Tomás Vasques –
Jornal i, opinião
O caminho trilhado
por este governo não era inevitável, como muito boa gente nos quer fazer crer
Portugal perdeu 98
600 empregos só nos primeiros três meses deste ano, o que corresponde a uma
perda de 1 100 empregos por dia, quase duplicando a média diária de perda de
empregos nos últimos doze meses. Mas o que torna tudo ainda mais dramático é
que esta situação vai piorar substancialmente nos próximos anos, pela contínua
destruição do nosso frágil tecido económico, como resultado das políticas de
austeridade impostas pelo governo desde há dois anos e a continuar com aquelas
que estão na forja, nomeadamente a destruição, a curto prazo, de dezenas de
milhares de empregos no funcionalismo público. Pior ainda: para a esmagadora
maioria dos que perderam o emprego e dos que o vão perder nos próximos tempos,
a esperança de voltar a trabalhar, seja em que profissão for, é quase nula, o
que significa irremediavelmente, não apenas uma mudança no nível de vida e nos
hábitos de consumo, mas a condenação à pobreza de milhões de portugueses de
várias gerações. A insegurança, o medo de perder o emprego e a casa faz com que
grande parte do país caminhe cabisbaixo para uma situação muito próxima da
miséria, do chicote e da emigração que vivemos nos anos cinquenta e sessenta do
século passado.
O caminho trilhado
por este governo não era inevitável, como muito boa gente nos quer fazer crer,
por ingenuidade ou má-fé, apesar de sabermos dos sacrifícios necessários à
consolidação orçamental e à competitividade económica. O destino que este
governo nos traçou foi uma opção de raiz ideológica. Da mesma maneira que a
direita alemã, chefiada por Wolfgang Schäuble e Angela Merkel usaram a crise
das "dívidas soberanas", protelando qualquer decisão, a nível da zona
euro, que lhe pusesse cobro ou contivesse a ganância predadora dos
"mercados", para meter a ferro e fogo os povos do Sul da Europa,
também Vítor Gaspar e Passos Coelho, discípulos desta "solução final"
gizada por Berlim, aproveitaram o "memorando" da troika para levarem
a cabo uma política de terra queimada, de destruição da classe média, de
salários baixos, de protecção social mínima, de um exército de desempregados,
de miséria generalizada e sofrimento. Esta sórdida política revanchista urdida
em surdina (os portugueses tomaram conhecimento através de um relatório do FMI
que o "corte na despesa" será feito em menos um ano do que
anteriormente tinha sido dito) não descura sequer os pormenores, como é o
exemplo do adiamento, para Novembro, do pagamento do subsídio de férias a funcionários
públicos e pensionistas.
Os resultados desta
política estão à vista: o défice orçamental está incontrolável e a dívida
externa dispara por aí acima todos os meses, inutilizando todos os sacrifícios
exigidos à maioria dos portugueses. Por todo o lado surgem críticas a esta
"solução final", mesmo no seio da oligarquia que decide sobre a vida
de milhões de pessoas. Relatórios do FMI questionam as medidas do programa de
"ajustamento" aplicado à Grécia, e, por tabela, a Portugal, enquanto
Jean-Claude Juncker, primeiro-ministro do Luxemburgo e anterior presidente do
Eurogrupo, desabafa: "Foi erro nosso dar ouvidos aos gurus dos
mercados".
É neste quadro de
desmoronamento social que deve ser vista a greve dos professores marcada para
os dias dos exames. Ameaçados no que, neste momento, têm de mais sagrado - o
emprego -, usam um dos mais elementares direitos democráticos à sua disposição
para se defenderem das prepotências do governo. Muita gente
"bem-pensante" veio condenar a decisão dos Sindicatos dos Professores,
argumentando que a greve só prejudica os alunos e os pais, acompanhando o
primeiro-ministro quando disse que os professores podiam expressar o seu
descontentamento na greve geral marcada para 27 de Junho, ou que iria alterar a
lei da greve para impedir estas situações. A "democracia" dos gurus
dos mercados admite o direito à greve, desde que sejam marcadas ao domingo ou
em dias feriados, para não "prejudicar" ninguém. Caso contrário,
acaba-se com esse direito e outros direitos que por aí circulam e que
"prejudicam a recuperação económica e financeira do país". Da
indigência já ninguém nos salva, ao menos que se salve a democracia.
Jurista, escreve à
segunda-feira
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