Ricardo Araújo
Pereira – Visão, opinião
Não há nenhum
português que não tenha dinheiro depositado no BPN
Uma vez que não
chegavam à Grécia Antiga notícias do Portugal Moderno, Aristóteles entreteve-se
a formular, sem qualquer remorso intelectual, o princípio da identidade. Uma
coisa é o que é, disse ele com leviandade e desfaçatez. 2400 anos depois
sabemos que, em Portugal, uma coisa raramente é o que é. O ajustamento
desajusta, o irrevogável revoga-se, a requalificação não requalifica, o resgate
não resgata e no dia do regresso aos mercados não se regressa aos mercados.
Deve ser bem pouco estimulante viver num mundo em que as coisas são meramente o
que são. Mas nós, que vivemos num mundo em que as coisas são outras coisas, não
temos sabido aproveitar essa sorte. Quando a própria realidade é troca-tintas,
a vida torna-se uma questão de perspectiva. E cada um pode escolher a que lhe
serve melhor. Por exemplo, o BPN não é o pior banco português, é o melhor. Em
toda a história da banca portuguesa, foi a única instituição a merecer a
confiança de todos - mesmo todos - os portugueses. Não há nenhum português que não
tenha dinheiro depositado no BPN. Sem grandes campanhas publicitárias nem
ofertas mirabolantes, conseguiram que todos os portugueses pusessem lá
dinheiro. Em vez de condená-los, vamos aprender com eles.
O mesmo se passa com o
chamado segundo resgate. Há dois anos, o País não conseguia baixar o défice nem
controlar a dívida. Veio o primeiro resgate, fizemos sacrifícios históricos, e
hoje não conseguimos baixar o défice nem controlar a dívida. Portanto, é necessário
um segundo resgate que nos salve do primeiro e nos ajude a criar condições para
que, dentro de dois anos, possamos pedir o terceiro.
Ora, o que eu proponho é que, falhado o programa de ajustamento, Portugal não peça agora um segundo resgate, mas sim o terceiro. São só vantagens: ninguém estranha, porque toda a gente sabe que não somos muito bons com números; evitamos a aborrecida discussão sobre os malefícios do segundo resgate, uma vez que afinal é o terceiro; transformamos os resgates num hábito. Deixam de ser uma grave situação anormal e passam a ser um procedimento financeiro de rotina. É tempo de investir naquilo em que somos bons, e nós somos bons a falhar metas e a pedir resgates. Acumular resgates não é sintoma de falhanço económico, é gosto pelo coleccionismo. E as colecções são valiosas. Quem sabe se, no futuro, um daqueles milionários chineses não deseja comprar-nos a colecção de resgates por um balúrdio? Seria a salvação do País. Depois, bastava investir essa fortuna num banco e em várias PPP, e a seguir começar tudo de novo. E ainda dizem que não há alternativas.
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