Deutsche Welle
A indústria têxtil
é conhecida por não respeitar regras trabalhistas internacionais. Cadeias de
fornecimento obscuras e condições de produção muitas vezes desastrosas maculam
a imagem do setor.
Raramente acidentes
de trabalho se transformam em manchetes de jornal. Em novembro de 2012, porém,
a morte de 112 pessoas no incêndio de uma fábrica de tecidos em Bangladesh foi
noticiada em todo o mundo, causando indignação internacional com as condições de
trabalho nas fábricas do país. Os operários do setor protestaram nas ruas da
capital, Dhaka. Poucos meses antes, 250 haviam morrido em consequência do fogo
em uma fábrica de tecidos no Paquistão.
Nas duas fábricas
eram produzidas mercadorias fornecidas para empresas de todo o mundo, inclusive
alemãs. Em Bangladesh, a cadeia de moda C&A mandava produzir camisetas para
vender no mercado brasileiro; e uma das empresas compradoras das mercadorias da
fábrica incendiada no Paquistão era a cadeia de roupas baratas KIK, com 3.200
filiais em toda a Europa. Depois dos incêndios, tanto a C&A quanto a KIK
afirmaram que contribuiriam para fundos de ajuda às vítimas e seus familiares.
Mínimo de justiça
nas relações
Para a rede
internacional Clean Clothes Campaign, esse gesto das empresas pode ser
simpático, mas não é suficiente. A "Campanha das Roupas Limpas"
empenha-se em prol de melhores condições de trabalho na indústria têxtil.
A Organização
Internacional do Trabalho (OIT) formulou exigências mínimas no tocante a padrões
sociais, resumidas em oito pontos: "não" ao trabalho forçado, à
discriminação, ao trabalho infantil, além da liberdade de união dos
trabalhadores em associações, salários justos, jornadas controladas, condições
dignas de trabalho e relações trabalhistas regulamentadas.
Mesmo na Europa,
essas exigências não são todas cumpridas, acentua Bettina Musiolek, da rede
Clean Clothes Campaign, em entrevista à DW. Ela se especializou no Leste
Europeu e na Turquia, onde condições de produção injustas são muito difundidas.
"Os maiores
problemas no Leste Europeu são os salários, as jornadas e a proteção do
trabalho e da saúde. Na Turquia, ainda há o agravante da falta de liberdade de
organização", diz Musiolek. Ela salienta que nem mesmo dentro da União
Europeia (UE) ou da Alemanha um salário mínimo justo é sempre coisa garantida.
Produção em países
pobres
Christoph Schäfer,
diretor do Departamento de Direito e Tributação da Confederação Alemã da
Indústria Têxtil e da Moda, admite que, também na Alemanha, uma operária do
setor não consegue necessariamente viver de seu salário. No entanto, tanto no
país como em vários outros da União Europeia, as trabalhadoras são amparadas
pelo Estado social. "Em último caso, o Estado é obrigado a contribuir. No
caso da Alemanha, isso se dá através de adicionais ou de benefícios
sociais", diz Schäfer.
A pressão por
preços mais baixos e a concorrência são enormes, disse à DW: "A indústria
têxtil é frequentemente acusada de optar pelos países onde a produção é mais
barata. É verdade, pois a pressão para reduzir os custos é enorme. Mas quando a
caravana da indústria têxtil passa, ela não deixa terra queimada para trás.
Normalmente, é através dela que o bem-estar e outras indústrias chegam a um
país", diz o representante da indústria têxtil.
Inegável é que a
produção de produtos baratos se dá nos países mais pobres do mundo. Quem
fabrica ofertas especiais para as liquidações dos países industrializados, não
precisa de trabalhadores qualificados nem de máquinas caras. Porém as
consequências da "caça às pechinchas" dos países ocidentais vão mais
longe: entre as vítimas, estão as condições dignas de produção nas fábricas.
Não se poupa somente nos salários, mas também na prevenção de incêndios e
condições de saúde, assim como nos contratos de trabalho pouco justos.
Barato graças à
exploração
Uma camiseta
produzida de maneira justa não pode chegar ao consumidor por meros 3 euros,
acentua Rolf Heimann, da empresa alemã de moda Hess Natur. "Da plantação
do algodão no campo, passando pela tecelagem, costura, tintura, confecção, até
a chegada ao comerciante, e em cima disso ainda os 19% de imposto sobre o
produto, isso jamais seria possível", declara Heimann, responsável dentro
da Hess Natur pelo setor de Responsabilidade Empresarial.
A fabricante alemã
produz desde 1976 roupas ecologicamente corretas e há mais de dez anos
empenha-se pela maior sustentabilidade social na cadeia de fornecimento. A
partir de 2005, como primeiro membro alemão, a empresa passou a fazer parte da
Fair Wear Foundation, uma rede internacional de fabricantes têxteis e
sindicatos. A organização é financiada pelas contribuições de seus membros e se
entende sobretudo como consultora no processo de implementação de padrões
sociais justos.
Imagem fair
"A indústria
têxtil tem cadeias de fornecimento muito complicadas. Há um grande número de
fornecedores e empresas terceirizadas, e se torna muito, muito difícil
controlar todos esses caminhos da fabricação", diz Martin Curley, da Fair
Wear Foundation, cuja sede fica em Amsterdã. Por isso, a rede não concede
nenhum selo garantindo ao consumidor que a mercadoria foi totalmente produzida
sob condições justas.
Curley acentua que
"simplesmente não é possível certificar que todo estabelecimento
fornecedor seja 100% justo". Segundo ele, é comum que as grifes da moda
tenham centenas de fornecedores. Em muitos casos, as grandes do setor nem
conhecem as empresas que trabalham para seus fornecedores.
Por isso a Fair
Wear Foundation vê como sua principal tarefa o acompanhamento contínuo das
empresas no processo de melhoria das condições de trabalho. "É mais
honesto dizer que as empresas que formam a rede se empenham pela melhoria dos
padrões. Publicamos todo ano um relatório social sobre elas, que os
consumidores podem ver no nosso site. Um selo, não podemos garantir",
completa Curley.
A rede é formada
por 80 empresas, que vendem mais de 120 marcas em 80 países. A fundação
controla ativamente as condições de trabalho em 15 países na Ásia, Europa e
África. Nenhuma das empresas pertencentes à Fair Wear Foundation mandava
confeccionar suas mercadorias nas fábricas incendiadas no Paquistão e em
Bangladesh.
Autoria: Helle
Jeppesen (sv) - Revisão: Augusto Valente
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