Baptista Bastos –
Diário de Notícias, opinião
Nunca deixei de me
espantar com a desfilada insana de certos homens para o abismo da sua perdição
moral e intelectual. Nuno Crato é um deles. Li o admirável "O
Eduquês", que definia uma maneira de pensar e reduzia a subnitrato os
mitos propostos à nossa preguiça mental. Se o estilo é o homem, ali estava um
estilo e um homem que nos diziam ser toda a espécie de carneirismo a negação da
inteligência crítica. Assisti, depois, com o alvoroço de todas as curiosidades,
ao programa de Mário Crespo, na SIC Notícias, Plano Inclinado, e no qual o
nomeado e o prof. Medina Carreira discreteavam sobre os embustes incutidos por
esse nada abissal da hipocrisia política. Um aparte: ainda não percebi o que
provocou o desaparecimento abrupto do programa e, também, o eclipse de Alfredo
Barroso da antena, cuja lucidez era idêntica à informação que nos fornecia,
mantendo-se na conversa a senhora que emparceirava com ele. Teias que o império
tece.
Voltando ao Crato,
a vontade de ser ministro de um desprezível Governo como este parece tê-lo
obnubilado. Ou, então, a dubiedade já estava instalada e a falta de carácter
era congénita. Como pode o autor de "O Eduquês" e de tantas
intervenções televisivas marcadas pelas prevenções contra as evasivas e os
ardis ser o cúmplice de um projecto ideológico que visa mandar para o
desemprego muitos milhares de pessoas, e desmantelar pelo esvaziamento a escola
pública; como pode?
Diz-me pouco, mas
talvez diga alguma coisa a circunstância de Crato ser proveniente da
extrema-esquerda, aquela contra o "revisionismo" e os
"sociais-fascistas." O combate, afinal, era outro, e a
"convicção" constituía um investimento futuro.
O braço-de-ferro do
ministro e dos professores nunca foi por aquele decentemente esclarecido. A
verdade é que os professores, ameaçados, aos milhares, de ser
"dispensados", apenas lutam pelos seus lugares e pelo trabalho a que
têm direito. E a utilização dos estudantes como estratagema político é sórdida.
Crato desonrou-se ainda mais do que o previsível. Ao aceitar ser vassalo de uma
doutrina doentia, arrastadora de uma das maiores crises da nossa história, ele
não só volta a perjurar os ideais da juventude, como o que escreveu e disse.
É preciso acentuar
que esta situação não se trata de uma birra do ministro. O despejo de milhares
e milhares de pessoas faz parte de um programa mais vasto. Crato é um pequeno
parágrafo num acidente histórico preparado ao pormenor por estrategos ligados à
alta finança. Outra face do totalitarismo que, sob o eufemismo de
"globalização", tende a uma hegemonia, a qual está a liquidar os
nossos valores morais e os nossos padrões de vida. A emancipação das
identidades, que formou a tradição universalista e a democratização social,
está seriamente intimidada por gente ignóbil como Nuno Crato.
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