quinta-feira, 15 de novembro de 2012

BIFES E BRIOCHES

 

Fernando Dacosta – Jornal i, opinião
 
Acirrada zaragata desabou sobre nós: uma figura relevante, a presidente do Banco Alimentar contra a Fome, Isabel Jonet, disse alto, isto é na televisão, o que devia ter dito baixo, isto é entre iguais. Exuberante a ajudar necessitados, a bondosa senhora, acabada de chegar da Grécia, um horror de miséria, sentia-se, ante as câmaras, irritada, crispada. Descontrolando-se, zás, confessou o que a azedava. Os portugueses são uns megalómanos que pretendem viver acima das suas possibilidades, que só comem carne, só sabem criticar, lamuriar, pedinchar. Farta, a entrevistada caiu na negação: miséria, miséria era a da Grécia. Comparado, Portugal revelava-se até um oásis – a imagem do oásis continua a render.
 
Isabel Jonet evoluiu, no entanto; tempos atrás a pobreza no país indignava-a. Com a subida, porém, ao poder de Passos Coelho ela (a miséria) desapareceu. As suas declarações encheram-nos de alegria, se já não há fome em Portugal (apenas apetite), não são mais precisas organizações como a que lidera – e não temos de continuar, oh que felicidade, a aturar os detestáveis pobrezinhos! Gonçalo M. Tavares lembra, no seu notabilíssimo romance “Uma Viagem à Índia”, que “a diferença entre pobres e ricos” é que “os pobres não têm dinheiro para exercer a sua maldade”. Esqueceu-se que a exercem, e desalmadamente, pela internet.
 
Não podermos comer bife todos os dias (nem uma bifana?) significa que podemos, talvez, comer lagosta. Este é um raciocínio parecido ao que levou Maria Antonieta a responder que se o povo de França não tinha pão, que consumisse brioches. A desastrada monarca, por via dessas, ficou sem cabeça. Acontece.
 
Escreve à quinta-feira
 

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