segunda-feira, 17 de junho de 2013

Portugal: A GREVE DOS PROFESSORES



Tomás Vasques – Jornal i, opinião

O caminho trilhado por este governo não era inevitável, como muito boa gente nos quer fazer crer

Portugal perdeu 98 600 empregos só nos primeiros três meses deste ano, o que corresponde a uma perda de 1 100 empregos por dia, quase duplicando a média diária de perda de empregos nos últimos doze meses. Mas o que torna tudo ainda mais dramático é que esta situação vai piorar substancialmente nos próximos anos, pela contínua destruição do nosso frágil tecido económico, como resultado das políticas de austeridade impostas pelo governo desde há dois anos e a continuar com aquelas que estão na forja, nomeadamente a destruição, a curto prazo, de dezenas de milhares de empregos no funcionalismo público. Pior ainda: para a esmagadora maioria dos que perderam o emprego e dos que o vão perder nos próximos tempos, a esperança de voltar a trabalhar, seja em que profissão for, é quase nula, o que significa irremediavelmente, não apenas uma mudança no nível de vida e nos hábitos de consumo, mas a condenação à pobreza de milhões de portugueses de várias gerações. A insegurança, o medo de perder o emprego e a casa faz com que grande parte do país caminhe cabisbaixo para uma situação muito próxima da miséria, do chicote e da emigração que vivemos nos anos cinquenta e sessenta do século passado.

O caminho trilhado por este governo não era inevitável, como muito boa gente nos quer fazer crer, por ingenuidade ou má-fé, apesar de sabermos dos sacrifícios necessários à consolidação orçamental e à competitividade económica. O destino que este governo nos traçou foi uma opção de raiz ideológica. Da mesma maneira que a direita alemã, chefiada por Wolfgang Schäuble e Angela Merkel usaram a crise das "dívidas soberanas", protelando qualquer decisão, a nível da zona euro, que lhe pusesse cobro ou contivesse a ganância predadora dos "mercados", para meter a ferro e fogo os povos do Sul da Europa, também Vítor Gaspar e Passos Coelho, discípulos desta "solução final" gizada por Berlim, aproveitaram o "memorando" da troika para levarem a cabo uma política de terra queimada, de destruição da classe média, de salários baixos, de protecção social mínima, de um exército de desempregados, de miséria generalizada e sofrimento. Esta sórdida política revanchista urdida em surdina (os portugueses tomaram conhecimento através de um relatório do FMI que o "corte na despesa" será feito em menos um ano do que anteriormente tinha sido dito) não descura sequer os pormenores, como é o exemplo do adiamento, para Novembro, do pagamento do subsídio de férias a funcionários públicos e pensionistas.

Os resultados desta política estão à vista: o défice orçamental está incontrolável e a dívida externa dispara por aí acima todos os meses, inutilizando todos os sacrifícios exigidos à maioria dos portugueses. Por todo o lado surgem críticas a esta "solução final", mesmo no seio da oligarquia que decide sobre a vida de milhões de pessoas. Relatórios do FMI questionam as medidas do programa de "ajustamento" aplicado à Grécia, e, por tabela, a Portugal, enquanto Jean-Claude Juncker, primeiro-ministro do Luxemburgo e anterior presidente do Eurogrupo, desabafa: "Foi erro nosso dar ouvidos aos gurus dos mercados".

É neste quadro de desmoronamento social que deve ser vista a greve dos professores marcada para os dias dos exames. Ameaçados no que, neste momento, têm de mais sagrado - o emprego -, usam um dos mais elementares direitos democráticos à sua disposição para se defenderem das prepotências do governo. Muita gente "bem-pensante" veio condenar a decisão dos Sindicatos dos Professores, argumentando que a greve só prejudica os alunos e os pais, acompanhando o primeiro-ministro quando disse que os professores podiam expressar o seu descontentamento na greve geral marcada para 27 de Junho, ou que iria alterar a lei da greve para impedir estas situações. A "democracia" dos gurus dos mercados admite o direito à greve, desde que sejam marcadas ao domingo ou em dias feriados, para não "prejudicar" ninguém. Caso contrário, acaba-se com esse direito e outros direitos que por aí circulam e que "prejudicam a recuperação económica e financeira do país". Da indigência já ninguém nos salva, ao menos que se salve a democracia.

Jurista, escreve à segunda-feira

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