quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Portugal: O FMI QUER, PASSOS SONHA, A OBRA NASCE




Rúben Bicho – Económico, opinião

Há uma citação atribuída a Tolstoi que diz qualquer coisa como isto: "todos pensam em mudar a humanidade, mas ninguém pensa em mudar-se a si mesmo".

Há uma citação atribuída a Tolstoi que diz qualquer coisa como isto: "todos pensam em mudar a humanidade, mas ninguém pensa em mudar-se a si mesmo". Olhando para a actual discussão em torno da reforma do Estado, não andamos muito longe disto. Os principais agentes politicos e económicos portugueses embarcaram com grande afã na cruzada da reforma do Estado mas cheios de vícios antigos, sem dar o sinal de que serão os primeiros agentes da mudança, dando antes os sinais de que é preciso que algo mude, para que tudo fique na mesma.

Basta olhar para as recentes indefinições em torno das tabelas de IRS e o pagamento dos duodecimos. É este tipo de organização que se pode esperar para uma tarefa tão pesada como reformular o funcionamento do Estado?

Mas vamos por partes. Ao atribuir ao FMI a honra de dar o pontapé de saída na discussão sobre a reforma do Estado, o Governo foi fiel ao registo de comunicação a que já nos habituou nos últimos meses: dois passos em frente, um passo atrás, mais uns quantos a ziguezaguear e lá chegaremos ao ponto pretendido. E a estratégia até podia ter funcionado, não fosse o "menu" do FMI uma resenha daquilo que já se conhece do pensamento do Fundo misturado com as ideias que o Governo por esta ou aquela via já tinha feito circular na sociedade portuguesa.

E falha naquilo que mais se poderia pedir a um estudo deste género - que desenhasse uma noção, por muito difusa que fosse, de como ficará Portugal após a reforma do Estado, quais as consequências para lá da operação aritmética de reduzir algumas alíneas do Orçamento do Estado. O que o FMI enviou são só sugestões, podem argumentar. Mas, mal comparado, parecem de um médico a quem se dirige um paciente com uma dor no pé. A sugestão de solução é rápida:

"Dói-lhe o pé? Corte a perna".

"Então mas e depois, como é que eu ando?"

"Bom, isso aí já é problema seu".

Portanto como base de lançamento de debate, pode-se dizer que a coisa nasceu torta. Mas o certo é que a discussão está lançada. Então e como é que a oposição, com o PS à cabeça, aproveita o momento ? Com o clamor populista das eleições que não quer e com o silêncio ensurdecedor das ideias que não tem. A oposição tinha o dever de estar pronta para contra-argumentar as ideias do FMI, de apresentar dados concretos das alternativas que apregoa, ou de justificar claramente o porquê de não se avançar com a reforma do Estado. Não o fez.

E como não o fez, deixou caminho aberto para Pedro Passos Coelho continuar a sonhar com um Estado que, como por artes mágicas, se vai tornar mais eficiente por ter menos pessoas a trabalhar e menos meios para funcionar. E a obra vai avançar, de uma forma ou outra. Por estes dias PS e PSD estão em reflexão interna. Seria bom que percebessem que terão de ser os primeiros a mudar, que um processo de repensar o Estado como este em que estamos envolvidos tem efeitos com impacto em várias gerações e que não é tema para se mudar de cada vez que muda a legislatura. A reforma do Estado só será eficaz se tiver uma base sólida de apoio politico (e aqui também o CDS terá de ser chamado ).

Por isso o momento não é de jogo politico. O momento é de assumir responsabilidades e de mudar a mentalidade dos truques eleitoralistas. Se não tivermos esta mudança nos agentes, o Estado só vai ser reformado de uma forma: para pior.

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