A lagoa pestilenta do
Kilamba
William Tonet e
Arlindo Santana – Folha 8, edição 1155 – 17 agosto 2013
As desventuras no
(des)caminho dacomercialização das m o r a d i a s da centralidade do Kilambaforam
tantas, que vale a pena fazer um rápido“flas-back” sobre os acontecimentos
passados e debruçarmo-nos sobre uma denúncia que chegou à mesa da nossa Redacção a
propósito do que se passa actualmente nesse aglomerado habitacional, que, com
tanto atropelo por que passou, se poderia aventar que se encontra abraços com
algum feitiço!
Depois de JES ter
inaugurado pomposamente em Julho de 2011, de entremeio com muitos arrotos de
lagosta, a chamada 1ª fase da Centralidade do Kilamba (as obras estavam e ainda
hoje estão longe do seu previsto termo),os resultados práticosdessa empreitada
redundaram num aparatoso fracasso, pois as mais de 20 mil moradias à
venda apresentavam-se como praticamente invendáveis e ficaram vazias durante longos
meses, denunciando um desinteresse total no que toca à aderência de compradores
das mesmas. Por causa dos preços, propostos sem levar minimamente em conta o poder
de compra do angolano da classe média. É evidente que das classes mais carentes
seria simplesmente absurdo falar.
Passado mais ou
menos um ano, em meados do ano passado, 2012, a prestigiosa revista
National Geographic publicou uma reportagem sobre a centralidade do Kilamba com o
seguinte título: «Chineses de Angola constroem cidade fantasma», desenvolvendo
esta epígrafe com alguns comentários que de laudativo nada tinham e de
que salientamos aquele que melhor define o fracasso do projecto presidencial, «os
apartamentos do Kilamba foram propostos para venda, via publicidade on line, a
preços entre 60 mil e 120 mil dólares (que depois passaram a ser de 120 a 200 mil
dólares), não obstante se estime que 2/3 dos angolanos vivem com menos de 2 dólares
por dia». Genial! No sentido da mediocridade a caminhar para o absurdo!
Naturalmente,
quando o Executivo, lá do alto do seu pedestal de extra terrestre,soube da
publicação desse artigo da National Geografic, difundida em quase todos os países
do mundo, viu--se obrigado vir a público dar uma explicação aos angolanos e
concluiu que era preciso aligeirar a burocracia e o resultado foi o aparecimento
de uma espécie de inferno criado pelas empresas Sonip, ligada à Sonangol e a
Delta Imobiliária, agência ligada, ela, à Sonip. Tudo em família.
O remendo furado de
JES
Os geniais peritos
do MPLA e do Futungo, coadjuvados pelos cientistas da Sonangol, cozinharam então um
sistema de pagamento que deveria, teoricamente, resolver o problema do enchimento
das casas virgens do Kilamba, baseado no princípio de pagamento de uma entrada, variável
segundo o tipo de residência (para um T3, por exemplo, entrada é de 16 mil dólares),
seguida de um período de tempo variável, entre 15 e 20 anos,
segundo a idade do comprador, de pagamento de um aluguer levado em conta para o
pagamento da residência.
Entusiasmadíssimas,
centenas de pessoas começaram a fazer fila de madrugada em Luanda para
se inscreverem como candidatos a um apartamento nos projectos do Kilamba, Kapari,
44, Cacuaco e Zango. Pois é, mas o problema é que, além do oficial esquema teórico
de acesso à compra das residências, nomeadamente das do Kilamba, apareceram
outros esquemas em forma de vírus, hackers e outras espécies de parasitas, logo à
entrada, no arranque do processo, a vender fichas que davam acesso à compra de uma
casa. A banda de parasitas chegava a passar a noite no Kilamba para poder receber
as fichas e em seguida poder cobrar umas centenas de dólares por cada uma delas,
revezando-se e colocando nomes de pessoas que nem sequer se encontravam no local.”
A rede estendeu-se até às bombas de combustível próxima e pelo Keroa onde se ia
aglomerando“ o povo faminto, por ter passado dias ao relento, sem se alimentar e a
dormir no chão”. Era só vê-los!
Naturalmente que o
pessoal de asseguramento da polícia não podia ficar de fora deste quinhão,
afinal isto é Angola e todo mundo se vira como pode, para eles o preço rondava
entre 200 a 400 dólares. De resto, a propósito da obtenção dessas fichas chegou a
haver maka entre os homens ao serviço da Segurançado Estado, MININT de um lado,
FAA do outro, perante o olhar sereno da SONIP e da DELTA, que, estando-se
completamente a marimbar para o povo, estabelecia uma obrigatoriedade de presença
às 16h, às 20h, às 0h, e às 4h da manhã, e caso o mwangolé faltasse a umas das
chamadas o seu nome que estava nos números 50, rapidamente se transformava em 2182. O
mais espantoso de tudo isto, é que esta rebaldaria sem nome, esta
vergonha inqualificável, esta roubalheira generalizada, toda esta sujeira foi,
como de costume, digerida nas calmas pelos agentes de autoridade do Estado,
que também deviam comer no mesmo bolo. E, entretanto, não se viu um único
dirigente mesmo da oposição, levantar-se para denunciar esta vergonhosa
situação, dir-se-ia mesmo que muitos dirigentes, considerados por muitos
populares, como os palhaços do governo acham que tudo o que se está a passar no
Kilamba é normal. É próprio. Isto é Angola!
Depois veio o tempo
das chuvas e o Kilamba transformou-se numa espécie de afluente do rio Kwanza. É
que o saneamento básico, feito em cima do joelho e ao mais baixo custo
possível, não deu vazão aos aluviões causados pelas intempéries e a
centralidade virou rio; depois havia as casas que rapidamente começaram a
apresentar fissuras inquietantes; a partir de Fevereiro, de entremeio com
inundações e hesitações, o regime conseguiu encontrar um meio de comercializar as
casinhas des onho… E agora, mais de dois anos depois da sua
espampanante inauguração pimpas, a centralidade continua a estar longe de
ter chegado ao termo da sua construção, apresentando semelhanças inquietantes com
um ovo oco que se foi enchendo, mas mal, a braços com defeitos de fabrico graves,
como prova a denúncia que recebemos esta semana na nossa Redacção.
Kilamba de Agosto
de 2013 consome águas das fossas
A denúncia sobre
mais um percalço que assola o tortuoso percurso da comercialização das moradias e
apartamentos da centralidade do Kilamba foi-nos comunicada por
um pacato cidadão angolano, ex-expatriado na Alemanha, que tinha regressado à
pátria com a ideia fisgada de se instalar e colaborar no engrandecimento
de Angola. Instalou-se na cidade do Kilamba, que ele pensava ser aquilo que a
propaganda do regime fazia e faz por intermédio da TPA, o que o levou a
compará-la, na sua mente, às mais belas e conseguidas cidades modernas do Mundo. O
homem chegou, viu, bastante mal, e comprou um apartamento sem ter realmente a
noção exacta do que estava a fazer e de onde se estava a meter. Mas era na sua
terra, sua pátria grande, sua casa própria, não podia estar errado, comprou sem
calcular. Só depois é que se apercebeu que a centralidade era de meio-tostão com
falta de tudo e de mais alguma coisa, nomeadamente infra-estruturas importantes,
tais como, Hospital, Esquadra Policial, Bombeiros, etc. Mas, como sobredito, ter um
tecto é sempre uma boa coisa na vida e ele lá se foi acomodando, até que, a certa
altura, deu-se conta de algo de bizarro na entrada a sul do Kilamba, onde existe
uma lagoa com águas esverdeadas e cheiro nauseabundo frequentada por
grande quantidade de famílias de mosquitos, que, por se ter tornado, graças à sua
podridão, uma fonte de reprodução desses insectos, se foi transformando,
malembe, malembe, em um verdadeiro atentado à Saúde Pública, com tendência para se
ir agravando com o passar do tempo.
O cheiro dessa
lagoa, segundo o ex-expatriado, era tão forte que ultrapassava os limites do
suportável, sobretudo ali, naquela centralidade, orgulho de Angola, pedra mestra
da política governamental. Assim sendo, urgia tomar algumas iniciativas
para minimizar a situação. Em conversa com várias pessoas, notou que muita gente
não sabia de onde vinha toda essa imensa quantidade de água que naquele local, por
assim dizer, estacionava e formava esse lago pestilento, o qual, como que para
agravar a situação, já havia transbordado para a estrada, cerca de dois meses
atrás, aquando de uma dessas chuvadas que a cada ano que passa fiscalizam o
desempenho das autoridades, invariavelmente com nota zero, pois os problemas e
situações graves de ontem, nos quais se puderam contar vítimas mortais, perduram,
reaparecem e por vezes com mais forças do que antigamente, quer dizer, os
Executivos, central e local, estão-se borrifando para o bem-estar duma
centralidade que deveria ser um ponto fulcral da sua propaganda política, Incrível
mas verdade «Deixa estar a aguinha. Isso fica para depois, temos
negócios importantes a concluir», parece ser isso o que se está a passar. Sendo este
o cenário, considerando que era necessário “agarrar o touro pelos cornos”, foram
os próprios habitantes verificar de onde vinha essa água nauseabunda e, eis o que
assevera o nosso informador a propósito da sua “descoberta”: “Posso afirmar sem
medo de errar, que esta água tem sido bombeada a partir do Centro de tratamento das
águas das fossa sépticas sem terem sido tratadas a 100%, no mínimo de acordo com
as normas exigidas, e é isso que provoca o cheiro pestilento que se faz sentir
nesta zona», e acrescentou, «o ideal, seria tratar estas águas das fossas a 100% e,
depois de a tornarem potável, então sim, construir uma lagoa artificial, que até
poderia ter peixes, e fazer deste sítio uma zona de lazer».
Pois é, quando se
vem da Alemanha para Angola, a decalagem entre o que lá se faz e o que aqui não é
feito, inspira omwangolé a fazer sonhos assim, bonitos, mas impossíveis de
realizar por enquanto, enquanto muitos no poder considerados por muitos
como fazendo parte de uma selecta e restrita camarilha que governa Angola não for
posta no olho da rua.
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