quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Paulo Portas em defesa das relações com Angola que jornal de Luanda diz estarem condenadas




ANA DIAS CORDEIRO - Público

Editorial do Jornal de Angola defende fim dos investimentos angolanos em Portugal. MNE português diz que fará "aquilo que for preciso dentro da lei" para proteger o bom entendimento diplomático.

Depois de, no domingo, ter criticado as instituições portuguesas, como a Procuradoria-Geral da República (PGR), ter duvidado da boa vontade de Portugal nas relações bilaterais com Angola, e ter denunciado uma “perseguição aos interesses angolanos”, o Jornal de Angola defendeu nesta quarta-feira o fim dos investimentos angolanos em Portugal por considerar que o investidor angolano, ao contrário de outros, não é bem-vindo em Portugal.

Ambas as mensagens foram enviadas pela mesma via: um editorial do único diário angolano e órgão oficial do regime de José Eduardo dos Santos sob o título Alvos Selectivos, mas desta vez não assinado (pelo menos na versão disponível na Internet), no qual se considera que Portugal “não é de confiança” e não tem condições “para receber um euro sequer de investimento” e se acusa “as elites portuguesas” de nada quererem “com os investidores angolanos”.

Os dois editoriais foram intercalados com uma nota da Procuradoria-Geral da República (PGR) de Angola, em resposta à manchete do semanário Expressodo último sábado dando conta de uma investigação por suspeitas de fraude e branqueamento de capitais, a correr no Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), contra João Maria Sousa, procurador-geral da República de Angola.

O semanário português esclarecia que a investigação, aberta depois de o Banco de Portugal ter sido alertado pelo Santander Totta, na sequência de um depósito feito por uma empresa offshore, estava na fase inicial e ainda não tinha sido convertida em processo-crime. Referia ainda a “especial atenção” dada pelo ministro Paulo Portas às investigações sobre Angola, “para evitar o reacender de conflitos diplomáticos”. Já o comunicado da PGR angolana, enviado à Lusa, repudiava a forma “despudorada” e “desavergonhada” como o segredo de justiça estava a ser “sistematicamente” violado em Portugal em casos relativos a “honrados” cidadãos angolanos.

Proteger as relações, de qualquer forma "legal"

Na terça-feira à noite, Paulo Portas realçou a importância das relações entre os dois países e manifestou disponibilidade para fazer aquilo que fosse preciso “dentro das regras e da lei” para as proteger. Em declarações aos jornalistas em Madrid, divulgadas pela Lusa, o ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros considerou ainda que “o sistema judicial português não é o lugar adequado para dirimir questões internas de outros Estados”.

No editorial de domingo, intitulado Portugal e Jonas Savimbi, o director do jornal José Ribeiro falava de desconfiança e má-fé e punha em causa o ministro Paulo Portas, que recentemente esteve numa visita a Luanda. Mas, em jeito de conclusão, deixava a porta aberta a um entendimento: “Hoje, Paulo Portas é um grande amigo de Angola e está a ser lançado para liderar a direita portuguesa em caso de as coisas correrem mal à actual coligação, o que mostra que é possível, afinal de contas, um entendimento com Portugal.”

O PÚBLICO tentou, nesta quarta-feira, ouvir Paulo Portas (já depois de uma primeira tentativa no domingo) e o gabinete do primeiro-ministro Pedro Passos Coelho questionando ambos sobre o estado actual das relações diplomáticas entre Lisboa e Luanda e pedindo-lhes que esclarecessem se as relações estão de facto a ser prejudicadas pelas investigações no DCIAP. O assessor de imprensa do ministro remeteu para as declarações da véspera, dizendo que “por agora”, Paulo Portas não tinha “mais nada a acrescentar”. Do gabinete de Passos Coelho não houve, até ao momento, resposta.

Outras investigações por suspeitas de branqueamento

Em Novembro, o Expresso já tinha avançado a notícia, confirmada ao PÚBLICO pelo DCIAP, da existência de uma investigação contra “altos dirigentes angolanos” por suspeitas de fraude fiscal e branqueamento de capitais, sem que no entanto tivessem sido ouvidos ou constituídos arguidos.

Seriam pelo menos três figuras do círculo mais próximo do Presidente José Eduardo dos Santos: Manuel Vicente, vice-presidente de Angola e ex-director-geral da empresa petrolífera nacional Sonangol; o general Hélder Vieira Dias "Kopelipa", ministro de Estado e chefe da Casa Militar da Presidência da República; e o general Leopoldino Nascimento "Dino", consultor do ministro de Estado e ex-chefe de Comunicações da Presidência da República.

Na altura, o Jornal de Angola denunciava, também em editorial, sob o título Jogos Perigosos, o que dizia ser uma “campanha contra Angola do poder ao mais alto nível” em Portugal, e previa que as relações entre Luanda e Lisboa fossem prejudicadas por ter havido um acto de “deslealdade”.

Também em 2008, quando o músico e activista Bob Geldof disse, numa conferência em Lisboa promovida pelo Banco Espírito Santo (BES), que Angola era “gerida por criminosos”, o jornal oficial reagiu de imediato em editorial e criticou, além de Bob Geldof, a imprensa portuguesa que dera voz às acusações do músico. Sobre o banco que patrocinou o evento, disse ter “largos interesses económicos em Angola” e acusou a sua administração de gostar “de lidar com criminosos”, além de deixar um aviso: "Pelos vistos o BES tem que ver quem convida para falar de desenvolvimento sustentado. É que lhe pode aparecer alguém a injuriar governantes estrangeiros".

Sem comentários:

Mais lidas da semana