David Dinis – Sol, opinião
O novo secretário
de Estado do Tesouro estava já metido num problema. Hoje, depois do ‘briefing’
a que quis comparecer, o caso ficou bastante mais sério. Para ele e para a
ministra das Finanças – que até tinha ganho algum tempo com a sua ida à
Comissão de Inquérito esta semana.
Vejamos este caso.
1. No início deste
processo, o próprio Governo estabeleceu um critério político para a sua própria
conduta neste caso. Dois secretários de Estado foram demitidos, precisamente
por estarem envolvidos, à altura dos factos, na contratação deste tipo de produtos
por empresas do Estado.
2. Esse critério já
não era simples. Se Juvenal Silva Peneda e Braga Lino saíram, Maria Luís
Albuquerque e Marco António Costa ficaram. A primeira por (enquanto responsável
financeira da Refer) não ter ‘comprado’ swap tóxicos (só ‘complexos’, argumenta
o IGCP); o segundo por não ter poder executivo na Administração do Metro do
Porto.
3. Mesmo assim,
insisto, havia um critério. E ele aprofundou-se com a demissão de alguns
gestores públicos – por terem comprado esses mesmos swaps. E até com uma
investigação a quem devia ter descoberto o problema e nada fez.
4. Agora sabe-se
que Pais Jorge, há duas semanas contratado por Maria Luís Albuquerque, esteve
no Citigroup. E que alegadamente teve uma reunião no gabinete de José Sócrates,
onde se pretendia vender estes produtos ao Estado. Atente-se: a argumentação
era que, financiando-se com swaps, as empresas conseguiam esconder essa dívida
das estatísticas oficiais.
5. Pais Jorge
justificou hoje que só estava na “área de clientes” do Citigroup. E que não
tinha responsabilidades na “concepção, elaboração e negociação” dos produtos,
derivados ou não. Pois, não chega.
6. Não chega porque
não percebemos o que era isso da “relação com clientes” (fazia o quê,
precisamente?). E não chega também quando Pais Jorge confirma ter tido
“centenas de reuniões” para apresentar tais produtos – mesmo que alegue,
depois, não se recordar se esteve naquela em São Bento, em 2005.
7. Ora, não é
possível acreditar que Pais Jorge tenha estado a apresentar produtos tóxicos
sem perceber o que estava a ‘vender’ – senão, não era hoje Secretário de Estado
do Tesouro, como diz a Graça Franco, no site da Renascença. Mas se percebia o
problema ético daquele produto que tinha que defender, não se entende como pode
agora estar num Governo que contesta, em tribunal, um banco por ter enganado o
Estado vendendo-lhe tais produtos. Sobretudo com o critério político que este
Governo criou com as demissões anteriores.
8. Dito isto, é
claro que não me ofende nada que um secretário de Estado tenha no seu currículo
uma passagem pelo Citigroup. E até admito que me possam convencer que, tendo lá
estado, não tinha responsabilidade nenhuma na venda destes produtos ao Estado.
Agora, isto que ouvi hoje não me convence nada.
9. E se Pais Jorge
(e Maria Luís Albuquerque) acha que basta dizer isto quando for chamado à
Comissão de Inquérito é porque não está mesmo a ver bem o filme em que está
metido. Nada mesmo.
P.S. O argumentário
do Citigroup, em 2005, foi precisamente o que levou a Grécia ao problema que
enfrentou hoje (porque a Grécia comprou aqueles produtos em massa,
escondendo-os do Eurostat). A troika deve gostar disto, quando estiver a falar
com Pais Jorge.
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