Diário de Notícias, editorial - hoje
Mal se soube da
morte de António Borges, as redes sociais, os blogues e as caixas de
comentários das edições online dos jornais foram inundadas de opiniões de
júbilo pela notícia. O economista, que atualmente desempenhava as funções de consultor
do Governo para as privatizações, era, como todos reconhecem, uma personalidade
controversa. Tinha opiniões muito vincadas e muito pouco populares, que não
hesitava em afirmar mesmo que isso lhe custasse um rol de críticas.
Essa característica
de António Borges era muitas vezes considerada pelos seus detratores como
arrogância e insensibilidade. Já os seus admiradores classificavam-na como
frontalidade e coragem de dizer aquilo que pensava. A verdade factual é esta:
António Borges defendeu até ao fim, com enorme convicção, aquilo em que
acreditava.
Em Portugal, mas
não só, a tradição é que, depois da morte, todos os protagonistas passam a ser
bons e insubstituíveis. Não é, manifestamente, o caso de António Borges. Mas
uma coisa é criticar as ideias, naturalmente discutíveis, do economista. Isso é
próprio da democracia e da liberdade de opinião de cada um. Coisa diferente é
celebrar a morte de alguém. A Internet foi, como já se disse, o veículo
escolhido para todo o tipo de insultos e festejos. Até podemos aceitar que esta
plataforma se torne uma espécie de mesa de café dos tempos modernos. A forma
livre e desabrida como se fala na Internet é normal, é natural, faz parte da
natureza humana. Coisa diferente é permitirmos que ela se transforme numa
espécie de lixeira ou sarjeta da opinião. Isso não é tolerável nem saudável
para a liberdade e para democracia.
É FÁCIL “FALAR”, AOS
ESCRIBAS BEM POSICIONADOS NA PIRÂMIDE – opinião PG
É absolutamente legítima
a opinião veiculada neste editorial do Diário de Notícias, assim como é legítimo
rebater e discordar do todo ou de parte. Vangloriarmo-nos da morte de alguém
poderá ser menos próprio mas é completamente compreensivel se o defunto
configurar a imagem de alguém que demonstrou desumanidade nas suas crenças, na
sua ideologia, no seu comportamento. Mais ainda se o defunto se tiver
posicionado do outro lado da barricada das lutas de classes e assumido
presunçosamente essa sua posição e práticas manifestando um certo asco pelos
explorados, pelos tão mal governados. Era assim Borges. Um adversário com
alguns poderes (demais) para contribuir para a derrocada das vidas de muitos
cidadãos de Portugal e até do mundo – se considerarmos a sua passagem pela
Goldman Sachs e pelo FMI. Assim sendo compreende-se que o sentimento das e dos
que se consideram vítimas seja o de bailar sobre o seu túmulo ou de festejar no
Facebook.
António Borges era
a tal sinistra figura que advogava sacrifícios e mais sacrifícios para os
portugueses – até para todos os trabalhadores de todo o mundo em nome da
economia e finanças – mas, gananciosamente (que é o mínimo que se pode considerar)
beneficiava do vencimento imoralmente avantajado, em Portugal, isento de
imposto. Que decência tinha António Borges como pessoa que advogada a
incessante espoliação dos portugueses nos impostos, na baixa de salários, etc.,
se guardava para si a atitude parasita comum aos salafrários que abundam pelos
governos, pelos partidos políticos do “arco da governação” e demais que ontem e
hoje se apressaram a elogiar quem afinal muito pouco ou nada fez de bem por
Portugal e pelos portugueses mas antes se posicionou no grupo dos que evocam a
democracia mas a adulteram na prática como exploradores de outrem sem
manifestar o humanismo que deveria caracterizar aquela tão “competente e tão
boa pessoa”. Competente talvez… mas com vista aos benefícios enormes dos da sua
laia. Gananciosos como ele, à semelhança do de Belém e outros clones.
Para quem está
a alguma distância da realidade quotidiana e das dificuldades dos portugueses
miserabilizados por estes António Borges e tem o privilégio de desfrutar de
lugar confortável na pirâmide social (a exemplo dos escribas no Egito) é
naturalíssimo que considere as manifestações no Facebook uma reprovável celebração sobre a
morte de Borges e não compreenda que os explorados e oprimidos são justamente mesmo assim,
por todo o mundo, em circunstâncias análogas, porque celebram – mais ou menos
efusivamente – o desaparecimento de mais um terrível adversário, de mais um dos vampiros
evocados pelo José Afonso. Borges só não foi mais longe nem foi mais acutilante em
causar desgraça em Portugal e pelo mundo porque não lhe foi possível. E depois veio o cancro pancreático que o
aniquilou para sempre. Mas Borges daqueles não faltam por aí. Para mal da maioria dos
portugueses e dos povos do mundo.
O editoralista do DN faz constar no final: "A forma livre e desabrida como se fala na Internet é normal, é natural, faz parte da natureza humana. Coisa diferente é permitirmos que ela se transforme numa espécie de lixeira ou sarjeta da opinião. Isso não é tolerável nem saudável para a liberdade e para democracia."
Que democracia? A que está suspensa e nem sabemos se volta a vigorar?
Redação PG - RP
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