Pedro Rainho –
Jornal i
As marcas militares
deram à cidade o título de guardiã da independência nas lutas contra os
espanhóis. Consideradas património mundial, podem agora servir para reabilitar
uma região que não passa ao lado das dificuldades económicas que se sentem
Francisco Coelho
vive com um apelido que os últimos anos quase lhe deram vontade de enjeitar. O
diagnóstico negativo vem por arrasto. "Eu trabalho todos os dias do ano,
não me posso queixar, mas que as coisas não estão bem em Elvas, isso não estão",
diz o responsável por uma herdade de Ameixas, às portas da cidade, quando pela
calçada se aproxima a comitiva do Presidente da República, que escolheu o local
para as comemorações do 10 de Junho. "Vou perguntar sobre o meu futuro,
porque está nas mãos deles" -foi essa, garante Francisco, a resposta que o
filho, Eduardo, de 11 anos, devolveu à professora, quando esta lhe pediu uma
pergunta para colocar ao chefe de Estado. Eduardo será novo para perceber, mas
talvez venha a testemunhar de perto uma outra fase na história de Elvas. As
muralhas estão lá, para onde quer que se olhe, a lembrar que dali se defenderam
as fronteiras de um país, quando do outro lado vinham ameaças à soberania da
nação. As montras vazias também aparecem na fotografia, para dizer que a fórmula
de crescimento esgotou e que é preciso encontrar uma nova saída para a cidade.
O presidente da
câmara municipal, José Rondão Almeida, a cumprir o último mandato na autarquia,
admite ao i o impacto da crise económica na região, mas detecta um efeito menos
acentuado que em concelhos vizinhos. "Por duas razões fundamentais: porque
as obras públicas têm avançado e porque os programas sociais da autarquia são
os mais completos do nosso país." A câmara é um balão de oxigénio
(rarefeito) da actividade económica da cidade, sem o apoio da qual o número de
empresas a fechar portas certamente dispararia. Rondão Almeida reconhece isso
mesmo, quando diz que "sem investimento público avultado [que actualmente
ronda os 17 milhões de euros, sobretudo destinados à requalificação urbana] e
sem os 26 programas de apoio social, o impacto da crise actual seria muito
maior, à semelhança de inúmeros concelhos onde tal realidade não
acontece".
Sem indústria de
peso na região, tem valido o campo às "gentes de Elvas", como o
Presidente da República se lhes referiu ontem. A zona está "muito ligada à
agricultura, onde as culturas de cereais, olivicultura e tomate, são áreas a
realçar", refere o presidente da Associação Empresarial da cidade, Nelson
Pestana. Nas ruas do centro histórico, dentro das muralhas do Castelo, as lojas
com produtos típicos da região, os cafés e restaurantes são um espelho da
anemia económica do país. "Com um posicionamento no interior, temos verificado
que as empresas da cidade têm passado por muitas dificuldades económicas, uma
vez que o poder de compra baixou, cada vez mais a taxa de desemprego aumenta, o
que vai proporcionar uma quebra acentuada no consumo", destaca Nelson
Pestana.
SEGUNDA VIDA
Sem fábricas como
as do Norte do país, que empregam centenas de pessoas, e sem uma agricultura
que requeira mais que algumas centenas dos braços da região, para onde pode
Elvas virar-se para impedir a sangria de jovens para o litoral ou para o
estrangeiro?
A classificação
como património mundial lançou a primeira pista. O Forte da Graça (onde Mário
Soares, Sá Carneiro ou Álvaro Cunhal acrescentaram o nome à lista de presos
políticos do Estado Novo), o Aqueduto da Amoreira, o Castelo, as Muralhas
Seiscentistas, o Forte de Santa Luzia, os Fortins e o Centro Histórico - marcas
de outros tempos que deram o seu contributo à cidade, quando as Nações Unidas
viram ali um património digno de ser preservado. Desde Junho de 2012, quando
foi atribuído o título, a autarquia admite ter "notado um incremento do
número de visitantes e turistas da ordem dos 300 por cento, com reflexos
positivos na economia local". Encontrada a rejuvenescida área de
investimento, Nelson Pestana sublinha: "Agora, não podemos deixar escapar
esta oportunidade de contornar a crise, uma vez que temos um potencial enorme
por explorar, e temos grandes capacidades de o fazer."
É preciso olhar de
cima para a cidade, e reduzir no mapa a escala da região, para perceber onde
reside outra saída para a cidade. "Elvas situa-se no centro geométrico de
um triângulo de cidades Património Mundial, todas a menos de cem quilómetros de
distância: Évora, Mérida e Cáceres", aponta o socialista Rondão Almeida.
Além disso, os 170 mil habitantes de Badajoz, fazendo jus à canção e
mostrando-se a uma dúzia de quilómetros, dão a Elvas "a localização ideal
para [em Elvas] ser construída uma plataforma logística intermodal, onde seja
feito o interface entre os portos atlânticos de Lisboa, Setúbal e Sines e o
interior da Península Ibérica". "Este é o investimento público
estruturante mais importante, no futuro imediato deste concelho", sublinha
o autarca, deixando antever o trabalho que quem lhe suceda poderá vir a
desenvolver.
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