Isabel Tavares –
Jornal i
O ex-deputado
considera que os militares estão a ser maltratados. Se é assim, também quer um
sindicato que o defenda
Sanches Osório está
"desconsolado" e "inquieto". Foi um dos capitães de Abril,
mas diz que a História se encarregou de ir alterando os factos de tal forma que
às vezes se pergunta se alguma vez participou na revolução. E fala dos seus
pontos de revolta de hoje: co-adopção, casamento gay, reestruturação das Forças
Armadas, cortes nas pensões. Não acredita que alguma coisa se resolva com os
actuais partidos políticos: Paulo Portas é tudo menos cristão, Passos Coelho
não serve, Cavaco é uma fraude, Louçã e os que lhe estão perto são ditadores e
o PC é... o PC. Diz que já estamos em guerra e comenta as palavras de Mário
Soares, "um político com defeitos mas com intuição" e que tem vindo a
apelar à contestação. É por aí que começamos.
Várias
personalidades têm apelado à revolta, a começar por Mário Soares. Concorda com
ele?
Mário Soares tem
uma intuição política extraordinária. As palavras às vezes faltam-lhe, mas o
raciocínio está correcto. Havia um maluquinho no Miguel Bombarda que pensava a
uma velocidade tremenda e então, para verbalizar o seu pensamento, fazia:
zzzzzzzzzzzzzzzzzzzzz. Mas ele tem razão em muitas coisas.
Em quê?
Acho que o governo
já devia ter caído há muito tempo e que alguém o vai defenestrar. E quanto mais
legitimidade tiver, mais rapidamente chega ao chão.
O governo tem
legitimidade?
Tem, isso é um
facto. Miguel Vasconcelos, que em 1650 saiu pela janela, diz-se, também tinha
toda a legitimidade, porque os Filipes eram reis legítimos em Portugal. E foi
defenestrado.
Quem vai deitar
abaixo este governo?
Não sei. Eu tive a
ideia, quando foi a última reunião do conselho de Estado, de sugerir ao chefe
da Casa Civil do senhor Presidente da República que distribuísse um baralho de
tarot a cada conselheiro.
Para quê ou porquê?
Porque não acho que
nada disto seja realista. Você pede-me uma nota de 500 euros e eu digo: não
tenho, mas tenho uma esferográfica amarela. As pessoas estão conformadas mas
isto é doentio.
Temos compromissos
assinados com os nossos credores...
O que sei é que
temos leis e se, sistematicamente e não modificando as leis, quando se trata de
as aplicar não o fazemos porque as circunstâncias são especiais, então não
vivemos num Estado de direito. De resto, quando um governo cai há uma lei
eleitoral, há partidos políticos, há eleições.
Acredita que o
governo vai cair?
Eu gostava que sim.
Pode acontecer e, em minha opinião, já devia ter acontecido: cair na Assembleia
da República.
Houve um momento em
que isso devia ter acontecido?
Na votação do
Orçamento do Estado, não tenho a menor dúvida. Eu sou deputado, não estou de
acordo com o Orçamento, mas voto a favor e depois faço uma declaração a dizer
que estou contra? Tenho é obrigação de votar contra. A Assembleia da República,
tal como está a funcionar neste momento, se calhar não precisa de tantos
deputados. Em vez de 230 bastam cinco e cada um levanta um cartaz a dizer
quanto vale: 20, 40, 80 votos. Fica muito mais económico.
Foi deputado no
âmbito de uma coligação. Já era assim?
Fui eleito primeiro
por Lisboa, depois por Santarém. Passei a deputado independente porque o
Partido Comunista propôs um voto de louvor à escritora Maria Lamas e eu resolvi
votar a favor. O meu partido, o CDS, pediu meia hora de intervalo e fez uma
reunião para me moer o juízo. Achei óptimo e sugeri que podiam aproveitar que
estavam todos juntos para me expulsar, mas eu não votaria contra. Passei a
independente, com uma cadeira à minha disposição no hemiciclo, outra nos
corredores? E tinha as casas de banho, também. Acho uma coisa completamente
indecorosa.
Continua a ser
difícil ir contra a disciplina de voto...
Defendo que os
votos no parlamento devem ser inteiramente livres, com excepção de duas coisas:
o Orçamento do Estado e as moções de confiança.
Existe um momento
certo para se fazer uma revolução?
Pergunta bem.
Porque é que se fez a revolução no dia 25 de Abril? Porque tinha de ser antes
do 1 de Maio e porque tinha que ser a meio da semana, caso contrário as pessoas
iam para fora. Temos de ser racionais - saber ler nas entrelinhas -, mas a
nossa classe política está a ser irracional. Emitem sinais e depois vêm os
comentadores explicar esses sinais? Se pegarmos no "Diário da
República", a coisa é pior ainda, porque começam por não se entender as
leis.
Alguma em
particular?
Havia o problema
concretíssimo das candidaturas às autarquias. Pode um especialista autarca,
doutorado em autarquias, vir de Melgaço para a câmara de Cascais? Se há uma lei
e ninguém se entende, nada mais simples do que perguntar a quem a fez o que
queria. (continua)
Sem comentários:
Enviar um comentário