Luís
Nhanchote – Verdade (mz)
No mais apetecível
destino do iniciar do século XXI, a província de Tete, onde se localiza a maior
reserva global de minerais do hemisfério sul, concretamente no distrito de
Moatize, as populações reassentadas pela gigante multinacional Vale do Rio Doce,
podem a qualquer momento entrar em erupção.
O aviso à navegação
fora dado na localidade de Cateme, no mês de Fevereiro do ano corrente, quando
a população decidiu impedir a circulação do comboio que levava os preciosos
minerais para o porto de Nacala. O Estado, usando da premissa de detentor da
violência legítima, violentou os manifestantes. No entender das comunidades
locais, o Governo é complacente no incumprimento das promessas de indemnização
feitas pela Vale.
O @Verdade esteve
em Tete, onde passou em revista as relações entre os intervenientes (população,
Vale e Governo provincial), e o que se pôde depreender é que as condições para
a erupção estão criadas: a qualquer momento um novo Cateme pode eclodir.
Onde impera a lei
do mais forte
Em 2009, o governo
provincial, através da administração da localidade de Chipanga, informou a
população local de que seria transferida para uma nova zona para dar lugar à
exploração do carvão mineral.
Os que foram
considerados, na altura, desempregados, de acordo com o levantamento feito,
exponencialmente desempregados, tiveram como destino Cateme, o primeiro
epicentro dos protestos. Outros, tidos como aqueles que tinham empregos, embora
precários, foram reassentados na zona 25 de Setembro, a poucos quilómetros da
área de exploração.
Estes últimos
sentem-se revoltados desde os meados de Setembro e dizem-se traídos pelo
governo local e pela Vale. Tudo porque as indemnizações, na sua óptica, são
injustas e desadequadas. Mais, exigem formação e emprego para os seus
descendentes, para além da manutenção das casas que lhes foram atribuídas.
E, no caso das
habitações, a situação não é para menos. As mesmas apresentam fissuras. O
hospital, cuja construção está na fase conclusiva, constitui uma das
preocupações. Por outro lado, a juventude clama por emprego. Enquanto isso, a
Vale, assim como outros gigantes da mineração implantados naquela província,
crescem a olhos vistos.
A greve contornada
Por sentir que as
suas reclamações não têm sido levadas a peito desde 2009, os reassentados do
bairro 25 de Setembro decidiram partir para os protestos. Os líderes
comunitários e outras estruturas daquela zona dirigiram-se à sede do governo do
distrito de Moatize para expor, mais uma vez, as suas preocupações, exigiram
que a Vale lhes devolvesse o espaço onde está implantada, e agendaram uma
manifestação para o dia 10 de Outubro, quarta-feira da semana passada.
O levantamento
popular só aconteceria caso as suas reclamações não fossem satisfeitas.
Naturalmente que após a remodelação governamental feita dois dias antes (dia 8
de Outubro), os efeitos políticos chegaram à mesa da Vale e não havia interesse
nenhum em ver um levantamento popular, pois esse seria o primeiro “beliscão” ao
antigo governador de Tete Alberto Vaquina, o novo Primeiro-Ministro.
No dia 9, gestores
da Vale e actores do governo provincial permitiram que a população fosse a
Chipanga para reavaliar as dimensões das suas propriedades, que incluem
machambas, árvores de fruta, entre outros.
Com este passo, que
inclui o pagamento de indemnizacões, parte do grupo decidiu abandonar a ideia
da manifestação, enquanto outros são pela sua realização como forma de luta
para que todos sejam devidamente ressarcidos.
“Não somos unidos”
Pedro Elias é um
dos representantes da comissão dos reassentados. Ele explicou ao @Verdade que o
bairro 25 de Setembro está dividido em nove quarteirões e que os chefes de cada
um deles é membro de direito na comissão, incluindo mais quatro elementos que
são escolhidos por via de votação.
Na sua opinião,
“não somos unidos porque cada um está preocupado em resolver o seu problema, e
não o do colectivo, cuja dimensão é maior”. Elias deu como exemplo o hospital,
que “já foi concluído há muito tempo, mas ainda não foi aberto, o que nos
obriga a deslocarmo-nos à vila, mesmo para uma simples consulta”.
Por seu turno, Mama
Duzeria, como é conhecida a secretária-adjunta do Bairro 25 de Setembro, também
lamenta o facto de a Vale não estar a honrar os seus compromissos.
“Disseram-nos que eles vieram para ficar e que iam dar emprego e oferecer
cursos aos nossos filhos. Porém, nada disso está a acontecer, desde 2009”.
Para ela, a
Associação de Apoio e Assistência Jurídica às Comunidades deve ajudar-lhes a
interpretar o que está escrito nos documentos, assinados em 2009. Só assim
iremos saber o que devemos fazer. As coisas aqui não estão bem, e a qualquer
momento isto pode transformar-se em Cateme”.
Entretanto, não nos
foi possível ouvir os representantes da Vale, muito menos do Governo (quer
local, quer central). A burocracia continua a imperar no seio das instituições,
o que torna impossível pôr em prática uma das regras do Jornalismo: o direito
ao contraditório.
*Com o apoio da IBIS
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