quinta-feira, 4 de abril de 2013

Portugal: A PENOSA CORRIDA DA MARATONA




Eduardo Oliveira Silva – Jornal i, opinião - foto António Pedro Santos

A censura foi rejeitada, mas os problemas ficam e agravam-se

Além dos enganos económico-financeiros, Vítor Gaspar teve outro do qual poucos se lembram. Foi quando disse, há cerca de um ano, que íamos no quilómetro 27 da maratona, tendo percorrido cerca de 2/3 do caminho, altura em que não se desiste. A desistência, dizia, dá-se entre os 30 km e os 35 km, numa comparação com os ajustamentos económicos, como se isso fosse óbvio.

A imagem foi feliz, mas era um erro crasso. A distância corrida estava mal contada. Quando Gaspar falou ainda nem tinha saído de cima de uma das pontes sobre o Tejo, quanto mais feito 2/3 do percurso. Os erros seguintes, que todos estamos a pagar, foram consequência do primeiro.

Nem mesmo a rejeição da moção de censura do PS verificada ontem na Assembleia atenua a percepção negativa que o país tem de um executivo que está a cair aos pedaços apesar dos esforços para disfarçar. O tempo das figuras de estilo está ultrapassado pelos limites dos sacrifícios e pela sua inutilidade.

A remodelação parece, pois, o único paliativo para dar um segundo alento à coligação. Já se sabe que pouco ou nada resolve, mas dadas as circunstâncias é o que se pode arranjar para limitar estragos. Todos os outros cenários são pouco prováveis ou impraticáveis porque não há condições.

Um governo saído da mesma maioria ou só do PSD e resultante do abandono de Passos não é provável, porque a desistência não está aparentemente no ADN do primeiro-ministro. Se houvesse essa hipótese, a única figura relativamente consensual seria Silva Peneda, como aqui se escreveu há alguns meses e agora tem sido retomado por terceiros, invocando Monti e a Itália.

Convocar eleições legislativas seria talvez o pior e o mais perigoso dos cenários. Não porque não sejam a forma mais legítima de resolver os assuntos, mas simplesmente porque temos autárquicas, europeias e metas imediatas que não permitem convocá-las, dados os prazos que isso implica. Ao contrário de outros países democráticos, e sobretudo dotados de uma classe político-jurídica competente, onde umas legislativas se convocam e fazem num mês, entre nós é bem diferente. Até na Grécia o assunto é tratado em poucas semanas. Vergonhosamente, em Portugal chamar o povo às urnas interrompe tudo e mais alguma coisa durante seis meses, pelo menos. Isto além de as sondagens indicarem que o PS não tem condições para apresentar uma alternativa maioritária.

Em vez da retórica habitual e inútil, talvez uma reforma consistente do sistema eleitoral fosse um contributo que os políticos pudessem dar para evitar os constantes impasses e estrangulamentos.

Isso sim, seria um passo essencial para a melhoria da qualidade da nossa democracia, que anda pelas ruas da amargura.

Passada a moção de censura aguardemos os dois episódios seguintes: a decisão do indolente Tribunal Constitucional e a reacção do governo e do Presidente, que desta vez vai mesmo ter de deixar os bastidores e vir a terreiro falar ao povo.

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