segunda-feira, 10 de junho de 2013

Portugal: Ó ELVAS, Ó ELVAS. UM NOVO MOMENTO À VISTA?

 

Pedro Rainho – Jornal i
 
As marcas militares deram à cidade o título de guardiã da independência nas lutas contra os espanhóis. Consideradas património mundial, podem agora servir para reabilitar uma região que não passa ao lado das dificuldades económicas que se sentem
 
Francisco Coelho vive com um apelido que os últimos anos quase lhe deram vontade de enjeitar. O diagnóstico negativo vem por arrasto. "Eu trabalho todos os dias do ano, não me posso queixar, mas que as coisas não estão bem em Elvas, isso não estão", diz o responsável por uma herdade de Ameixas, às portas da cidade, quando pela calçada se aproxima a comitiva do Presidente da República, que escolheu o local para as comemorações do 10 de Junho. "Vou perguntar sobre o meu futuro, porque está nas mãos deles" -foi essa, garante Francisco, a resposta que o filho, Eduardo, de 11 anos, devolveu à professora, quando esta lhe pediu uma pergunta para colocar ao chefe de Estado. Eduardo será novo para perceber, mas talvez venha a testemunhar de perto uma outra fase na história de Elvas. As muralhas estão lá, para onde quer que se olhe, a lembrar que dali se defenderam as fronteiras de um país, quando do outro lado vinham ameaças à soberania da nação. As montras vazias também aparecem na fotografia, para dizer que a fórmula de crescimento esgotou e que é preciso encontrar uma nova saída para a cidade.
 
O presidente da câmara municipal, José Rondão Almeida, a cumprir o último mandato na autarquia, admite ao i o impacto da crise económica na região, mas detecta um efeito menos acentuado que em concelhos vizinhos. "Por duas razões fundamentais: porque as obras públicas têm avançado e porque os programas sociais da autarquia são os mais completos do nosso país." A câmara é um balão de oxigénio (rarefeito) da actividade económica da cidade, sem o apoio da qual o número de empresas a fechar portas certamente dispararia. Rondão Almeida reconhece isso mesmo, quando diz que "sem investimento público avultado [que actualmente ronda os 17 milhões de euros, sobretudo destinados à requalificação urbana] e sem os 26 programas de apoio social, o impacto da crise actual seria muito maior, à semelhança de inúmeros concelhos onde tal realidade não acontece".
 
Sem indústria de peso na região, tem valido o campo às "gentes de Elvas", como o Presidente da República se lhes referiu ontem. A zona está "muito ligada à agricultura, onde as culturas de cereais, olivicultura e tomate, são áreas a realçar", refere o presidente da Associação Empresarial da cidade, Nelson Pestana. Nas ruas do centro histórico, dentro das muralhas do Castelo, as lojas com produtos típicos da região, os cafés e restaurantes são um espelho da anemia económica do país. "Com um posicionamento no interior, temos verificado que as empresas da cidade têm passado por muitas dificuldades económicas, uma vez que o poder de compra baixou, cada vez mais a taxa de desemprego aumenta, o que vai proporcionar uma quebra acentuada no consumo", destaca Nelson Pestana.
 
SEGUNDA VIDA
 
Sem fábricas como as do Norte do país, que empregam centenas de pessoas, e sem uma agricultura que requeira mais que algumas centenas dos braços da região, para onde pode Elvas virar-se para impedir a sangria de jovens para o litoral ou para o estrangeiro?
 
A classificação como património mundial lançou a primeira pista. O Forte da Graça (onde Mário Soares, Sá Carneiro ou Álvaro Cunhal acrescentaram o nome à lista de presos políticos do Estado Novo), o Aqueduto da Amoreira, o Castelo, as Muralhas Seiscentistas, o Forte de Santa Luzia, os Fortins e o Centro Histórico - marcas de outros tempos que deram o seu contributo à cidade, quando as Nações Unidas viram ali um património digno de ser preservado. Desde Junho de 2012, quando foi atribuído o título, a autarquia admite ter "notado um incremento do número de visitantes e turistas da ordem dos 300 por cento, com reflexos positivos na economia local". Encontrada a rejuvenescida área de investimento, Nelson Pestana sublinha: "Agora, não podemos deixar escapar esta oportunidade de contornar a crise, uma vez que temos um potencial enorme por explorar, e temos grandes capacidades de o fazer."
 
É preciso olhar de cima para a cidade, e reduzir no mapa a escala da região, para perceber onde reside outra saída para a cidade. "Elvas situa-se no centro geométrico de um triângulo de cidades Património Mundial, todas a menos de cem quilómetros de distância: Évora, Mérida e Cáceres", aponta o socialista Rondão Almeida. Além disso, os 170 mil habitantes de Badajoz, fazendo jus à canção e mostrando-se a uma dúzia de quilómetros, dão a Elvas "a localização ideal para [em Elvas] ser construída uma plataforma logística intermodal, onde seja feito o interface entre os portos atlânticos de Lisboa, Setúbal e Sines e o interior da Península Ibérica". "Este é o investimento público estruturante mais importante, no futuro imediato deste concelho", sublinha o autarca, deixando antever o trabalho que quem lhe suceda poderá vir a desenvolver.
 

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