Diário de Notícias,
editorial
É duvidoso que as
instituições europeias, ao contrário do que afirmam os seus porta-vozes, tenham
já tirado todas as consequências devidas dos últimos dados desastrosos do
desempenho económico na Zona Euro. E, consequentemente, que tenham uma visão
suficientemente abrangente da degradação da situação social. Assim, não pode
senão causar alguma reserva ouvir dizer que Bruxelas tomou boa nota das
manifestações ocorridas no passado sábado em Portugal e que agirá em
conformidade para ajudar a sair do aperto a que chegou a vida de milhões de
portugueses.
Até ao momento, os
programas de apoio aos jovens desempregados, cofinanciados por fundos
europeus, saldam--se entre nós por um embaraçoso fracasso, e o País está
suspenso do 7.º exame da troika, ao qual está correntemente sujeito. Em termos
orçamentais, já muito poucos resistem a reconhecer que é preciso mais tempo
para conseguir funcionar correntemente com défices públicos bem inferiores a 3%
do PIB. E quanto às obrigações financeiras de pagamento da dívida pública,
aguarda-se o resultado do Eurogrupo - os 17 ministros das Finanças da Zona Euro
- e do seu presente "debate de orientação" para saber se o pedido
conjunto de Portugal e da Irlanda no sentido de alongar os prazos de reembolso
dos empréstimos contraídos vai obter o acordo dos seus pares.
Desde que os países
sob assistência se mantenham numa trajetória de redução de consolidação das
suas contas públicas (ainda que a marchas menos forçadas), o alargamento dos
prazos dos empréstimos e a redução dos juros exigidos constituem ajudas
concretas à saída dos respetivos programas de assistência. No fundo, o que os
credores querem ver é o alisamento dos picos de pagamentos dos próximos anos,
graças ao rescalonamento aceite pelos parceiros da Zona Euro, sem que isso
signifique fechar os olhos ao desregramento da disciplina orçamental, que levou
à crise das dívidas soberanas. E, complementarmente, se revele compatível com a
reanimação progressiva e realista da atividade económica.
Uma tendência
europeia?
Depois do excelente
resultado obtido nas legislativas italianas pelo "excêntrico" Beppe
Grillo, foi a vez de os austríacos nas eleições regionais da Caríntia e da
Baixa Áustria concederem, respetivamente, 11,3% de votos e 9,8% a um outro
"excêntrico", Frank Stronach, que surgiu a caçar votos em todo os eleitorado,
da esquerda à direita e, designadamente, à extrema-direita. Este é o outro
facto relevante do voto regional austríaco: a queda da extrema-direita, em
especial na Caríntia, feudo de Jörg Haider, morto há quatro anos e cuja memória
e carisma estão, naturalmente, a sofrer a erosão da passagem do tempo. O facto
de a extrema-direita se apresentar dividida por duas formações pode justificar
algo do resultado, mas os índices de voto nos sociais-democratas e na
democracia-cristã revelam que o apelo dos herdeiros de Haider está a perder
capacidade de mobilização. O que é uma boa notícia. Desconcertante, porventura
perigosa - e por isso mesmo a merecer séria reflexão -, é a recorrente presença
de "excêntricos" entre os mais votados. Epifenómeno ou sinal de algo
mais grave na prática e no discurso políticos "convencionais".
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