Filipe Paiva
Cardoso – Jornal i
O Memorando
assinado com a troika foi vendido aos portugueses com a promessa de uma
recuperação a curto prazo a servir de cenoura. Dois anos depois, o fracasso é
evidente
“Os ministros das
Finanças da zona euro congratulam-se com o apoio expresso pelos partidos da
oposição e apelam a todos os partidos políticos para que garantam uma
implementação rigorosa e rápida do programa.” A 16 de Maio de 2011 o Eurogrupo
aprova o pacote de ajuda de 78 mil milhões a Portugal e aplaude a postura dos
partidos então na oposição – e hoje no governo. Governo e oposição comprometem
o país a chegar ao final de 2013 com um défice de 3%, uma dívida de 108,6% e já
com a economia em expansão, de 1,2%.
Dois dias. Este foi o tempo que demorou até chegar o primeiro sinal que o optimismo
nas previsões não ia correr bem. 18 de Maio de 2011:o Instituto Nacional
deEstatística divulga que Portugal tem afinal 689 mil desempregados em Março de
2011, mais 71 mil que em Dezembro de 2010. Este salto deveu-se tanto às
mudanças no método de contabilização do INE, como à deterioração significativa
da economia portuguesa no início de 2011. “Para os observadores do mercado de
emprego estes dois efeitos desactualizam por completo a previsão do governo de
13% para o desemprego em 2013” ,
noticiava então o i. Longe estava o país de imaginar as derrapagens que se
seguiriam, suficientes para destruir os pressupostos sobre os quais o
ajustamento português foi pensado.
Défice
O acordo da troika
com PSD, PS e CDS dizia que entre 2012 e 2014 Portugal acumularia um défice de
9,8% – com 4,5% em 2012, 3% em 2013 e 2,3% em 2014. Agora, as mais recentes
previsões daCE apontam para um défice acumulado nestes três anos de 14,4%. A
diferença, de 4,6 pontos percentuais, traduzida em euros, significa uma
derrapagem de mais 7,6 mil milhões de euros de défice acumulado face ao desenho
inicial do ajustamento português, valor que foi ajudar na engorda da dívida.
Dívida Pública
A derrapagem no
défice, graças ao congelamento quase completo da actividade económica em
Portugal, foi então uma das razões para que as metas definidas para a dívida
também tenham derrapado, mas não foi a única.
O acordo inicial previa que este ano a dívida portuguesa chegaria ao seu
máximo: 108,6% – perto de 184,6 mil milhões de euros. Porém, a evolução da
crise, a deterioração da economia, das contas e das empresas tornou este
objectivo risível. A última previsão daComissão Europeia para este ano aponta
para uma dívida de 123% do PIB – 202 mil milhões de euros. São mais 17,5 mil
milhões de euros que o previsto, uma derrapagem que equivale a 10,5% do PIBcom
que Portugal chegará ao final deste ano. A derrapagem, contudo, não fica por
aqui, já que a dívida deve continuar a crescer nos próximos anos, ao contrário
do antecipado há dois anos.
Consumo privado
Era o alvo a abater
pelas autoridades internacionais e nacionais:os portugueses vivem acima das
possibilidades, logo, acabe-se com isso. Pior a emenda que o soneto:a
austeridade devia fazer com que o consumo privado recuasse 5,1% de forma
acumulada entre 2012 e 2013, mas a realidade e o “ir além da troika” acabou por
provocar um recuo que já vai em 8,9%, contando com a quebra de 3,3% este ano,
sendo esta a maior das causas da explosão do desemprego nos últimos anos.
Desemprego
Imagine cinco
Estádios da Luz cheios. As cerca de 312 mil pessoas que enchem esses cinco
recintos são aquelas que perderam o emprego em Portugal nos últimos dois anos e
que, segundo a troika, não o iam perder. A austeridade, o congelamento do
consumo e o intensificar da crise levaram a uma explosão do desemprego no país.
Em meados de 2011 previa-se uma taxa de 12,4% de desemprego para este ano. Já
as mais recentes previsões evidenciam que a taxa será no mínimo de 18,2%, ou
seja: em vez de 668 mil desempregados, há 980 mil. São mais 47%.
Exportações
Era o trunfo na
manga. A teoria para a recuperação portuguesa apostava em duas vias:esmagamento
do rendimento para reduzir as importações e fazer explodir as exportações. A
parte fácil até foi feita, com cortes salariais e o custo de vida a aumentar de
tal forma que os portugueses deixaram de consumir. Agora, o difícil continua
por fazer:o programa assenta a recuperação económica do país à boleia do
crescimento das exportações, que deveria ser de 5,9% em 2012 e mais 6,5% este
ano. Os números mais recentes mostram, contudo, que as exportações só irão
crescer 3,3% e 0,9%, em 2012 e 2013.
PIB
A acumulação de
derrapagens e dos efeitos secundários das mesmas, fez com que a evolução da
economia portuguesa fosse no sentido oposto ao previsto no Memorando. Na
teoria, seria já este ano que o crescimento regressava, com o PIB a expandir
1,2% em 2013, depois de uma contracção de 1,8% em 2012:os dois anos somados
resultariam assim num recuo de apenas 0,6% do PIB. Os factos mostram um cenário
bem mais negro:em 2012 e 2013 o PIB irá recuar 5,5%.
Sem comentários:
Enviar um comentário