domingo, 11 de novembro de 2012

Brasil: FRAGMENTOS DE UMA VIAGEM

 


Antonio Tozzi, Miami – Direto da Redação
 
São Paulo (SP) - Depois de dez dias de Brasil, mais exatamente em São Paulo, após longo período sem colocar os pés aqui, deu para constatar alguns progressos e retrocessos. Na verdade, nem diria retrocessos, apenas a manutenção do velho descaso com os cidadãos que muita gente prefere chamar de “jeitinho brasileiro” e o incremento da violência urbana, tema deste artigo, sobretudo na capital paulista, onde os líderes do PCC (Primeiro Comando da Capital) ordenam mortes de policiais e incêndios em ônibus para se vingar da transferência dos seus chefes para presídios de segurança máxima.
 
Essa semana o que se viu foi uma contabilidade macabra, com os programas policiais registrando mortes e mais mortes de inocentes, policiais e bandidos na periferia da cidade mais rica da América do Sul, como se os indivíduos sem nome quisessem ser protagonistas do teatro do absurdo, clamando para si a atenção que a sociedade teima em não lhes dar.
 
Os mais românticos podem achar bonito que os eternos coadjuvantes da sociedade humana assumam finalmente uma posição de destaque para que as autoridades voltem os olhos para eles e para a (feia) realidade em que vivem.
 
Mas isto não passa de um sentimento de culpa de intelectuais que procuram ver nos rejeitados pela sociedade os artífices da mudança para um mundo novo. Entretanto, isto não resiste a um exame mais acurado para se perceber que os “Robin Hoods da periferia paulistana” não passam, na realidade, de bandidos cruéis e desumanos que querem instituir uma nova ordem social para se beneficiarem dela.
 
O que se vê em São Paulo, Rio de Janeiro e outras grandes cidades brasileiras são hordas de vidas perdidas a serem consumidas nos cachimbos e nas pedras de crack, nos canos dos revólveres e na obediência cega aos barões do tráfico e aos grupos organizados que controlam esta sociedade paralela e se tornam ao mesmo tempo protetores e algozes deste exército de párias que vaga sem presente e sem futuro.
 
Eles somente são usados como buchas de canhão e podem servir os poderosos ao avisar sobre a chegada da polícia e como mulas do tráfico de drogas. Mas suas vidas valem muito pouco. Aliás, a vida no Brasil de hoje está muito barata, infelizmente. É comum ver cenas em que bandidos em motocicletas e em automóveis passam atirando nas pessoas ou ateando fogo em ônibus sem serem importunados, apesar das câmeras flagrarem os momentos dos extermínios.
 
Os policiais, por sua vez, cada vez mais atemorizados, reagem da maneira que sabem: atirando. Muitas vezes matam inocentes, pelo simples fato de não seguirem a regra número um de qualquer agente da segurança pública, exigir a identificação do suspeito. Aqui, ainda prevalece a regra de atirar primeiro e perguntar depois, o que serve apenas para aumentar a estatística dos assassinatos. Para completar, há maus policiais que atuam dos dois lados, dizendo proteger os cidadãos, mas extorquindo dinheiro de criminosos e forçando os comerciantes a lhes pagar dinheiro por uma proteção que já deveria estar sendo paga através dos impostos arrecadados.
 
A fim de tentar conter o poder cada vez mais expressivo do PCC no sistema presidiário de São Paulo – e que já vem estendendo-se para outros estados -, o governo federal e o governo paulista acertaram os ponteiros para fazer uma ação conjunta para isolar os líderes desta facção criminosa e impede-los de continuar emanando ordens para seus comandados, mesmo de dentro das prisões.
 
A onda de violência é uma reação a esta tentativa de conter a influência do PCC, num primeiro momento, e de eliminá-la, numa segunda etapa. Se isto será conseguido, apenas o tempo dirá, mas trata-se de uma parceria válida, apesar de esconder uma manobra política.
 
Pelo que os jornais paulistas publicaram, o secretário de Segurança Pública, Ferreira Pinto, desmantelou alguns focos de corrupção nas polícias civil e militar e isto provocou a revolta do PCC que possuía livre trânsito nestes setores. O ministro da Justiça, José Eduardo Cardoso, ofereceu ajuda, e isto é importante. Porém, alguns politicos interpretaram esta atitude como o primeiro lance dele para uma possível candidatura ao governo de São Paulo.
 
Explica-se: Cardoso é do PT, e o partido não esconde de ninguém que deseja conquistar a “jóia da coroa”, ou seja, o governo do estado de São Paulo, enquanto Ferreira Pinto é secretário do governo de Geraldo Alckmin, do PSDB, partido que controla o estado mais rico da federação há muito tempo. Analisando friamente, foi um golpe de mestre de Cardoso: se der certo, ele cobrará a fatura política; se der errado, quem pagará a conta serão Alckmin e Ferreira Pinto, que poderão ser acusados de ineptos por não terem sabido aproveitar a oportunidade. Até a morte de cidadãos acaba virando lance de xadrez politico. Quem diria, hein?
 
* Foi repórter do Jornal da Tarde e do Estado de São Paulo. Vive nos Estados Unidos desde 1996, onde foi editor da CBS Telenotícias Brasil, do canal de esportes PSN, da revista Latin Trade e do jornal AcheiUSA
 

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