Marcolino Moco - À mesa do Café, 22 novembro 2013
Por razões
profissionais, não me encontro no país, pelo que posso eventualmente “meter
alguma água” na interpretação das coisas. Mas ter medo de contribuir, mesmo com
a possibilidade de poder cometer algum erro, não é meu apanágio. A propósito,
estando aqui na Europa, numa cerimónia de entrega de diplomas a recém “masters”
em Luxemburgo, em que um dos meus filhos era contemplado, ouvi repetido esse
meu lema da boca da Conselheira para os Assuntos Científicos do Presidente da
Comissão Europeia: “amigos, oiçam-me: não tenham medo de errar quando é preciso
criar e inovar, que o erro é a mãe do progresso”. Com 60 anos de idade, que é
mais que a idade que tinha o velho sábio Mendes de Carvalho, quando disse que
era cinza e cinza já não teme que seja queimada, medo de errar para quê, quando
a minha vida nos últimos anos tem sido lutar com a arma da palavra,
contribuindo para verdadeira reconciliação dos angolanos?!
Muito
oportunamente, a UNITA, sentindo a sua responsabilidade como maior partido da
oposição, papel difícil, tendo em conta o seu passado recente bastante
criticável, sob a orientação de Jonas Savimbi, que tal como Holden ou Neto,
grandes líderes do nosso nacionalismo, mas que hoje, até porque não já fazendo
parte do mundo dos vivos, e em nome do nosso e do futuro e sobretudo dos mais
jovens, deviam ser compreendidos como produtos do seu tempo, convocou uma
manifestação contra actos que no nossso país de hoje, já não deviam ser
permitdos e não devem ser permitiodos:
1-Por quanto tempo
mais permitiremos que se toturem pessoas, mesmo antes das manifestações e os
torturadores vêm gabar-se disso à comunicação controlada pelo Estado e fica
assim mesmo?
2-Em nome de que
causa deveremos permitir que desapareçam pessoas, ninguém diz nada, convocam-se
jovens, alguns seleccionados, outros deles aparente e previamente “pagos” para
conversas fingidas, tudo na vista de todos?
3-Mesmo depois da
primavera Árabe, que ainda corre, nos dizem descaradamente que alguns eleitos
têm direito à acumularem “bilhões” ao lado da miséria da maioria?
4-Onde suspeitos de
crimes tão hediondos, como o tráfico de pessoas, se tornam personalidades
“respeitáveis” da sociedade e figuras proeminentes da política activa?
5-Entre tantas e
tantas coisas inacreditáveis ….
Com efeito, temos
que pensar que estamos no século XXI e mudaram os paradigmas. É preciso que
nós, mesmo nós que trazemos os “genes” dos séculos anteriores mudemos também,
para não contaminarmos a juventude.
Acabo de ler um
artigo inspirador do “mais jovem” Rafael Marques. Uma sábia reflexão sua
alimentaou-me a esperança de que apesar de tudo, Angola tem gente para impedir
que o testemunho dos equívocos seja o único legado que deixamos para o futuro.
Antes de tomar
contacto com o texto de Rafael Marques, eu lera uma crítica, também muito
oportuna, do “mais velho” nacionalista, Dr. Edmundo Rocha, ao quase meu
coetâneo (um “coxito” mais novo) João Melo, que ligava Rafael Marques a um
certo “imperialismo” que não passa de fantasma. Depois vejo Rafael Marques, com
a autoridade que lhe confere o recém-prémio pela organização Transparência
Internacional, a colocar no seu artigo duas questões oportunas, relativas às
últimas posições da UNITA: 1º ela está recuparar das naturais dificulculdades
em que se encontrava, a seguir à morte em combate do Dr. Jonas Savimbi, seu
líder histórico, renovando as esperanças dos angolanos, em contar com uma
estrutura oposicional que é indispensável, na construção do necessário
contraditório nacional, fonte do progresso, como forma do controlo dos
dignitários do Etado e da promoção da transparência no uso dos bens públicos;
2º relevou o facto de que na convocatória do dia 15, a UNITA resvalou, tal como
é apanágio do MPLA, na invocação de problemas do passado em que todos nós que
assumimos responsabilidades nas três grandes organizações nacionalistas, temos
culpas no cartório, mas, como eu costumo dizer, empurrados pelas forças
incontroláveis da História, sobretudo da internacional Guerra Fria. Para esta
última situação tenho insistido: “reconheçamos os erros do passado de forma
franca e serena, compensemos moral e se possivel materiamente as vítimas mais
flagrantes dessas situações e, façamos tudo, menos amarrar o presente e o
futuro ao mau passado. Bom nisso o MPLA de hoje, que entregou todo o poder do
próprio partido e do Estado ao seu líder, e lamentável que intelecuais como o
meu benquisto confrade João Melo se constitua em um dos seus principais
ideológos, é incompreensivelmente mais mestre que a actual UNITA de Isaias
Samakuva. Até porque, não sei se a atitude é anterior ou posterior às opiniões
de Rafael Marques, um comunicado do Secretariado Geral da UNITA mais recente,
parece emendar algum palavreado inoportuno na convocatória do dia 15 e torna a
iniciativa desse partido completamente oportuna e adequada, especialmente
quando solicita o apoio das autoridades e da Ordem.
Sei muito bem como
é difícil, mesmo para líderes pacifistas como o Dr. Samacuva, actuar de maneira
diferente, em relação às iniciativas de um partido político, que precisa de
protagonizar para si, por exigência, muitas vezes, dos mais afoitos. Mas se não
houvesse esta dificuldade acrescentaria às observações do Rafael que a situação
do país exige que a UNITA coordene previamente com todos os partidos, que
aparentemente não se dediquem à política como puro negócio, as principais
acções para tranformar, se possivel negociar pacificamente, a mudança deste
regime que já não consegue fingir que não é ditatorial (estude-se se é por
desepero ou arrogância). E que esses outros partidos aceitassem essa liderança
informal, do maior partido da oposição, porque, isolados, não vão desempenhar o
papel que o momento exige.
Ao MPLA, e seu
Presidente, parece que decididamente já não há lugar para dirigir apelos no
sentido de alguma contenção. Se a auto-suficiência é característica dos
políticos, não há hoje melhor exemplo que o Presidente dos Santos e o seu MPLA.
Não são eles que mandaram os jovens da sua JOTA inventar uma data inesxistente,
para uma manifestação inacreditável? Não é o Presidente Santos que acaba de
exonerar um dirigente ou responsável que segundo o “legislador” Tribunal
Constitucional, não tem responsabilidade nehuma? Excelência, Senhor Presidente,
Excelências Senhores dirigentes do MPLA; de onde tiram tanta legitimidade para
banalizar desta maneira as instituições de um Estado? Que responsabilidades têm
os senhores, ao rirem-se desta maneira das instituições democráticas de uma
Angola que é de todos? Para onde estão empurrar o nosso país? Será que ainda há
espaço para mais surpresas? Inacreditável a todos os títulos!
*Marcolino Moco (na foto) foi
primeiro-ministro de Angola de dezembro de 1992 a junho de 1996. Moco foi
demitido pelo Presidente José Eduardo dos Santos, apesar de pertencer ao MPLA.
O seu "carisma de tendências demasiado democráticas desagradou ao PR e ao
partido que ocupa os poderes e Angola".
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