Linkiesta,
Milão – Presseurop – imagem Christo
Komarnitski
Apesar da vitória
de Angela Merkel parecer garantida, as eleições alemãs têm muito a dizer-nos.
De facto, os resultados deverão dar resposta a muitas questões em aberto sobre
o futuro da economia e das instituições europeias.
Desde o início da
crise da zona euro, as eleições federais alemãs são o acontecimento mais
esperado de todos – excetuando, talvez, o Conselho
Europeu de junho de 2012. O dia 22 de setembro, data do escrutínio alemão,
poderá ser um ponto de viragem na crise do euro.
A Comissão Europeia
diz-se tranquila. Os bancos de investimento, por seu lado, acreditam na vitória
de Angela Merkel mas mantêm-se prudentes. Porque existem quatro incógnitas: a
união bancária; o crescimento na zona euro; o futuro da Grécia e o futuro da
moeda única. Todas estas questões passam por Berlim.
Angela Merkel é
dada como vencedora. Segundo as últimas sondagens, realizadas pelas empresas Emnid, Forschungsgruppe Wahlen e Infratest dimap, o partido da chanceler, a
União Democrata Cristã (CDU), obterá mais de 40% dos votos – enquanto o seu
adversário do Partido Social-Democrata (SPD), Peer Steinbrück, conseguirá cerca
de 25%. Tem, por isso, uma margem de segurança considerável.
Segundo o Deutsche
Bank, “a vitória de Merkel é um dado adquirido”. Morgan Stanley partilha este
ponto de vista. Até maio passado, o banco pensava que assistiríamos a uma
grande liquidação na zona euro após as eleições alemãs. Se mudou de opinião,
apesar da fragilidade dos alicerces na região, é porque a liquidez continua a
afluir aos mercados financeiros mundiais, graças à Reserva Federal, ao Banco do
Japão e ao Banco de Inglaterra.
A nova ordem
monetária – feita de expansão quantitativa, de taxas de juro baixas e de
medidas extraordinárias – poderá vir a ser benéfica para a Alemanha e,
consequentemente, para a zona euro. Além disso, os investidores não se
entregarão, necessariamente, a enormes vendas após 22 de setembro.
Reformas a passo de
caracol
Nos corredores das
instituições europeias reina a tranquilidade. Um funcionário da Comissão
declarou ao Linkiesta: “Toda esta euforia a propósito das eleições alemãs só
existe para os jornalistas. O caminho com que a UE se comprometeu para sair da
crise está traçado e claramente definido”. Por outras palavras, mesmo em caso
de vitória de Steinbrück, muito pouco mudaria porque “o objetivo continua a ser
o de uma Europa e de uma zona euro mais sólidas do que nunca”.
O mesmo funcionário
reconhece que houve, é certo, “diversos erros cometidos durante a conceção do
euro”, mas afirma que ao seguir o caminho com que se comprometeu em 2011, com a
criação do Fundo Europeu de Estabilidade Financeira
(FEEF), a UE conseguirá “melhorar o conjunto do sistema até ao fim da década”.
E será realmente assim?
A nova arquitetura
europeia ainda parece deixar muito a desejar. A atual paralisia dos mercados
financeiros deve-se às operações conduzidas pelo Banco Central Europeu (BCE)
durante o ano passado. E diz respeito, especialmente, à criação das operações
monetárias sem reservas (OMT), as operações de aquisição de títulos do
Tesouro no mercado obrigacionista secundário para apoiar os países sob pressão.
Mas dois hedge funds, o londrino Brevan Howard e o americano Bridgewater,
defendem que as eleições alemãs marcarão um ponto de viragem na crise. Uma má
viragem.
Para o Brevan
Howard, uma vitória de Merkel irá abrandar o processo de reforma da zona euro.
Um receio compreensível, se olharmos ao passo de caracol a que caminham as
reformas destes últimos dois anos. A culpa é do Bundesrat, o Conselho Federal
alemão, que tem de aprovar todas as despesas administrativas da Alemanha,
incluindo as contribuições para os fundos de resgate dos Estados, o Fundo
Europeu de Estabilidade Financeira e o Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE).
Sustentabilidade
grega é uma miragem
As questões por
resolver continuam a ser várias. A primeira é a da união bancária. Ou melhor,
de um sistema que colocará os bancos da UE sob a supervisão do BCE. O objetivo
é evitar os choques ligados às posições opacas, parcialmente protegidas pelas
autoridades financeiras nacionais. Tão indispensável como é lenta a sua
concretização, a união bancária tem ainda de ultrapassar duas dificuldades: as
reticências dos bancos alemães em serem colocados sob o controlo do BCE e as
diversas dúvidas de Berlim quanto aos fundos de garantia dos depósitos
bancários. E são precisamente esses dois aspetos que poderão, brevemente,
suscitar os principais diferendos entre a Alemanha e os outros membros da zona
euro.
A segunda grande
dificuldade é a do reequilíbrio entre o centro e a periferia da zona euro. Cabe
igualmente a Berlim encontrar um novo modelo de desenvolvimento para a zona
euro, em especial para combater aquilo que os economistas consideram como uma
verdadeira praga: o desemprego.
E depois, há também
a Grécia. A sustentabilidade da sua dívida soberana ainda é uma miragem, e há
cada vez mais vozes que se levantam para dizer que uma nova reestruturação
também o é. Desta vez, o “haircut”, ou dito de outra maneira, a desvalorização
do valor nominal das obrigações da carteira, atingiria os credores
institucionais. O corte abrangeria, assim, 70% das obrigações da Grécia –
correspondente à parte detida pelas instituições, do BCE ao Fundo Monetário
Internacional (FMI). […]
Por fim, a última
grande questão: como repensar a zona euro? Se, por um lado, a união bancária
pode constituir uma etapa importante para a futura estabilidade financeira, por
outro, a prioridade é rever a estrutura, e talvez a composição, da zona euro.
Isso implica igualmente uma revisão profunda das instituições europeias e uma
eventual transferência de soberania dos Estados-membros. O problema, nesse
caso, será convencer os contribuintes alemães.
Uma tarefa difícil
após o resgate da Grécia, da Irlanda, de Portugal, de Chipre e dos bancos
espanhóis. Dito isto, nestes últimos meses, Angela Merkel parece gozar de uma
aura bastante maior do que no passado. Será suficiente para fazer dormir
profundamente os investidores? Provavelmente não. A menos que Berlim decida
verdadeiramente tomar a liderança, num gesto claro e decidido, de uma zona euro
desorientada.
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