sábado, 8 de dezembro de 2012

FOSSO NA ZONA EURO ALARGA-SE

 


Jorge Nascimento Rodrigues - Expresso
 
A fragmentação da zona euro agravou-se esta semana. França fixou mínimos nos juros e os Bunds alemães a dois e três anos estão em terreno negativo, enquanto Portugal, Espanha, Itália e Irlanda acentuam trajetória de subida de risco de incumprimento e de juros da dívida.

A fragmentação da zona euro é gritante - França e Alemanha conseguem descer substancialmente os custos de financiamento da sua dívida soberana, inclusive no caso dos prazos mais curtos das obrigações alemãs os investidores aceitam yields negativas, enquanto Portugal, Espanha, Itália e Irlanda vêm as yields aumentar e o risco de incumprimento subir.
 
O alargamento deste fosso ocorreu na própria semana em que Mário Draghi, o presidente do Banco Central Europeu, declarou que tem observado nos últimos meses uma melhoria na "confiança dos mercados", sobretudo depois do anúncio do programa do banco central para uma eventual compra de dívida no mercado secundário conhecido pela sigla OMT.
 
FRANÇA - mínimos nas yields das obrigações
 
As yields das obrigações do Tesouro francês a dois, a três e a dez anos fixaram hoje mínimos no mercado secundário. No prazo a dois anos fecharam em 0,03% e no prazo a três anos em 0,12%. As yields para as obrigações a dez anos continuam a descer abaixo do patamar dos 2%, o que nunca havia acontecido, fechando hoje em 1,957%.
 
Apesar da dívida francesa ter perdido o triplo A nas notações da Standard & Poor's e da Moody's, o custo de financiamento da dívida nos prazos mais curtos aproxima-se de 0% e no longo prazo encurta a distância em relação às yields dos Bunds (1,957% no caso francês contra 1,295% para o caso alemão, no prazo a dez anos). Bunds é a designação em alemão das obrigações alemãs.
 
ALEMANHA - yields na dívida a dois e três anos em valores negativos
 
Os investidores internacionais aceitam yields negativas (na prática abdicam de receber juros e pagam como que uma "renda" implícita ao Tesouro alemão para terem Bunds nos seus portefólios) nos prazos a dois e três anos das obrigações alemãs.
 
Esta semana, as yields dos Bunds a dois anos fecharam no mercado secundário em -0,077%, e a três anos em -0,038%. Estão ainda a alguma distância dos mínimos de -0,09% a 31 de julho para os Bunds a dois anos e de -0,05% a 2 de agosto para os Bunds a três anos.
 
Os Bunds são considerados valores refúgio.
 
ESPANHA, ITÁLIA E IRLANDA - yields das obrigações e risco agravam-se
 
Mário Draghi, presidente do BCE, voltou a ser claro sobre as condições de operacionalização do programa OMT (o novo mecanismo disponível para compra de dívida no mercado secundário), que não são "negociáveis" nem com Madrid, que tem arrastado a decisão de pedido de um resgate global, nem com Roma. Também foi claro que o BCE não se meteria em nenhuma acordo sobre as promissórias irlandesas, o que seria pisar o risco vermelho de proibição de financiamento monetário de governos.
 
No caso de Itália, acresce uma crise política larvar e a possibilidade crescente de eleições legislativas antecipadas, em virtude do partido de Sílvio Berlusconi ter tirado o apoio ao governo "tecnocrata" de Mário Monti.
 
Deste modo, e face às previsões pessimistas de recessão provável durante dois anos sucessivos em toda a zona euro (segundo o BCE), a incerteza domina os investidores, o que se repercute em dois movimentos: deslocação para valores refúgio (a que nos referimos acima) e fuga a sete pés dos quatro "periféricos", quer os dois "bons alunos" dos "países de programa" - Irlanda e Portugal -, como de Itália e Espanha, simplesmente a terceira e quarta economias da zona da moeda única.
 
O risco de incumprimento da dívida espanhola subiu de 21,9% em 30 de novembro para 23% a 7 de dezembro, segundo dados da CMA DataVision. As yields das obrigações espanholas a dois anos subiram de 2,835% para 2,965% e no caso do prazo a dez anos de 5,235% para 5,456%, no mercado secundário, naquele período referido, segundo dados da Bloomberg.
 
A mesma trajetória observa-se no caso da dívida italiana - o risco subiu de 19,3% para 20%; as yields das obrigações italianas subiram de 1,919% para 1,997% no prazo a dois anos e de 4,45% para 4,525% entre 30 de novembro e 7 de dezembro no mercado secundário.
 
No caso da Irlanda - um país ainda sob resgate, e que tem tido uma trajetória positiva que a levou para níveis de yields e de risco abaixo dos verificados para Espanha e Itália (que não estão sequer sob planos de resgate da troika)-, a última semana trouxe sinais preocupantes: o risco de incumprimento subiu de 14,2% para 16,42% entre 30 de novembro e 7 de dezembro e as yields dos títulos a dois anos voltaram a situar-se, no fecho de sexta-feira no mercado secundário, acima de 2%, ou seja acima do nível verificado para os títulos italianos.
 
Prémio de risco da dívida portuguesa sobe
 
O "filme" de contradições entre órgãos de soberania e dentro da própria coligação governamental e de recuos e avanços do governo sobre o tema da extensão ou não a Portugal de algumas alterações recentes no segundo plano de resgate à Grécia, bem como os dados divulgados sobre a contração do PIB no terceiro trimestre deste ano (que se situou em 3,5% em termos homólogos, acima da estimativa preliminar de 3,4%) marcaram a semana.
 
O prémio de risco da dívida portuguesa - o diferencial em relação ao custo de financiamento da dívida alemã - subiu de 6,05 pontos percentuais para 6,26 ao longo da semana. Em relação a 30 de novembro subiu ligeiramente de 6,25 para 6,26 no fecho de 7 de dezembro.
 
O risco de incumprimento subiu de 31,93% a 3 de dezembro para 33,39% a 7 de dezembro. No entanto, em relação ao fecho de 30 de novembro, o risco ficou, na sexta-feira, abaixo dos 34,37% verificados no final do mês passado.
 
Entre o final de novembro e esta sexta-feira, Portugal desceu da 6ª para a 7ª posição no "clube" dos 10 países com maior probabilidade de incumprimento da dívida soberana num horizonte de cinco anos. Apesar desta melhoria na situação, o país ainda está a alguma distância da 9ª posição a que chegou em 17 de outubro (o que não se verificava desde novembro de 2010) e que manteve durante alguns dias.
 
Por seu lado, o comportamento das yields das obrigações do Tesouro no mercado secundário foi semelhante. Entre 30 de novembro e 7 de dezembro, as yields desceram em todas as maturidades, mas, ao longo da semana, entre 3 e 7 de dezembro, subiram nos prazos a dois e a dez anos, e desceram nos restantes.
 
A trajetória não é ainda clara. A dinâmica de agravamento, esta semana, foi mais acentuada nos casos de Espanha, Itália e Irlanda, acima referidos.
 
NOTA: Esta análise da trajetória durante a última semana não se refere à tendência anual do risco de bancarrota e das yields das obrigações portuguesas em 2012. A tendência da probabilidade de incumprimento é de uma descida muito significativa de um pico em 30 de janeiro quando chegou a 73,32% (um nível similar ao que atingiu a Argentina no início deste mês de dezembro quando se temeu uma eminência de bancarrota em virtude da decisão de um juiz de Nova Iorque), com Portugal na 2ª posição no referido "clube", até um mínimo, até à data, de 30,63% em 17 de outubro, quando o país desceu para a 9ª posição. A mesma tendência se verificou, no mercado secundário, nas yields das obrigações do Tesouro nos diversos prazos. Por exemplo, na maturidade a dez anos, as yields atingiram um pico de 17,39% em 30 de janeiro e um mínimo, até à data, de 7,460% a 3 de dezembro.
 

Sem comentários:

Mais lidas da semana