Fernando Dacosta –
Jornal i, opinião
Se a carne é fraca,
a carteira é-o igualmente. A fraqueza da primeira revela-se saudável; a da
segunda não. É foleirota, é, essa sim, pornográfica. Se a ocasião faz o ladrão,
o inverso também.
Daí que o
guarda-chuva dos centrões democráticos se tenha tornado um figo para os
compadrios dos carteiristas perfumados, socialites do gamanço que depressa
conceberam leis para lhes blindarem, sob véus de respeitabilidades e
caridadezinhas, as descaradas trapaças. Este comportamento constitui, aliás, um
dos fenómenos mais curiosos dos últimos tempos. A mentalidade que o rege
revela-se relativamente nova na nossa cultura, pois em Portugal nunca vingou a
exultação doutrinária do dinheiro. Menosprezávamos os valores que se lhe
associavam, acreditando que era “mais fácil um camelo passar no furo de uma
agulha do que um rico entrar no reino dos céus”. Foi com o neoliberalismo que
começámos a deixar-nos fascinar pelo dinheiro, sobretudo se rápido e fácil, e
visível. Tê-lo deixou de ser desconfortante, volatilizando, consequentemente,
os valores da honradez, da solidariedade, do despojamento. Atordoados com isso,
os portugueses sentem-se hoje no vácuo. Apesar de bem vestidos, bem compostos,
têm a casa vazia e não sabem já como mantê-la.
A visão das pessoas
tornou-se parecida com a dos loucos. Daí comportarem-se, quando detêm poder,
acima do receio de punição, confundindo o ficcionado com o real, numa espécie
de alucinação que provoca aquilo a que se chama pele de elefante – primeira
fase para a metamorfose final. Temeroso de investidas suas (suas, dos elefantes
em que estamos a ser transformados), o governo prepara em segredo uma caçada
fiscal que os (nos) extermine de vez.
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