domingo, 27 de janeiro de 2013

Portugal: FOGUETES ANTES DA FESTA




Pedro Marques Lopes – Diário de Notícias, opinião

1 Subitamente, os mercados descobriram que a implementação do programa "para além da troika" estava a correr bem. Olharam melhor e verificaram que, agora sim, havia gente competente a governar o País. Pressentiram que as célebres reformas estruturais vão dar resultado e que as falências em catadupa, o desemprego, a espiral recessiva são sinais desprezíveis.

Ou seja, apesar de o mundo em peso saber que, pelo caminho até aqui tomado, pelas opções feitas e por aquilo que vamos passar nos próximos anos, o País não vai criar riqueza, pelo contrário vai destruí-la, os mercados correm para a dívida portuguesa como se de pãezinhos quentes se tratasse. Digamos que há qualquer coisa que não bate certo: se não se produz riqueza, como diabo vamos conseguir pagar os empréstimos?

Claro que não há nada de estranho. Quando Mario Draghi anunciou que ia fazer tudo pelo euro, anunciou também a queda das taxas de juro para todos os países do euro em dificuldades e o regresso aos mercados em condições favoráveis das economias em maiores dificuldades.

Mas será que alguém acredita que Portugal poderia regressar aos mercados sem que tivesse o BCE, no fundo, como fiador? Ou que as taxas de juro baixassem para todos os países em dificuldade da maneira que baixaram se não tivessem a mão do BCE por baixo? De repente, todos os governos que até agora não eram dignos de confiança passaram a ser credíveis?

Não estamos em tempo de demagogia: o nosso regresso aos mercados e a diminuição das taxas de juro deve-se ao BCE e à recente mudança, ainda que ténue, nas políticas europeias. Não a qualquer passe de mágica, cumprimento do memorando ou confiança dos mercados no Governo português. Mas nem a Europa nem os mercados merecem que lhes agradeçamos. Convém lembrar que foram em grande parte as inconscientes políticas europeias, a arquitectura institucional do Euro e os ataques especulativos à moeda única que nos trouxeram até aqui. Sim, é verdade, e não custa repetir: não foi Sócrates o culpado maior das nossas actuais dificuldades, nem será Passos Coelho a acabar com elas se a Europa não mudar de rumo.

Teoricamente, com o acesso aos mercados, estaria aberto o caminho para resolver um dos maiores problemas que as empresas enfrentam: o financiamento. As empresas não conseguem financiar-se e as que conseguem têm de pagar juros exorbitantes. Claro está, é preciso que o dinheiro não fique no Estado ou que os bancos não aproveitem para especular e o façam chegar a quem de facto investe e cria riqueza.

Só que as empresas podem até ter finalmente acesso a financiamento, mas se ninguém lhes comprar os produtos ou serviços, não há nada a fazer. As empresas podem sobreviver sem crédito, sem clientes é que não.

A destruição da economia portuguesa está em curso, e com o autêntico suicídio colectivo que o Governo está a impor para 2013 ainda será pior. Sem procura interna e com a externa a prometer baixar drasticamente, por muito dinheiro que venha, ninguém o vai utilizar. Uma economia em recessão com a dívida acima dos 120% do PIB não será capaz de pagar as suas dívidas por muito baixos que sejam os juros.

Não mudando a política económica, iremos ao mercado buscar mais endividamento, mas não financiamento.

Se o Governo e os parceiros europeus não se convencerem de que é fundamental mudar o rumo das políticas económicas, de que o esbulho fiscal mata o consumo e o investimento, de que os cortes cegos não reformam, apenas destroem valor e que no fim do processo de consolidação não há nenhuns pozinhos de perlimpimpim que transformarão a economia portuguesa, não há mercado que nos valha.

Regressamos aos mercados não por causa das políticas do Governo e da troika, mas apesar delas. E se o Governo e a Europa não perceberem isso, aquilo que é em si mesmo uma excelente notícia pode transformar-se num pesadelo ainda maior do que aquele que estamos a viver.

2 António José Seguro tem de acelerar o processo da sua relegitimação, ou seja, convocar o mais cedo possível o congresso: ninguém olhará para os socialistas como alternativa enquanto o presente clima de guerra no PS estiver instalado.

António Costa tem de falar, seja para dizer que é candidato à liderança, seja para dizer que não é: ficar calado não é solução quando toda a gente sabe que há uma corrente que o quer ver como secretário-geral.

Quem ganha com a actual situação de indefinição no PS é a coligação governamental: fica demonstrado que o PS, dividido como está, não é oposição e muito menos alternativa. O Governo está em roda livre.

Por decisão pessoal, o autor do texto não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico.

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