Martinho Júnior, Luanda
1 – Cerrou o pano
sobre as eleições na Venezuela de 7 de Outubro de 2012, com a vitória do
Partido Socialista Unificado da Venezuela e do seu dirigente mais carismático,
Hugo Chavez.
Interessa agora
aprofundar os ganhos alcançados até aqui em benefício de todo o povo
venezuelano e para isso é importante fazer uma reavaliação do significado desta
vitória.
A vitória deve ser
avaliada a pelo menos quatro níveis:
- Em relação à Venezuela;
- Em relação a toda
a América, com realce para a América Latina e Caraíbas;
- Em relação a
África e ao resto do mundo, tendo em conta o papel da Venezuela no Movimento
dos Não Alinhados.
2 – Em relação à
Venezuela há a oportunidade de se criarem condições mais fecundas para lutar
contra o subdesenvolvimento duma forma sustentável, gerando maiores equilíbrios
humanos e ambientais, enveredando por uma maior harmonia social, com mais
justiça, efectivo respeito pelos direitos humanos e das minorias, instalando as
transformações indispensáveis para que nesses termos o crescimento seja
aproveitado por todos com muito mais equidade, solidariedade e
internacionalismo.
O nivelamento
social não se pode fazer por baixo e os actuais valores que dão qualidade à classe
média, constituem o padrão que se desenha no horizonte, com as necessárias
correcções que se devem fazer na abrangência, exigência das transformações e na
sua sustentabilidade.
As imensas riquezas
da Venezuela favorecem as potencialidades para vencer os sucessivos desafios.
A melhoria da
qualidade de vida das mais pobres comunidades venezuelanas é um processo que
não se esgotou e mantém-se como um amplo desafio entre outros.
As mudanças
substanciais foram ocorrendo na afirmação de direitos sociais, na distribuição
de riquezas, no questionamento das antigas estruturas de poder e na afirmação
das maiorias.
Esse processo não
exige só uma melhor distribuição da riqueza, é um processo de natureza
antropológica por via da qual as classes historicamente mais desfavorecidas e
marginalizadas da sociedade transformam os parâmetros culturais da sua
existência e colocam a energia emanada nesse esforço, na capacidade de
revitalização e renascimento da própria sociedade, de todo o povo venezuelano.
Entre outros aspectos
distintos, esse é o que mais distingue o Partido Socialista Unificado da
Venezuela e o seu líder, Hugo Chavez, da concorrência, uma concorrência que
todavia faz parte dos próprios desafios, até por que se vai refinando.
É percebendo como
se move o império, os seus interesses e as elites que lhe são afins (a
oligarquia indexada), por dentro do espectro
filosófico-ideológico-político-institucional da sociedade venezuelana que Hugo
Chavez e o PSUV poderão dialecticamente lutar contra o subdesenvolvimento e
progredir de forma abrangente, não de outro modo!
Nesse sentido é
importante saber até onde poderá ir o diálogo com os mais diversos sectores da
oposição que indicia estar a tornar-se mais subtil e inteligente!
Assim a luta de
classes na Venezuela reflecte um longo ocaso para as culturas burguesas
indexadas ao poder da aristocracia financeira mundial eminentemente
anglo-saxónica, por que essas culturas burguesas estão sendo suplantadas pela
contra hegemonia das classes populares com culturas eminentemente ameríndias e
latino americanas e com a vitalidade dos que nunca tiveram oportunidade
histórica para se assumirem em democracia.
A oligarquia
venezuelana é um produto do sector do petróleo e por conseguinte muito reduzida
no número de famílias que se apossaram da riqueza, tão reduzida que, face às
transformações sociais evidentes, uma parte se refugiou nos Estados Unidos, sua
verdadeira razão de existência histórica, política, económica e financeira!
Aprofundar a
democracia com mais cidadania e participação popular, reduzindo a
representatividade, é portanto indispensável ao socialismo bolivariano do
século XXI e isso implica a renúncia à ditadura do proletariado e a repescagem
da via original que Salvador Allende abriu no Chile da década de 70 do século passado,
adaptando-a à conjuntura venezuelana que alcançou um estágio muito mais
avançado que os ganhos conseguidos por Allende no Chile.
O império sabia que
essa via era um perigo para a hipocrisia da sua “representatividade” e por isso
mesmo utilizou os “Chicago Boys” para darem a orientação capitalista neo
liberal à ditadura de Pinochet, pondo fim a uma experiência que na América
Latina estava condenada apenas ao adiamento!
O “êxito” dessa
opção em fase experimental, esteve na base do papel do capitalismo neo liberal
dos nossos dias, ideal para o exercício da ditadura financeira, onde quer que
ele se implante.
Ao enfrentar a
concorrência, torna-se mais fiável a Hugo Chavez e ao PSUV a detecção dos
desafios, mais responsável e rigorosa a capacidade de resposta que se deve
criar e mais fecundas as medidas a adoptar em cada etapa, pois a oligarquia
venezuelana joga com a classe média e o espectro humano das áreas estratégicas
de maior implantação industrial, com uma área cinzenta onde ela busca refúgio
genético.
O socialismo não
desapareceu dos anseios, esperanças e expectativas da humanidade, muito pelo
contrário, nem se esgotou na resistência da Revolução Cubana, nem na
heroicidade do povo cubano: ele existe hoje na Venezuela como viabilidade para
o aprofundar da própria democracia, numa via que não é desconhecida para a
América Latina!
É esse o sentido do
respeito “histórico” de Jimmy Carter em relação ao processo venezuelano, por
que o processo venezuelano é profundamente democrático e Jimmy Carter, mesmo
não sendo socialista, assume-se de forma distinta em relação a todos os seus
pares que passaram pelo poder nos Estados Unidos!
É a história da
América, do Novo Mundo, que socorre o processo dialéctico da consistência do
processo venezuelano, até por cada fracasso foi apenas mais uma lição, uma
experiência a juntar aos desafios e no esforço para aprofundar a democracia,
ampliando cidadania e participação, ao mesmo tempo que se reduz o grau de
representatividade!
Só o império
pretende que a representatividade continue tal qual está, como uma ementa
imutável impossível de aprofundamento, pois só dessa maneira proliferam os
interesses, as conveniências e os “lobbies”, que recrutam nas oligarquias
locais e Jimmy Carter, não sendo socialista, é distinto dos outros “produtos”
que deram sucessivamente a cara e a figura ao poder nos Estados Unidos, por que
é a favor, claramente a favor, do aprofundamento da democracia!
O plano socialista
2013 / 2019 tem em vista cinco objectivos históricos:
- Consolidar a
independência da Venezuela;
- Dar continuidade
à construção do socialismo;
- Fazer emergir a
Venezuela à posição de potência regional;
- Participar num
universo multi-cêntrico e multi-polar;
- Participar nos
esforços da preservação da vida no planeta, salvando com isso a espécie humana.
A vitória do PSUV é
assim mais uma etapa numa via que transfere para os povos os processos
político-institucionais e enfraquece as ilimitadas opções do império,
particularmente da hegemonia que por via da globalização arregimenta as elites
de conveniência, mas a batalha estratégica está longe de estar ganha pois em
termos sociais a flexibilidade da oposição está a conduzir as disputas para a
imensa zona cinzenta (nas pequena e média burguesias venezuelanas) onde seu
argumento se poderá revitalizar.
A oposição
tornou-se mais refinada e inteligente: já não hostiliza, está disposta ao
diálogo e estabelece programas, avaliando onde perde e onde pode ganhar,
mantendo-se à espreita da sua oportunidade.
A oposição pode
estar mesmo disposta a aproximar o seu argumento ao de Hugo Chavez!
O PSUV terá a
partir de agora desafios enormes em termos de criatividade!
Em Dezembro haverá
eleições para Governadores e o argumento da oposição está actualmente mais
adaptado a essas eleições que às gerais, pelo menos nos lugares onde o peso da
oligarquia industrial se faz mais sentir e junto à fronteira com a Colômbia.
O poder socialista
tenderá para o diálogo, mas tem de estar mais atento que nunca na Venezuela até
por que a oposição dá sinais de ter avaliado que, se Hugo Chavez não pode ser
vencido nas urnas, a oportunidade estará quando ele, pela lei da vida,
fisicamente desaparecer, pelo que um dos desafios se fará sentir em Dezembro,
pois estão em jogo acessos a importantes patamares da estrutura do estado onde
não é a sua figura que prevalece.
O poder socialista
tem de estar também atento às resistências internas que resultam da
burocratização, um risco historicamente já conhecido.
Estará o PSUV
preparado para tal?
Foto: O dilúvio tropical
que se abateu sobre Caracas não parou o PSUV que concentrou centenas de
milhares de pessoas no acto do discurso de encerramento da campanha de Hugo
Chavez.
A consultar:
- “El ditador y las
petroleras” – http://www.rebelion.org/noticia.php?id=117121
- “La batalla de
Ayacucho, ahora en el siglo veintiuno” – Atílio Borón – http://www.cubadebate.cu/opinion/2012/10/06/la-batalla-de-ayacucho-ahora-en-el-siglo-veintiuno/
- “Por qué Chavez?”
– Ignacio Ramonet – http://www.cubadebate.cu/opinion/2012/10/05/por-que-chavez-2/
- “Venezuela, en
batalla estratégica por América Latina” – http://www.telesurtv.net/articulos/2012/10/06/venezuela-en-batalla-estrategica-por-america-latina-5034.html
- “Dimensión
universal de la elección en Venezuela” – http://www.avn.info.ve/contenido/dimensi%C3%B3n-universal-elecci%C3%B3n-venezuela
- “Rumo a um
chavismo post Chavez?” – http://ponto.outraspalavras.net/2012/10/04/chavismo/
- “Chavismo abriu
caminhos antes inexistentes para a esquerda” – http://operamundi.uol.com.br/conteudo/entrevistas/24346/chavismo+abriu+caminhos+antes+inexistentes+para+a+esquerda+diz+autor+de+livro+sobre+a+venezuela.shtml
- “Povo venezuelano
derrota a oligarquia e o imperialismo” – http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=21033&boletim_id=1402&componente_id=23466
- “El mejor del
mundo” – http://www.aporrea.org/internacionales/n215690.html
- “A vitória de
Chavez e os seus significados” – http://www.outraspalavras.net/2012/10/08/a-vitoria-de-chavez-e-seus-significados/
- “El futuro de
América Latina se juega en Venezuela” – http://www.rebelion.org/noticia.php?id=154697
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