vicentinos… Que é como quem diz: do Governo não esperem nada! Poderá haver maior manifestação de trafulhice e de cinismo?

Em queda acelerada, José Maria Neves e este Governo já não têm mais nada a dar aos cabo-verdianos. Mais do mesmo, repescando argumentos esfarrapados, é o que vem aí. Não será altura de se repensar a manutenção deste executivo e a permanência de JMN à frente da governação?

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