Especialistas
detentores de informações importantes ou agentes em causa própria? Projetos de
lei europeus incluem passagens copiadas na íntegra de textos elaborados por
lobistas.
Um projeto de lei
para 500 milhões de cidadãos da União Europeia é obviamente algo complicado. A
fim de evitar efeitos colaterais indesejados, os deputados consultam peritos a
respeito das sugestões apresentadas. Estes, no entanto, não são sempre independentes,
e a partir do momento em que aconselham no interesse de uma empresa ou
organização, passa-se a falar de trabalho de lobby.
Recentemente, o
deputado do Partido Verde Jan Philipp Albrecht, relator do Parlamento Europeu
para a reforma da legislação sobre proteção de dados, queixou-se do fato de as
firmas procurarem esclarecer os parlamentares sobre seus pontos de vista com
tamanha avidez. Uma avidez bem maior do que a de outros grupos de interesse,
como, por exemplo, organizações não governamentais: em 2012 ele recebeu nove
vezes mais convites de lobistas do setor econômico do que de outros grupos,
revela Albrecht.
Nesse processo,
aparentemente alguns deputados se deixam convencer. Isso é pelo menos o que
deduz Marco Maas a partir da análise dos requerimentos para alterações de
projetos de lei da UE. Segundo essa análise – realizada pela plataforma
LobbyPlag, de que Maas é um dos fundadores – trechos inteiros dos textos foram
simplesmente copiados de sugestões apresentadas por lobistas.
Comparando-se com o
número de passagens reproduzidas de documentos das empresas com das de
documentos das ONGs, logo fica claro que a influência do empresariado "é
muito, muito maior do que a das ONGs".
Há controvérsias
Uma vez que o
principal interesse da LobbyPlag é a reforma da lei de proteção de dados, em
sua plataforma online só se encontram documentos da UE relativos a esse
projeto. Portanto, não é possível generalizar a partir dos resultados a que
seus organizadores chegaram.
Num grande estudo
sobre o papel do lobby na legislação europeia, a politóloga Heike Klüver, da
Universidade de Constança, diz não ter encontrado nenhum desequilíbrio entre o
empresariado e grupos com metas de maior interesse público.
"Costuma-se
sugerir que associações empresariais são muito mais fortes, e que o
empresariado domina a legislação, enquanto outros grupos da sociedade mal são
escutados", descreve Klüver. No entanto, em sua pesquisa, ela concluiu que
isso não se aplica diretamente à União Europeia.
Ela analisou 56
processos legislativos, comparando quanto sucesso tiveram associações
empresariais e ONGs em impor seus interesses. "Não pude constatar nenhuma
diferença significativa", afirma, acrescentando: "Quando se considera
que os parlamentares precisam estudar uma série de projetos de lei, mas que
normalmente só dispõem de uma secretária, um ou dois consultores e um
estagiário, fica óbvio que eles simplesmente precisam de input externo".
Sugestões para
piorar
Maas também percebe
que os deputados precisam de ajuda na elaboração das leis. Mas ele se irrita
porque, por vezes, os esboços são piorados pelos lobistas, como no caso de um
projeto sobre proteção de dados.
"O projeto
original previa, por exemplo, que uma empresa de fora ficasse submetida a
rigorosas normas de proteção de dados ao se estabelecer na Europa. O novo
projeto prevê que a empresa possa escolher qual país adotará como sede, e assim
simplesmente escolher qual lei de proteção de dados mais lhe convém", diz
o co-fundador da LobbyPlag. A seu ver, regras rigorosas são sistematicamente
abrandadas.
Através de
publicações de outros pesquisadores, Heike Klüver também tomou conhecimento de
passagens de texto que foram copiadas das sugestões dos lobistas. "Em
alguns estudos de caso no Parlamento Europeu, colegas meus encontraram esse
tipo de reprodução. Mas esse não é nenhum fenômeno que diga respeito
exclusivamente às associações empresariais, ele ocorre também com as
ONGs", relativiza a pesquisadora da Universidade de Constança.
Registro
facultativo em Bruxelas
Em geral, os
lobistas perseguem dois tipos de estratégia, explica Klüver: externas e
internas. As primeiras são, por exemplo, campanhas na mídia ou manifestações em
que os defensores de interesse procuram estabelecer contato direto com os
deputados. "Isso pode se dar na forma de comunicados ou de consultações,
em fóruns formais, oficiais, ou em workshops."
Além disso, há as
estratégias internas, como audiências no Parlamento e redes informais. "Aí
as pessoas se encontram, por exemplo, para almoçar ou jantar, ou as associações
de lobistas organizam recepções", relata a pesquisadora.
Em sua opinião, o
lobby é uma parte importante das representações de interesses na sociedade,
além de melhorar a capacidade de resolução de problemas de certas instituições.
A Comissão Europeia até possui um cadastro de lobistas. No entanto, o registro
é facultativo para os profissionais, fato que a cientista política critica.
"Nenhum
lobista me diz o que fazer"
Por sua vez, a
Comissão Europeia, na condição iniciadora dos processos legislativos, rechaça
qualquer acusação de falta de transparência. "A Comissão nunca utiliza de
forma direta textos que possivelmente nos tenham sido apresentados por um grupo
de lobby", assegura um dos porta-vozes do órgão, Frederic Vincent.
Segundo ele, todas
as contribuições da sociedade civil seriam divulgadas no website da Comissão. E
no texto final do projeto de lei, a ser submetido ao Parlamento e ao Conselho
Europeu, ficaria explicitado quais sugestões foram adotadas.
Na última
segunda-feira (11/02), a comissária da UE para a Agenda Digital, Neelie Kroes,
já postara na rede social Twitter: "Nenhum lobista me diz o que devo
fazer, nem norte-americano, nem nenhum outro".
Autoria: Jennifer
Fraczek (av) - Revisão: Francis França
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