Martinho Júnior, Luanda
O MAIOR “SEGREDO” DA
REVOLUÇÃO CUBANA
A situação global
contemporânea remete-nos para a necessidade de tomada de consciência urgente
sobre os destinos da humanidade e do planeta, nossa “casa comum” e isso é tanto
mais crítico quanto o capitalismo que nos conduziu à globalização neo liberal
apanágio do império, na sua lógica que inclui o lucro, a especulação, os mais
inverosímeis tráficos e o domínio avassalador sobre os “mercados”, nos ter
feito chegar a um ponto de rotura que, elevando o exponencial dos riscos a um
nível nunca antes experimentado, põe em causa a essência da vida na Terra, tal
como neste momento a conhecemos.
Hoje não se
presencia só aos desequilíbrios e assimetrias humanas e ambientais:
refinaram-se os processos de domínio de um punhado de interesses poderosos
sobre o resto, estimulando o que é virtual sobre o que é real, na maior parte
dos casos por via dum consumo cada vez mais abrangente, entorpecendo as
sociedades, formatando até a inteligência humana pela redução da consciência
dos próprios riscos até ao limite do suportável.
A lógica com
sentido de vida, novo paradigma do processo dialéctico, surge a partir da
crítica filosófica e ideológica à lógica capitalista que está-nos a conduzir
até à exaustão, com todo o seu cortejo de sofrimento humano e de problemas
ambientais de carácter geo-estratégico, tudo isso agravado pela contradição
entre os cada vez menos recursos existentes, para fazer face a uma população
cada vez maior e cada vez mais ávida de consumo, aproveitando os conhecimentos
adquiridos por via da ampla socialização e do respeito para com a Mãe Terra
para projectar alternativas saudáveis por que efectivamente sustentáveis, para
o homem e para o planeta.
Essa síntese dá-nos
a ideia da dimensão exponencial inspiradora da revolução cubana, que mesmo
sujeita a todo o tipo de medidas de ingerência, de pressão e de bloqueio
possível, teve a inteligência de, resistindo, ser a vanguarda da lógica
alternativa que se impõe, pelo respeito com que aborda as questões que se
prendem à essência da vida, à humanidade e ao planeta.
Ela contrasta
sobretudo com o que há de medieval e feudal nas ideologias de que se serve a
aristocracia financeira mundial e seu séquito de servidores!
A revolução cubana
comporta factores que se prendem com o amor, a solidariedade e com o
equilíbrio, factores que se tornaram, à medida do agravamento da situação
global, no farol humanístico que ilumina as trevas, por que são o exemplo do
que o homem deve e pode fazer para a sua sobrevivência e a do planeta, nos
termos em que ele propicia a vida como a conhecemos.
Perante um bloqueio
avassalador aplicado pelo império, Cuba voltou-se sobre si mesma e não perdeu
tempo: auto-descobriu-se e transformou em conhecimento adquirido e sustentável
as potencialidades humanas e as da natureza, de forma a conduzir uma sociedade
traumatizada por tudo o que representava a ditadura de Fulgêncio Baptista
forjada numa ditadura sustentada numa lógica capitalista selvagem, numa sociedade
capaz de resistir, capaz da dignidade ao mesmo tempo e de solidarizar-se com os
povos oprimidos de todo o mundo, na esteira do resgate das nações surgidas da
escravatura, desde os alvores do capitalismo moderno.
A revolução cbana
desde o primeiro dia em que assumiu o poder foi determinante pelo exemplo:
escolheu como prova a experiência do contacto directo com a “ciénaga” de
Zapata, o mais empobrecido, marginalizado e inóspito rincão do país.
Sobre ele diria
Raul de Castro: “yo no creia que la vida de los campesinos era mas dura en la Sierra Maestra que
en ningún outro lado; pêro pude comprobar en la ciénaga que la de los
carboneros de esa zona es increiblemente inhumana y dolorosa”.
Os dirigentes da
revolução cubana deram o exemplo nessa descoberta e alguns deles, entre eles o
próprio Raul de Castro, quase perderam a vida por causa dessa ousadia, na
sequência duma sucessão de acidentes.
Nada pode
substituir o esforço para nos conhecermos, humanamente nos conhecermos,
conhecer as nossas potencialidades, capacidades, aptidões e anseios, como
conhecer o nosso espaço físico-geográfico, conhecer o nosso país, a começar
pelos lugares mais inacessíveis e difíceis, por que só assim se poderá melhor
construir a identidade nacional, valorizar-se uma pátria para todos,
sustentável também no respeito pela natureza.
Esse esforço nunca
será em vão pois o inventário humano e o dos recursos físico-geográficos e
naturais é fundamental para, de forma cada vez mais inteligente, se poder
programar a sustentabilidade integrada da vida, por muito duras que sejam as
condições, inclusive quando essas condições são as de um bloqueio tão feroz e
prolongado como o imposto a Cuba, um bloqueio acrescido por todo o tipo de
ingerências, provocações e terrorismo!
Toda a nação se
deve transformar assim numa grande escola, que nos motiva para a reflexão, para
o conhecimento e para humanizarmos a sociedade, respeitando a Mãe Terra, pelo
que toda a planificação deve ser feita exclusivamente com base nos recursos,
tendo em conta a sustentabilidade, única garantia de respeitarmos de forma
abrangente e integrada, a lógica com sentido de vida.
Por essa via, nunca
será em vão a aposta na educação e na saúde, como a ampliação constante dos
conhecimentos que se vão adquirindo sobre o homem, a natureza e o ambiente.
Bloqueada Cuba, a
revolução cubana buscou a solução mais inteligente, adaptada às condições
impostas a partir do exterior, sempre disposta a compartilhar as experiências e
conhecimentos em proveito do resgate dos oprimidos e na luta contra o
subdesenvolvimento.
A paz socialista é
uma constante descoberta de nós próprios, da humanização dos nossos actos, uma
prova constante de solidariedade, internacionalismo e justiça, como uma prova
de descoberta da natureza, ainda que nas condições mais adversas e hostis, pelo
muito respeito que nos deve merecer esta casa comum que é a Terra.
Não será esse um
dos maiores “segredos” da revolução cubana e das potencialidades do seu
internacionalismo e de sua solidariedade?
Não constitui esse “segredo”
um conhecimento adquirido único que poderá ser reflectido em todos os aspectos
e factores da lógica com sentido de vida, onde quer que se manifeste a
existência individual ou colectiva do homem!
Essa lição poderá
ser tida em conta em relação ao estudo das enormes potencialidades hídricas e
hidrológicas de África, Angola incluída.
A água é a vida e a
água do interior do continente africano, um continente onde os desertos estão
em expansão, é um manancial de ambientes tropicais únicos e extremamente
importantes para a vida no planeta.
Os vales do Nilo,
do Níger, do Congo e do Zambeze, por exemplo, têm características únicas com
ambientes originais, que influenciam no habitat humano, bem como no equilíbrio
ambiental global.
A bacia do Congo é
o segundo pulmão equatorial da Terra, a seguir ao Amazonas na América do Sul!
A “defesa” dos “direitos
humanos”, da “democracia representativa”, da “luta contra a pobreza”,
parafraseando a propaganda do capital perante esforços tão nobres como os de
Cuba, não passa de cosmética que vai empalidecendo à medida que a resistência
perdura face às adversidades: o capitalismo auto estimula-se com as ramagens,
quando sua raiz, aquilo que alimenta e mantém a árvore de pé, não pára de
apodrecer…
A revolução cubana
resiste graças às enormes potencialidades de sua energia e vitalidade e por
isso constitui, de há pouco mais de 50 anos a esta parte, um dos exemplos mais
fecundos que, ao aceitar todo o tipo de desafios, põe à prova a sua
criatividade alternativa e a criatividade de todos nós!
Foto: A Terra vista
pela tripulação da Apolo 17: o planeta é a nossa “casa comum”.
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