Tragédia em Santa
Maria: O barco não foi feito para ficar ancorado e seguro na praia. Mas para
navegar, enfrentar ondas, vencê-las e chegar ao destino
Leonardo Boff –
Pragmatismo Político
Os antigos já
diziam:”vivere navigare est” quer dizer, “viver é fazer uma viagem”, curta para
alguns, longa para outros. Toda viagem comporta riscos, temores e esperanças.
Mas o barco é sempre atraído por um porto que o espera lá no outro lado.
Parte o barco mar
adentro. Os familiares e amigos da praia acenam e o acompanham. E ele vai
lentamente se distanciando. No começo é bem visível. Mas na medida em que segue
seu rumo parece aos olhos cada vez menor. No fim é apenas um ponto. Um pouco
mais e mais um pouco desaparece no horizonte. Todos dizem: Pronto! Partiu!
Não foi tragado
pelo mar. Ele está lá, embora não seja mais visível. E segue seu rumo.
O barco não foi
feito para ficar ancorado e seguro na praia. Mas para navegar, enfrentar ondas,
vencê-las e chegar ao destino.
Os que ficaram na
praia não rezam: Senhor, livra-os das ondas perigosas, mas dê-lhe, Senhor,
coragem para enfrentá-las e ser mais forte que elas.
O importante é
saber que do outro lado há um porto seguro. Ele está sendo esperado. O barco
está se aproximando. No começo é apenas um ponto levemente acima do mar. Na
medida em que se aproxima é visto cada vez maior. E quando chega, é admirado em
toda a sua dimensão.
Os do porto dizem:
Pronto! Chegou! E vão ao encontro do passageiro, o abraçam e o beijam. E se
alegram porque fez uma travessia feliz. Não perguntam pelos temores que teve
nem pelos riscos que quase o afogaram. O importante é que chegou apesar de
todas as aflições. Chegou ao porto feliz.
Assim é com todos
os que morrem. O decisivo não é sob que condições partiram e saíram deste mar
da vida, mas como chegaram e o fato de que finalmente chegaram. E quando
chegam, caem, bem-aventurados, nos braços de Deus-Pai-e-Mãe de infinita bondade
para o abraço infinito da paz. Ele os esperava com saudades, pois são seus
filhos e filhas queridos navegando fora de casa.
Tudo passou. Já não
precisam mais navegar, enfrentar ondas e vencê-las. Alegram-se por estarem em
casa, no Reino da vida sem fim. E assim viverão para sempre pelos séculos dos
séculos.
(Em memória
dolorida e esperançosa dos jovens mortos em Santa Maria na madrugada do dia 27
de janeiro de 2013).
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