domingo, 12 de maio de 2013

Portugal: GOVERNAR PELO MEDO




Pedro Almeida Cabral – Expresso, opinião

Um país com quase um milhão de desempregados, que corresponde a cerca de 18% da sua população activa, e com quase 40% de jovens entre os 15 e os 24 anos desempregados é um país com poucas perspectivas. E é certamente um país com medo. Pois não há grandes dúvidas de que haverá um milhão de desempregados ainda durante o ano de 2013.

Um país onde haveria quase 4,5 milhões de pobres se não houvesse qualquer tipo de transferência social (incluindo pensões) é um país em risco. Mesmo com transferências sociais, há ainda cerca de 1,8 milhões pessoas que vive com menos de € 360 por mês, que é a medida do limiar da pobreza. Ou seja, 18% dos portugueses são oficialmente pobres.
    
Estas duas descrições já seriam suficientes para perceber melhor em que país vivemos. Mas vamos ainda acrescentar mais uma. Portugal é o país com maior desigualdade de rendimentos da zona Euro. E, na União Europeia, só a Letónia e a Bulgária são mais desiguais.

É este o país que temos: um país pobre, onde o emprego escasseia e onde o fosso entre os mais ricos e os mais pobres é profundo.

Espera-se que o Governo deste país quando opta por diminuir o valor das pensões ou despedir funcionários públicos em massa o faça de forma ponderada, séria e transparente. Na verdade, o pobre país que temos até exige mais. Exige que estas decisões sejam fundamentadas e muito bem explicadas. É que os cidadãos não são menos cidadãos por serem pensionistas ou funcionários públicos. No actual contexto, ficar desempregado ou passar a receber uma quantia menor como pensão não é algo que possa ser tratado com ligeireza.

O que se passou nos últimos dias foi exactamente o contrário. Passos Coelho e Portas montaram uma encenação grosseira e aproveitaram-se abusivamente da pobreza que Portugal é. Primeiro, Passos afirma solenemente que será necessário uma nova contribuição de sustentabilidade sobre as reformas. Depois, Portas afirma solenemente que não pode haver uma nova contribuição de sustentabilidade sobre as reformas. Para concluir, os grupos parlamentares dos partidos do Governo fazem juras de amor. Entretanto, em completa contradição, surge a medida de cortar 10% de todas as pensões dos aposentados do Estado que, entretanto também, já foi desmentida. Não admira. Qualquer corte de 10% das pensões de aposentação parece ser gloriosamente inconstitucional.  
   
Mas já tinha havido mais episódios destes. Ainda na semana passada, correu a notícia de que tinha sido o Governo a salvar as pensões inferiores a € 600 das garras de Gaspar. Ou os vários números que têm surgido de funcionários públicos que têm de ser despedidos. Sem se esclarecer se haverá ou não subsídio de desemprego para estas pessoas.

Tudo isto demonstra que o Governo trata os pensionistas e os funcionários públicos como cidadãos de segunda, mas como primeiros responsáveis pela despesa do Estado e, portanto, merecedores de um tratamento de terceira. Decisões destas não podem estar sujeitas a golpes de teatro, desmentidos constantes e a uma completa falta de preparação. Mesmo que o Governo esteja numa situação delicada devido à sétima avaliação da Troika, não pode esquecer-se que governa para os seus cidadãos e não para os seus credores.

Depois da governação para além do memorando da Troika, o Governo passou simplesmente a governar pelo medo. Primeiro, assustam-se as pessoas com decisões que as podem condenar a uma vida de dificuldades. Depois, diz-se que afinal não era nada. Finalmente, surgem medidas alternativas, tão graves ou piores que as que foram rejeitadas.

Primeiro o Governo afunda-nos. Depois, salva-nos num acto de generosidade. Mas, na verdade, o afundamento e a salvação consistem exactamente no mesmo.

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