Pedro Marques Lopes
– Diário de Notícias, opinião
1 Subitamente, os
mercados descobriram que a implementação do programa "para além da
troika" estava a correr bem. Olharam melhor e verificaram que, agora sim,
havia gente competente a governar o País. Pressentiram que as célebres reformas
estruturais vão dar resultado e que as falências em catadupa, o desemprego, a
espiral recessiva são sinais desprezíveis.
Ou seja, apesar de
o mundo em peso saber que, pelo caminho até aqui tomado, pelas opções feitas e
por aquilo que vamos passar nos próximos anos, o País não vai criar riqueza,
pelo contrário vai destruí-la, os mercados correm para a dívida portuguesa como
se de pãezinhos quentes se tratasse. Digamos que há qualquer coisa que não bate
certo: se não se produz riqueza, como diabo vamos conseguir pagar os empréstimos?
Claro que não há
nada de estranho. Quando Mario Draghi anunciou que ia fazer tudo pelo euro,
anunciou também a queda das taxas de juro para todos os países do euro em
dificuldades e o regresso aos mercados em condições favoráveis das economias em
maiores dificuldades.
Mas será que alguém
acredita que Portugal poderia regressar aos mercados sem que tivesse o BCE, no
fundo, como fiador? Ou que as taxas de juro baixassem para todos os países em
dificuldade da maneira que baixaram se não tivessem a mão do BCE por baixo? De
repente, todos os governos que até agora não eram dignos de confiança passaram
a ser credíveis?
Não estamos em
tempo de demagogia: o nosso regresso aos mercados e a diminuição das taxas de
juro deve-se ao BCE e à recente mudança, ainda que ténue, nas políticas
europeias. Não a qualquer passe de mágica, cumprimento do memorando ou
confiança dos mercados no Governo português. Mas nem a Europa nem os mercados
merecem que lhes agradeçamos. Convém lembrar que foram em grande parte as inconscientes
políticas europeias, a arquitectura institucional do Euro e os ataques
especulativos à moeda única que nos trouxeram até aqui. Sim, é verdade, e não
custa repetir: não foi Sócrates o culpado maior das nossas actuais
dificuldades, nem será Passos Coelho a acabar com elas se a Europa não mudar de
rumo.
Teoricamente, com o
acesso aos mercados, estaria aberto o caminho para resolver um dos maiores
problemas que as empresas enfrentam: o financiamento. As empresas não conseguem
financiar-se e as que conseguem têm de pagar juros exorbitantes. Claro está, é
preciso que o dinheiro não fique no Estado ou que os bancos não aproveitem para
especular e o façam chegar a quem de facto investe e cria riqueza.
Só que as empresas
podem até ter finalmente acesso a financiamento, mas se ninguém lhes comprar os
produtos ou serviços, não há nada a fazer. As empresas podem sobreviver sem
crédito, sem clientes é que não.
A destruição da
economia portuguesa está em curso, e com o autêntico suicídio colectivo que o
Governo está a impor para 2013 ainda será pior. Sem procura interna e com a
externa a prometer baixar drasticamente, por muito dinheiro que venha, ninguém
o vai utilizar. Uma economia em recessão com a dívida acima dos 120% do PIB não
será capaz de pagar as suas dívidas por muito baixos que sejam os juros.
Não mudando a
política económica, iremos ao mercado buscar mais endividamento, mas não
financiamento.
Se o Governo e os
parceiros europeus não se convencerem de que é fundamental mudar o rumo das
políticas económicas, de que o esbulho fiscal mata o consumo e o investimento,
de que os cortes cegos não reformam, apenas destroem valor e que no fim do
processo de consolidação não há nenhuns pozinhos de perlimpimpim que
transformarão a economia portuguesa, não há mercado que nos valha.
Regressamos aos
mercados não por causa das políticas do Governo e da troika, mas apesar delas.
E se o Governo e a Europa não perceberem isso, aquilo que é em si mesmo uma
excelente notícia pode transformar-se num pesadelo ainda maior do que aquele
que estamos a viver.
2 António José
Seguro tem de acelerar o processo da sua relegitimação, ou seja, convocar o
mais cedo possível o congresso: ninguém olhará para os socialistas como
alternativa enquanto o presente clima de guerra no PS estiver instalado.
António Costa tem
de falar, seja para dizer que é candidato à liderança, seja para dizer que não
é: ficar calado não é solução quando toda a gente sabe que há uma corrente que
o quer ver como secretário-geral.
Quem ganha com a
actual situação de indefinição no PS é a coligação governamental: fica
demonstrado que o PS, dividido como está, não é oposição e muito menos
alternativa. O Governo está em roda livre.
Por decisão
pessoal, o autor do texto não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico.
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