domingo, 24 de novembro de 2013

ANGOLA NUM MOMENTO CRUCIAL

 


Marcolino Moco - À mesa do Café, 22 novembro 2013
 
Por razões profissionais, não me encontro no país, pelo que posso eventualmente “meter alguma água” na interpretação das coisas. Mas ter medo de contribuir, mesmo com a possibilidade de poder cometer algum erro, não é meu apanágio. A propósito, estando aqui na Europa, numa cerimónia de entrega de diplomas a recém “masters” em Luxemburgo, em que um dos meus filhos era contemplado, ouvi repetido esse meu lema da boca da Conselheira para os Assuntos Científicos do Presidente da Comissão Europeia: “amigos, oiçam-me: não tenham medo de errar quando é preciso criar e inovar, que o erro é a mãe do progresso”. Com 60 anos de idade, que é mais que a idade que tinha o velho sábio Mendes de Carvalho, quando disse que era cinza e cinza já não teme que seja queimada, medo de errar para quê, quando a minha vida nos últimos anos tem sido lutar com a arma da palavra, contribuindo para verdadeira reconciliação dos angolanos?!
 
Muito oportunamente, a UNITA, sentindo a sua responsabilidade como maior partido da oposição, papel difícil, tendo em conta o seu passado recente bastante criticável, sob a orientação de Jonas Savimbi, que tal como Holden ou Neto, grandes líderes do nosso nacionalismo, mas que hoje, até porque não já fazendo parte do mundo dos vivos, e em nome do nosso e do futuro e sobretudo dos mais jovens, deviam ser compreendidos como produtos do seu tempo, convocou uma manifestação contra actos que no nossso país de hoje, já não deviam ser permitdos e não devem ser permitiodos:
 
1-Por quanto tempo mais permitiremos que se toturem pessoas, mesmo antes das manifestações e os torturadores vêm gabar-se disso à comunicação controlada pelo Estado e fica assim mesmo?
 
2-Em nome de que causa deveremos permitir que desapareçam pessoas, ninguém diz nada, convocam-se jovens, alguns seleccionados, outros deles aparente e previamente “pagos” para conversas fingidas, tudo na vista de todos?
 
3-Mesmo depois da primavera Árabe, que ainda corre, nos dizem descaradamente que alguns eleitos têm direito à acumularem “bilhões” ao lado da miséria da maioria?
 
4-Onde suspeitos de crimes tão hediondos, como o tráfico de pessoas, se tornam personalidades “respeitáveis” da sociedade e figuras proeminentes da política activa?
 
5-Entre tantas e tantas coisas inacreditáveis ….
 
Com efeito, temos que pensar que estamos no século XXI e mudaram os paradigmas. É preciso que nós, mesmo nós que trazemos os “genes” dos séculos anteriores mudemos também, para não contaminarmos a juventude.
 
Acabo de ler um artigo inspirador do “mais jovem” Rafael Marques. Uma sábia reflexão sua alimentaou-me a esperança de que apesar de tudo, Angola tem gente para impedir que o testemunho dos equívocos seja o único legado que deixamos para o futuro.
 
Antes de tomar contacto com o texto de Rafael Marques, eu lera uma crítica, também muito oportuna, do “mais velho” nacionalista, Dr. Edmundo Rocha, ao quase meu coetâneo (um “coxito” mais novo) João Melo, que ligava Rafael Marques a um certo “imperialismo” que não passa de fantasma. Depois vejo Rafael Marques, com a autoridade que lhe confere o recém-prémio pela organização Transparência Internacional, a colocar no seu artigo duas questões oportunas, relativas às últimas posições da UNITA: 1º ela está recuparar das naturais dificulculdades em que se encontrava, a seguir à morte em combate do Dr. Jonas Savimbi, seu líder histórico, renovando as esperanças dos angolanos, em contar com uma estrutura oposicional que é indispensável, na construção do necessário contraditório nacional, fonte do progresso, como forma do controlo dos dignitários do Etado e da promoção da transparência no uso dos bens públicos; 2º relevou o facto de que na convocatória do dia 15, a UNITA resvalou, tal como é apanágio do MPLA, na invocação de problemas do passado em que todos nós que assumimos responsabilidades nas três grandes organizações nacionalistas, temos culpas no cartório, mas, como eu costumo dizer, empurrados pelas forças incontroláveis da História, sobretudo da internacional Guerra Fria. Para esta última situação tenho insistido: “reconheçamos os erros do passado de forma franca e serena, compensemos moral e se possivel materiamente as vítimas mais flagrantes dessas situações e, façamos tudo, menos amarrar o presente e o futuro ao mau passado. Bom nisso o MPLA de hoje, que entregou todo o poder do próprio partido e do Estado ao seu líder, e lamentável que intelecuais como o meu benquisto confrade João Melo se constitua em um dos seus principais ideológos, é incompreensivelmente mais mestre que a actual UNITA de Isaias Samakuva. Até porque, não sei se a atitude é anterior ou posterior às opiniões de Rafael Marques, um comunicado do Secretariado Geral da UNITA mais recente, parece emendar algum palavreado inoportuno na convocatória do dia 15 e torna a iniciativa desse partido completamente oportuna e adequada, especialmente quando solicita o apoio das autoridades e da Ordem.
 
Sei muito bem como é difícil, mesmo para líderes pacifistas como o Dr. Samacuva, actuar de maneira diferente, em relação às iniciativas de um partido político, que precisa de protagonizar para si, por exigência, muitas vezes, dos mais afoitos. Mas se não houvesse esta dificuldade acrescentaria às observações do Rafael que a situação do país exige que a UNITA coordene previamente com todos os partidos, que aparentemente não se dediquem à política como puro negócio, as principais acções para tranformar, se possivel negociar pacificamente, a mudança deste regime que já não consegue fingir que não é ditatorial (estude-se se é por desepero ou arrogância). E que esses outros partidos aceitassem essa liderança informal, do maior partido da oposição, porque, isolados, não vão desempenhar o papel que o momento exige.
 
Ao MPLA, e seu Presidente, parece que decididamente já não há lugar para dirigir apelos no sentido de alguma contenção. Se a auto-suficiência é característica dos políticos, não há hoje melhor exemplo que o Presidente dos Santos e o seu MPLA. Não são eles que mandaram os jovens da sua JOTA inventar uma data inesxistente, para uma manifestação inacreditável? Não é o Presidente Santos que acaba de exonerar um dirigente ou responsável que segundo o “legislador” Tribunal Constitucional, não tem responsabilidade nehuma? Excelência, Senhor Presidente, Excelências Senhores dirigentes do MPLA; de onde tiram tanta legitimidade para banalizar desta maneira as instituições de um Estado? Que responsabilidades têm os senhores, ao rirem-se desta maneira das instituições democráticas de uma Angola que é de todos? Para onde estão empurrar o nosso país? Será que ainda há espaço para mais surpresas? Inacreditável a todos os títulos!
 
*Marcolino Moco (na foto) foi primeiro-ministro de Angola de dezembro de 1992 a junho de 1996. Moco foi demitido pelo Presidente José Eduardo dos Santos, apesar de pertencer ao MPLA. O seu "carisma de tendências demasiado democráticas desagradou ao PR e ao partido que ocupa os poderes e Angola".
 

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