Ricardo Araújo
Pereira – Visão, opinião
Em 2002, Durão
Barroso disse que Portugal estava de tanga. Entretanto, passaram 11 anos e é
difícil negar que fomos perdendo cada vez mais roupa. Eu não sou crítico de
moda, mas creio que estamos perante uma impossibilidade.
Em 2002, Durão Barroso disse que Portugal estava de tanga. Entretanto, passaram 11 anos e é difícil negar que fomos perdendo cada vez mais roupa. Eu não sou crítico de moda, mas creio que estamos perante uma impossibilidade. Não é possível passar uma década a confiscar a indumentária a um povo que já está de tanga. Minto: é possível apenas em duas situações muito específicas e altamente improváveis. Se o povo em causa tiver a tanga vestida por cima do resto da roupa, pode dizer-se que está de tanga no primeiro momento, e fica apto a continuar a perder peças de vestuário antes de se achar completamente nu. Esta hipótese, a verificar-se, confirma a minha suspeita antiga de que o povo português é o Super-Homem. Tinha a tanga por cima da roupa em 2002 e foi ficando sem a capa e o fatinho de licra azul ao longo dos últimos anos. E aguentou tudo com força sobre-humana, que é a única maneira de um povo aguentar isto.
Outra hipótese: em
2002 o povo estava, de facto, de tanga, mas tinha várias tangas vestidas, umas
por cima das outras. E foi perdendo tangas, ano após ano, até estar na situação
em que se encontra agora - em que, se não está nu, estará, no máximo,
monotanga. Nesse caso, o povo português não é o Super-Homem. É uma espécie de
Tarzan multicueca. Um Tarzan que, tendo viagem marcada na Ryanair e, por não
querer pagar uma quantia extra pela bagagem, levasse todas as suas tangas
vestidas, por exemplo.
Seja qual for a
hipótese correcta, é seguro afirmar a excepcionalidade do povo português, dadas
as características admiráveis, quer do homem de aço, quer do rei dos macacos.
Não ignoro que haja bons argumentos para refutar estas hipóteses. Pode
dizer-se, por exemplo, que a posição em que estamos, no que à soberania diz
respeito, torna muito improvável que o povo português seja, na verdade, o rei
de alguma coisa, dado que temos cada vez mais dificuldade em fazer súbditos,
mesmo entre os símios. Também é difícil identificar o povo português com o
Super-Homem, sobretudo tendo em conta a extraordinária habilidade deste para
combater o crime e a nossa absoluta incapacidade de meter bandidos na cadeia.
Mas eu continuo inclinado para achar que o povo português tem uma identidade
secreta oriunda do universo da ficção, na medida em que me parece, ele próprio,
uma personagem fictícia: nenhum povo de carne e osso teria a capacidade de,
empobrecido e desesperado como está o nosso, manter a nobreza de alma que é
evidenciada quando os protestos se fazem a cantar e a rir.
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