João Lemos Esteves –
Expresso, opinião
1. Ontem, Passos
Coelho dirigiu-se à Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa com o
objectivo de encerrar a conferência sobre o futuro do Estado, organizada pela
JSD. Esta conferência iniciou-se logo pela manhã com a presença do Secretário
de Estado dos Assuntos Europeus e do Ministro da Economia, Santos Pereira, mas
teve obviamente na presença do Primeiro-Ministro o seu ponto alto. Aliás,
a conferência foi pensada exclusivamente para permitir um palco para Passos
Coelho aparecer numa Universidade, depois dos incidentes da passada semana com
Miguel Relvas no ISCTE. Após os reparos de Marcelo Rebelo de Sousa, no seu
comentário de domingo na TVI (que, recorde-se, perguntou onde andava a JSD para
defender o executivo), a JSD quis responder de imediato, fazendo prova de vida
ao organizar à pressão a conferência de ontem. E aqui cumpre atribuir
mérito (muito) à JSD nacional e ao seu presidente: conseguir organizar uma
conferência, sob o título pomposo de "debate de uma geração" em dois
dias, com nomes como o sindicalista João Proença (líder da UGT, que, aliás, foi
o mais efusivo nos cumprimentos ao Primeiro-Ministro: o abraço entre
Passos Coelho e João Proença foi o mais forte da tarde), dando uma oportunidade
para Passos Coelho fazer uma demonstração de força na FDL, é um feito digno de
registo. E a JSD teve o cuidado de garantir a presença de militantes seus de
todo o país: havia militantes das estruturas do Norte, do Centro e do Sul de
Portugal. Esta foi a nota mais positiva da tarde: a JSD - quando quer! -
consegue mobilizar-se e dizer, sem medo, presente. A mobilização não é, pois,
um exclusivo do PCP ou do Bloco de Esquerda.
2. Posto isto,
convém elucidar os leitores do EXPRESSO que esta visita do Primeiro-Ministro
foi também um teste aos elementos da sua Segurança pessoal. Depois dos erros
cometidos no ISCTE, este era a oportunidade para corrigir lapsos de logística e
de estratégia. Como é que fizeram? No dia anterior à visita do
Primeiro-Ministro, elementos da sua Segurança visitaram a Faculdade de Direito,
estudaram o terreno, falaram com alunos, mediram o grau do perigo. Ao longo
do dia de ontem, a Faculdade foi literalmente "tomada de assalto" por
polícias, fardados e muitos à paisana que se mantiveram em zonas de grande
afluência de alunos, como foi o caso do Bar da Faculdade. Houve,
inclusive, no dia anterior, contactos intensos entre o Director da Faculdade de
Direito e o gabinete do Primeiro-Ministro para garantir que não haveria falhas
de segurança. Quando Passos Coelho chegou, o acesso ao auditório foi barrado
para impedir que os manifestantes impedissem o Primeiro-Ministro de proferir o
seu discurso: tentou garantir-se ao máximo que os presentes no auditório fossem
não-hostis para Passos Coelho. Depois, à saída, foi o descalabro total, com os seguranças
a abrirem caminho, empurrando os manifestantes, que começaram a cercar Passos
Coelho, com um a queda aparatosa de um jornalista e alguns alunos a ficarem em
pânico. A verdade é que foi um percurso muito difícil para Passos Coelho, que
manteve uma cara insensível para esconder o seu receio. E o caso só não atingiu
proporções maiores, porque os manifestantes organizaram-se, também eles, num
curtíssimo espaço de tempo: a conferência apenas foi anunciada no final de
tarde do dia anterior, não dando tempo para uma grande mobilização dos
opositores de Passos Coelho. Em termos de Segurança, a visita de Passos Coelho
à Faculdade correu, pois, melhor do que a visita de Miguel Relvas ao ISCTE.
A inabilidade
política de Passos Coelho: chegará o seu Governo a 2015?
3.Por último,
cumpre apreciar qual foi o objectivo político de Passos Coelho ao deslocar-se à
Faculdade de Direito de Lisboa. Foi proferir um discurso marcante sobre " a
próxima geração e o seu futuro"? Foi aproveitar a honra e o privilégio de
estar na maior e melhor Faculdade de Portugal para anunciar as linhas de
reforma do Estado? Anunciar como vai cortar na despesa do Estado? Não, nada
disso. Passos Coelho, no seu discurso, não disse rigorosamente nada de jeito.
Nada que se aproveitasse. A única frase que resulta do discurso de Passos
Coelho é até perigosa - o dizer que as manifestações são "modas
passageiras". Esta é uma frase explosiva, cujo único feito é convidar
ainda mais manifestantes a revoltarem-se ainda mais contra Passos Coelho e
contra o seu Governo. O problema é que - volto a afirmar! - parece que Passos
Coelho está a provocar os portugueses. Será que não há ninguém no Governo que
diga a Passos Coelho que o tom do seu discurso e a sua gestão política são
miseráveis? Que as manifestações são resultado, para além de medidas
discutíveis, dessa sua arrogância e obstinação em persistir no erro -só para
não dar razão a terceiros? Passos Coelho faz lembrar um menino birrento...Quem
perde? Portugal. Porque o PSD corre o sério risco de se afastar completamente
dos portugueses...com consequências para os próximos (longos?) anos. Por
conseguinte, aqueles que hoje se limitam a prestar vassalagem ao
Primeiro-Ministro deveriam acordar para a vida e fazer perceber a Passos Coelho
que está errado. Enfim...
Uma aluna dizia
com piada e argúcia analítica que "Passos Coelho atravessou o corredor da
morte" ontem. Corredores como este podem bem ser a causa da sua
"morte" política. Vejam bem como está o Governo: já não se fala na
próxima legislatura. O horizonte já não é voltar a ser Governo em 2015. Não: o
Governo Passos Coelho, neste momento, está a lutar para se aguentar até 2015! Mais
palavras para quê?
Sem comentários:
Enviar um comentário