André Macedo –
Dinheiro Vivo, editorial
No último Conselho
de Ministros aconteceu isto. Vítor Gaspar disse que a lei que fixa as
indemnizações laborais deve ser revista já, imediatamente e a correr (reduzida
de 20 para 12 dias por cada ano de trabalho), porque foi isso que o País
acordou com a troika. Ele, que é ministro das Finanças, fez o que já se espera
dele: está cá como fiscal e, portanto, fiscaliza, zela, obriga, dobra, insiste,
força, cumpre, não pensa, executa. Cegamente.
A seguir veio
Álvaro Santos Pereira, ministro da Economia, isto é, o ministro responsável
pelas coisas que crescem ou talvez um dia possam crescer. Disse o Álvaro: a lei
tem de ser mudada, sim, mas aprovemos um regime transitório: baixamos para 18
dias agora e, daqui a cinco anos, chegamos aos tais 12 dias, até porque os
efeitos económicos imediatos são poucos. Razoável este ministro. Afinal, a lei
das indemnizações é recente, foi negociada a custo com a UGT.
Portanto, as contas
eram estas: havia uma lei que tornava demasiado caros os despedimentos, o que
favorecia os mais velhos com emprego e deixava de fora os mais novos e recentes
a chegar ao mercado de trabalho. Mudou-se então a lei para dar oxigénio a uma
estrutura ossificada que não incentivava o mérito e, paradoxalmente, estimulara
o aparecimento de recibos verdes por todo a lado. Era uma má lei não apenas por
comparação a outros países da União Europeia, mas porque os resultados eram
desastrosos: quem estava no quadro tinha muito (apesar do recurso crescente aos
despedimentos coletivos), quem estava fora não tinha nada. Era aqui que
estávamos até ao acordo com a UGT que, aliás, implicou outras alterações.
Volto agora ao tal
Conselho de Ministros. Gaspar está impossível, irredutível, não deixa ninguém
falar. Exige o cumprimento incondicional do acordo com a troika. "Temos de
mudar a lei e já! Não há alternativa! Qual é a parte que não percebeu, sr.
ministro Álvaro?!" Estou a inventar este diálogo. Gaspar não disse nada
disto; ou se disse eu não sei. O que sei, e os factos ontem confirmaram, é que
Passos, depois de ouvir os ministros das Finanças e da Economia, optou por ser
árbitro, embora daqueles que viciam o jogo. Não decidiu o que fazer, como lhe
competia: inscreveu no diploma os 12 dias que Gaspar exigia e chutou a proposta
de lei para o Parlamento. No entanto, não há disfarce possível. Se os deputados
do PSD e do CDS aprovarem esta mudança, estarão a violar o acordo do Governo
com a UGT e a matar o diálogo com o único sindicato que ainda aceita negociar.
A ser assim, será a radicalização do debate em troca de nada. O ministro das
Finanças foi longe demais. Não é ministro, é uma ravina política, é um abismo
fiscal.
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