Rodolpho Motta Lima*
– Direto da Redação
Há algumas semanas,
quando certos setores tradicionalmente avessos às ruas e ao povo aplaudiam as
manifestações pelo país afora, escrevi, em coluna intitulada “Quem não sabe
brincar não brinca”, minha opinião de que – além dos segmentos que desfilavam
nos passeios pela avenida – faltavam ainda outros atores e outras palavras de
ordem, a serem acrescidas àquelas que então eram destacadas. Era óbvio que
ainda viria a turma que tem o DNA das ruas, os sindicatos e outros segmentos de
ativistas. E também era fácil perceber que, ao contrário do que pretendia a
esperança golpista, a coisa não ficaria circunscrita ao Governo Federal que,
com a indisfarçável euforia dos urubus de sempre, despencava nas pesquisas.
Foi o que se viu. O
desejado “show” midiático de cartas marcadas acabou se tornando um tiro no pé
para alguns. E começaram a surgir, no dia a dia do noticiário, palavras como
vândalos, baderneiros, marginais e outras do gênero.
É certo que
presenciamos – e ainda estamos presenciando - atos de depredação que não
condizem com os desejáveis valores democráticos. Mas um grande amigo me lembrou
que, nesse anarquismo contemporâneo, está presente um sentimento que lembra a
pergunta irônica de Brecht: “O que é roubar um Banco comparado a fundar um?”,
substituindo-se o verbo “roubar” por “depredar”... Separando o joio do trigo, a
verdade é que as manifestações – não mais com aquele ar de festa que teve até
“passeatas” de crianças na zona sul do Rio – tornaram-se menos genéricas e
passaram a ter reivindicações mais definidas. Aqui no Rio, por exemplo, são
centros das atenções o Governador Sérgio Cabral e a PM, e já ganhou força de
bordão a pergunta “Cadê o Amarildo?”.
Assistimos, também
– embora sem a divulgação pelos meios tradicionais – a uma série de protestos
contra a mídia, questionando o seu caráter manipulador e, muitas vezes,
antipatriótico. Em particular, volta e meia, grupos de manifestantes têm tido
como alvo as Organizações Globo, com algumas de suas sedes pichadas, para não
dizer o pior.
É que, com coberturas
parciais e juízos de valor pra lá de contraditórios, os globais abriram a
guarda para a volta de um antigo brado que povoava as ruas num outro tempo, mas
que não perdeu atualidade: “O povo não é bobo, abaixo a rede Globo ! ”. As
razões históricas da frase? Vou me poupar, e também a vocês, de ser repetitivo:
elas estão claramente enunciadas nos consistentes artigos do Eliakim Araújo e
do Raul Longo (Espaço Livre), aqui no DR.
O fato é que já se
percebem as primeiras consequências dessas manifestações. Assim como alguns
governantes se mexeram e da mesma forma que os poderes Judiciário e Legislativo
estão dando respostas – algumas vezes a contragosto – às exigências populares,
o grupo Globo, contra a parede, acusa o golpe. Na onda das denúncias de falcatruas
variadas, por onde circulam notícias de fraudes contra o fisco por parte dos
paladinos do PIG, com sumiço de processos e outros bichos, há , nas ruas,
grupos que querem esclarecimentos a respeito, dos devedores e dos credores...
Esse momento em que
se passa a limpo a cidadania é, pois, saudavelmente delicado também para a
mídia hegemônica, que começa a ser fortemente questionada e que, parece, tem
vastos telhados de vidro... Isso talvez justifique certos posicionamentos
recentes que vêm na mais absoluta contramão do que tem sido o caminho dessa
imprensa. De repente, não mais que de repente, as organizações Globo resolvem
fazer uma autocrítica fajuta e pouco respeitável a respeito dos desserviços que
prestaram ao Brasil nos anos da ditadura, nos quais as suas empresas
“progrediram”, contando com o esmagamento da concorrência. Não mais que
repente, quase 50 anos depois do golpe, eles vêm a público reconhecer o “erro”
de ter apoiado o regime ditatorial militar. Quem dera que tivesse sido apenas
“um erro”, corrigível com meia dúzia de lágrimas de crocodilo. Quem dera que o
“assunto” do tal erro não tivesse sido responsável por calar um país por duas
décadas, por torturar e assassinar pessoas em nome de ideias fascistas... Quem
dera que esse “erro” não tivesse servido ao monopólio da informação entre nós,
com o consequente enriquecimento desproporcional dos monopolistas...
Precisamos estar
atentos aos lobos imperialistas com pele de cordeiro nacionalista, aqui
representados, e desde sempre, por essa turma. Estar atentos a esse jogo de
cena que “denuncia”, com caras e bocas de indignação, a espionagem dos
estadunidenses contra Dilma. Mudaram-se os tempos ou mudei eu? Nem uma coisa
nem outra. Posso apostar que atrás desse cachimbo tem a mesma boca torta de sempre,
uma boca que está com medo da Lei dos Meios, receosa de medidas judiciais que
ponham abaixo alicerces de barro. E que, de uma hora para outra, pode perder as
bocadas da propaganda oficial que, aliás, já devia ter perdido desde que a
democracia se reinstaurou entre nós. O fato é que, com as manifestações e seus
subprodutos, tem muita gente caminhando no fio da navalha...
As ruas fazem bem à
cidadania. Elas levaram Dilma a perceber que era preciso mais e a formular
propostas que estão movimentando o mundo político: mais médicos para o povo,
mais verbas do pré-sal para a educação, necessidade imediata de uma reforma
política. E as pesquisas estão refletindo que o povo entende seus esforços.
Quanto ao legislativo, mesmo com o rabo entre as pernas, os complacentes de
sempre estão agindo. Decidiu-se, ao menos em um primeiro momento, pelo fim do
voto secreto na Câmara.
É só esperar um
pouco - mas não sentado - para ver quais serão os próximos atos.
Fundamentalmente, é preciso estar atento ao que irá ocorrer no país até as
eleições de 2014. É preciso confiar desconfiando dos falsos democratas. Como
diria o Barão de Itararé, há alguma coisa no ar, além dos aviões de carreira...
*Advogado formado
pela UFRJ-RJ (antiga Universidade de Brasil) e professor de Língua Portuguesa
do Rio de Janeiro, formado pela UERJ , com atividade em diversas instituições
do Rio de Janeiro. Com militância política nos anos da ditadura,
particularmente no movimento estudantil. Funcionário aposentado do Banco do
Brasil.
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