JOÃO MANUEL ROCHA - Público
Gabriel Costa,
primeiro-ministro de São Tomé e Príncipe, faz depender futuro político do que
"conseguir fazer" até 2014.
O petróleo que São
Tomé e Príncipe pode começar a explorar em 2016 não é, por si só, chave para o
desenvolvimento, considera o primeiro-ministro, Gabriel Costa. "Temos de
ter cuidado para que não seja motivo de deslize", alertou, em entrevista
ao PÚBLICO, numa recente passagem por Lisboa. No regresso a um cargo que já
ocupou em 2002, fala também sobre o relacionamento do país com as potências da
região e defende regras mais apertadas na formação de partidos, para melhorar a
governabilidade.
Lidera um Governo
apoiado por partidos que derrubaram o executivo saído das eleições de 2010.
Isso não diminui a sua actuação?
É uma situação
complexa mas não me diminui. É uma solução constitucional. Depois de esgotados
os contactos com o partido que ganhou as eleições [Acção Democrática
Independente, ADI], que era também minoritário, a posição mais judiciosa era
terminar a legislatura chamando o segundo mais votado [Movimento de Libertação
de São Tomé e Príncipe, MLSTP/PSD]. Esse partido contactou as outras forças da
oposição para uma coligação e fizeram um acordo comigo. Eu nem sequer estava na
política, era bastonário dos advogados. Tive intervenções cívicas, por isso é
que acharam que podia credibilizar um Governo.
O seu antecessor,
Patrice Trovoada, fala numa "deriva totalitária".
É um excesso que
mostra o desnorte de alguém que em vez de estar em São Tomé à frente do seu
partido escolheu não um exílio forçado mas um exílio a que está habituado.
Quando não está no poder está no exterior. São palavras pomposas que não têm
qualquer sentido. Ele não é a pessoa mais indicada para falar de autoritarismo.
No Governo dele houve atitudes completamente autoritárias, inclusive manter
preso um cidadão estrangeiro contra a decisão do tribunal. É preciso muita
desfaçatez. Não tem qualquer correspondência com a situação do país. Se não fez
nada [de mal] não tem de ter medo. É vítima de uma moção de censura porque tinha
mau relacionamento quer com a Assembleia quer com o Presidente, não queria
prestar contas. Teremos muito gosto em tê-lo em São Tomé no contraditório
político. Agora ninguém está acima da lei. Geriu a coisa pública e se
porventura existem anomalias tinha de estar lá corajosamente, como outras
pessoas fizeram, para responder.
Desde a abertura
política, em 1990, o país teve 15 ou 16 primeiros-ministros. Isso é sinal de
quê? Como é que pode ser de outra forma?
Sou das pessoas que
se têm preocupado com a estabilidade. Fiz, como jurista, uma conferência para o
grupo parlamentar da ADI sobre as reformas que eram necessárias para haver
estabilidade. O nosso problema não está na instituição, está nas nossas
agendas, que muitas vezes se sobrepõem à agenda de interesse nacional. No dia
em que deixarmos de pensar em primeiro lugar no interesse dos nossos grupos,
dos nossos partidos, vamos ver que é fácil resolver o problema da instabilidade
crónica.
Em que é que
consistiriam as reformas?
O sistema eleitoral
não permite, com a quantidade de partidos que existem, obter maiorias estáveis.
Há uma dispersão de votos. É preciso diminuir drasticamente o número de
partidos. Não há diferenças substanciais entre [muitos].
Isso não deve ser
resultado das escolhas dos eleitores?
Hoje são precisas
250 assinaturas para criar um partido. É preciso aumentar esse número para
desencorajar os partidos que não atingem, por exemplo, a bitola de 2500
eleitores. Temos de corrigir alguns erros. Por exemplo aquilo a que chamo
transumância política. Saem de um partido para outro partido... A reforma deve
consistir nalguma obrigação de formar quadros para governar. Não podemos ter em
média uma eleição por ano. Faz com que estejamos permanentemente em campanha.
As legislativas poderiam bem ser eleições próximas das autárquicas e regionais.
São frequentes as
denúncias de corrupção mas fica-se por aí. Há a ideia de que não há combate à
corrupção.
É verdade, e tenho
esse sentimento, que a culpa morre sempre solteira. Decidi que vou fazer tudo
para que os detentores dos cargos públicos sejam responsabilizados pelo fazem.
Por isso é que estou com uma iniciativa legislativa nesse sentido. Quero que
São Tomé e Príncipe seja uma praça financeira mas não uma espécie de chamariz
para actividades ilícitas que se possam traduzir no branqueamento de capitais.
Há alguma manifestação de existência de tráfico de droga como placa giratória
para entrada na Europa. É preciso que criemos condições para que assim não
seja, isso implica uma série de medidas, nomeadamente [para evitar] a
permeabilidade das fronteiras.
A principal
exportação do país é ainda o cacau mas a perspectiva é que a curto prazo seja o
petróleo. A exploração pode começar em 2016.
Estou convencido
que vai ser a prestação de serviços, por causa da localização geográfica. Foram
dados passos nas telecomunicações. O sector terciário é que vai ter impacto na
nossa economia. Daí a importância de concretizar o porto de águas profundas. No
petróleo há perspectivas encorajadoras.
O petróleo não é
também motivo de querela política?
A tendência para o
controlo do poder por causa da perspectiva de exploração petrolífera suscitou
interesse nalgumas pessoas, umas bem e outras mal-intencionadas, ávidas de
enriquecimento. Temos de ter algum cuidado para que isso não seja motivo de
deslize. Devemos socorrer-nos de experiências de outros países.
O petróleo será a
chave para a resolução dos problemas de São Tomé?
O petróleo não pode
ser o milagreiro dos nossos males. Temos de organizar o país, continuar a
formar gente.
O petróleo torna
São Tomé apetecível para potências regionais como Angola e a Nigéria. Como se
posiciona face a esses países?
São Tomé tem de
fazer a política do seu interesse. São países com os quais se deve relacionar.
Há aspectos em que tem maior afinidade com Angola. Falamos a mesma língua,
tivemos um passado comum. Tem uma relação privilegiada com Angola, como tem com
Portugal. Contrariamente a um disparate que ouvi do meu predecessor, ninguém
está a dizer que Angola vai resolver os problemas de São Tomé. A Nigéria também
é um parceiro privilegiado. Os santomenses é que têm de definir as políticas
que lhes permitam sobreviver como Estado soberano.
Sem comentários:
Enviar um comentário