Presidente egípcio
decepciona oposição com seu discurso e perde cada vez mais apoio no próprio
partido. Opositores descartam oferta de diálogo se amplos poderes presidenciais
não forem revogados.
Há mais de uma
semana, centenas de milhares de egípcios vão às ruas do país em protesto contra
a nova Constituição e contra o decreto que confere amplos poderes ao presidente
Mohammed Morsi.
Na noite desta
quinta-feira (06/12), o presidente tomou, enfim, a palavra. Suas concessões,
contudo, ficaram muito aquém das expectativas dos manifestantes. Pouco depois
do discurso do chefe de Estado, transmitido pela televisão, aumentaram os
protestos populares em torno do palácio presidencial, onde ouviam-se palavras
de ordem como "fora" ou "assassino".
A resposta violenta
das forças de segurança ao protesto pacífico desta quarta-feira foi justificada
por Morsi com uma "conspiração": segundo ele, forças estrangeiras e
parte da oposição política teriam lançado mão da violência.
Trata-se de um
argumento já usado à exaustão pelo ex-presidente Hosni Mubarak e pelo Conselho
Militar, a fim de justificar a própria violência. Diversas testemunhas e vídeos
deixam claro que os ataques partiram da Irmandade Muçulmana e só depois é que o
conflito se acirrou, resultando em violência dos dois lados.
Convite ao diálogo
Morsi insistiu em
alertar os manifestantes de que protestos pacíficos só são permitidos se não
causarem danos à economia local, não obstruirem o trânsito nem colocarem em
risco propriedades. Contra infratores, afirmou Morsi, as medidas serão duras.
Para o manifestante
Karim El Behairy, a situação é clara. "Precisamos pôr fim à sua
presidência. Se não encerrarmos agora o seu regime, seremos vítimas dele. Morsi
quer transformar o Egito num novo Irã", completou. O presidente convidou
todos os partidos políticos para um diálogo, neste sábado, no palácio
presidencial, mas afirmou que não abrirá mão de forma alguma do plebiscito
constitucional.
Ele também não quer
abdicar do decreto que lhe atribui amplos poderes, tendo demonstrado disposição
em debater apenas um artigo especialmente criticado. Este permite ao chefe de
governo "tomar quaisquer medidas necessárias, a fim de salvaguardar a revolução,
a unidade e a segurança nacionais", sem ao menos consultar outras
instâncias.
Nos últimos dias, a
oposição anunciou repetidamente que pretende aceitar as ofertas de negociação
de Morsi somente se o decreto for cancelado. A negativa para a proposta de
diálogo foi reiterada nesta sexta-feira.
Para Karim El
Beheiry, mesmo concessões amplas não bastam depois da violência da última
quarta-feira. "Antes de isso tudo acontecer, poderíamos ter entrado em um
acordo, mas agora não dá mais. Morsi não tem mais direitos. Não há nenhuma
razão para mantê-lo no poder", argumentou o manifestante.
Renúncias
pressionam Morsi
Morsi parece estar
querendo ganhar tempo com sua oferta de diálogo. Pois caso a situação se agrave
ainda mais, o plebiscito para aprovação da Constituição, marcado para a próxima
semana, poderá estar em
risco. Diversos partidos e grupos conclamaram a população
para protestos de grande escala nesta sexta-feira.
Abdel Moneim Abul
Fotuh, ex-candidato à presidência, também exerce pressão sobre Morsi, ao
responsabilizá-lo pela escalada da violência diante do palácio presidencial. Ele
também defende o fim do decreto de amplos poderes.
A reação da Frente
de Salvação Nacional, encabeçada por Mohamed ElBaradei, será decisiva neste
momento. No entanto, apenas com declarações para a imprensa não bastam, afirma
Karim El Beheiry. "Acho que Baradei é uma boa pessoa, mas ele deveria
estar junto com os manifestantes, nas ruas. Se ele quer ficar em seu escritório
e aparecer na TV, tudo bem. Mas não venha dizer que fala em nome da
revolução", conclui o manifestante.
A pressão sobre
Morsi aumenta até mesmo nas fileiras de seu próprio partido, que registrou uma
verdadeira onda de desvinculamentos nos últimos dias. Um deles foi o de Rafiq
Habib, vice-presidente do Partido da Liberdade e da Justiça, braço político da
Irmandade Muçulmana. Habib é cristão, tendo sido até agora um ponto importante
de apoio para Morsi. Diversos assessores do presidente já encaminharam suas
renúncias.
Essam El Amir,
presidente da emissora estatal de televisão, também renunciou ao cargo em sinal
de protesto contra a conduta adotada por Morsi. E os revezes para o lado do
atual presidente poderão aumentar ainda mais, caso o diálogo com a oposição não
leve a nenhum acordo. Se isso ocorrer, o vice-presidente e ministro da Justiça,
Ahmed Mekki, também cogita demitir-se dos cargos que ocupa.
Autor: Matthias
Sailer (sv) - Revisão: Alexandre Schossler
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