Eugénio Costa
Almeida* - Novo Jornal
Entre a formação da
OUA, em 25 de Maio de 1963, e a transformação em União Africana, em Julho de
2002, o Continente africano passou por diversas vicissitudes políticas,
económicas e sociais importantes, nomeadamente, a transformação das antigas
colónias europeias em – nalguns, poucos, casos de sucesso – potenciais Estados
geradores de importantes pólos de desenvolvimento económicos e políticos e
militares.
Os finais dos anos
80, particularmente após a implosão da antiga URSS, o fim do mito marxista e a
afirmação do neoliberalismo conservador, tão a gosto de Fukuyama ou de
Friedman, tem sido apontado e caracterizado como sendo o grande responsável
pela larga referência que se tem feito à democratização do Continente Negro,
com consequente proliferação de movimentos políticos em África, nomeadamente na
África subsaariana.
O norte africano
debate-se com um problema crucial: fazer coexistir os fundamentos de uma
religião ainda, temporalmente, medieva ou, pelo menos assim a querem
apresentar, não mutável e base de alguns sistemas políticos nacionais, com os
ideais democráticos ditos ocidentais e laicos, onde o direito do Estado
predomina sobre o direito eclesiástico. A “Primavera Árabe” é o exemplo vivo
disto mesmo.
São ou foram-no os
processos eleitorais em Angola, no Congo Democrático, no Gana, no Mali e na
Nigéria, entre outros, ou ainda as que aí vêm, como as esperadas e sempre não
marcadas eleições na Guiné-Bissau e Madagáscar, só para citar alguns exemplos,
resultantes de Coup d’États ilegais e condenados pelas instituições
internacionais, nomeadamente pela União Africana e que os centros decisórios
regionais não conseguem estancar.
Mas note-se que
este tipo de democracia, também conhecida por demoliberalismo, hoje em dia
tanto em voga nos países de Leste europeu, como na Europa ocidental, sem que,
no caso dos primeiros, tenha conseguido evitar a proliferação dos sangrentos
neonacionalismos, como os que se verificam no Cáucaso e nos Balcãs, não tem
sido, formalmente, acompanhado pelos Estados Africanos na mesma amplitude.
Mas se a nível
político, África tem registado evoluções e recuos sistemáticos, já a vertente
cultural não tem sido descurada, (nem por alguma vez essa questão se poderia
colocar), até porque, mais do que o desafio que à partida nos é imposto, África
é uma miscelânea de culturas com que a todo o passo tropeçamos. Aliás, a
primeira parte deste texto (não aqui reproduzido) aborda uma das problemáticas
culturais do continente, os fluxos migratórios, sejam internos, sejam externos,
bem assim toda a influência que os mesmos tiveram na formação cultural e, mais
tarde, na nova engenharia social e política da África em mutação.
Face aos actuais
movimentos políticos – uns, contestatários, outros, de ruptura – que por quase
toda a África persiste, é legítimo questionar se se trata de um sintoma em que
o sistema partidário que nos querem impor está em involução e, como tal, a ser
progressivamente substituído por um pluralismo cultural ou a caminho de uma
vertente politicamente proto-mexicanizada como se verifica em alguns Estados?
Para responder,
recorramos a uma tese sustentada por Chambino, nesse domínio.
Segundo ele, e em
função do modelo de implantação talassocrático do colonizador europeu –
registe--se que só em Portugal transmitiu um modelo talassocrático puro, os
ingleses e os franceses, mais estes que aqueles, adoptaram o modelo epirocrata
– existem o que se poderia designar por duas Áfricas.
Uma, a do contacto
e da mudança cultural, geralmente identificada com o urbanismo litorâneo, onde
a pedagogia e a massificação social superam as condicionantes da transição, e
outra, em que o contacto de culturas foi escasso ou, mesmo inexistente, sede do
conservadorismo e do privilégio costumeiro, representado pelos chefes
tradicionais, cujo poder é suportado pela complexa questão da legitimidade de
origem e que, factualmente, se opõem aos adeptos da mudança.
Qualquer das duas
Áfricas não abdica do direito que reivindica da manutenção e do exercício do
poder e, simultaneamente, com afectação egocêntrica.
Mas não deixam de
ser estas duas Áfricas quem continuam a lutar pela unidade africana e pela
criação e manutenção de um autêntico nacionalismo, se bem que mais continental,
que nacional.
Viva África! Vivam
os africanos!
Um pequeno
extracto, e sintetizado, da minha comunicação a apresentar pelo “Dia de África”
que se comemora no próximo dia 25 de Maio, na Faculdade de Direito de Lisboa, e
organizada pelo Núcleo de Estudantes Africanos da Faculdade de Direito de Lisboa.
*Angolano, Africano
e Investigador do CEA/ISCTE-IUL
Eugénio Costa
Almeida* – Pululu - Página
de um lusofónico angolano-português, licenciado e mestre em Relações
Internacionais e Doutorado em Ciências Sociais - ramo Relações Internacionais
-; nele poderão aceder a ensaios académicos e artigos de opinião, relacionados
com a actividade académica, social e associativa.
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