Jornal de Angola
O Presidente da
República concedeu mais uma grande entrevista a um canal de televisão. Desta
vez, foi à cadeia brasileira TV Bandeirantes. Na entrevista, José Eduardo dos
Santos fala do caminho percorrido por Angola até chegar ao actual momento de
estabilidade política e económica.
Falando dos
desafios da economia nacional e abordando aspectos sensíveis nem sempre bem
compreendidos, o Chefe de Estado salienta que nas sociedades modernas os
empreendedores e empresários devem também ter poder económico e financeiro e
ajudar o Estado a criar emprego.
O Presidente lamenta que nem sempre haja este entendimento, ainda, no espírito de muitas pessoas, em Angola. “Não é só acumular riquezas e acumular dinheiro e mandar lá para fora, mas é acumular o dinheiro, sim, para investir, criar emprego para criar cada vez mais riqueza e melhorar a vida de todos”, diz o Presidente José Eduardo dos Santos ao entrevistador, numa alusão ao papel que os empresários angolanos têm de cumprir no esforço de desenvolvimento e progresso nacional.
O Presidente da República diz que, nesse quadro, o Governo “tem que ser sempre o elemento moderador, árbitro e ser capaz de fazer a gestão dos desequilíbrios, para que eles não sejam tão evidentes que nos levem a crises sociais”.
Substituição
Durante a entrevista, o Presidente da República refere, também, que “internamente” a direcção do MPLA já está a discutir a sua substituição no Estado e no partido, questão que “pode levar o seu tempo”, mas “tendo sempre em conta que é preciso manter a estabilidade”.
“Realmente, estamos a discutir este assunto, internamente, no MPLA, de como será a transição”, referiu o Presidente no excerto da entrevista concedida, recentemente, a cadeia de televisão brasileira TV Bandeirantes, em que se pede para falar deste assunto.
O Chefe de Estado explica que se está a “ensaiar vários modelos” da forma como a transição deve ser feita. “Se é feita, primeiro, a nível do Estado, se é feita, primeiro, a nível do Partido, se se faz de uma vez, enfim, estamos a estudar”. Esta questão “pode levar o seu tempo”, mas “tendo sempre em conta que é preciso manter a estabilidade” do país, asseverou o Chefe de Estado.
Instado a comentar sobre o tempo em que está no poder no país, desde 1979, José Eduardo dos Santos disse: “Eu acho que é muito tempo, até demasiado, mas também temos que ver as razões de natureza conjuntural que nos levaram a essa situação”.
O país esteve em guerra durante muito tempo, explicou o Presidente da República, para depois anuir que por esta razão “não pôde consolidar as instituições do Estado e nem sequer pôde tornar regular o funcionamento do processo de democratização”.
“Por isso, muitas vezes as eleições tiveram que ser adiadas”, sublinhou o Titular do Poder Executivo, para depois dizer: “se tivéssemos retomado o processo regular de realização de eleições, em 1992, depois das primeiras eleições, certamente eu já não estaria aqui”.
“Mas a conjuntura”, prosseguiu, “não permitiu que se realizassem eleições, fui ficando até que realizámos estas eleições”, realçou o Presidente, admitindo que “daqui para frente as coisas vão mudar”.
Cooperação externa
Relativamente à cooperação com a China, o Presidente da República sublinhou que as relações com este país asiático “são boas”, baseando-se, fundamentalmente, numa política de financiamento das exportações e venda de serviços e na realização de empreitadas em Angola.
Ainda sobre a China, o Chefe de Estado sublinhou que “não há ainda um investimento directo forte”, começando apenas agora a existir algum investimento directo chinês. Portanto, concluiu, “não é bem a ideia, que passa pelo mundo, de que a China vem e investe, não! Angola poupa serviços e paga, claro, com créditos, que são comerciais e com condições que (lhe) são favoráveis, boas”.
Uma das virtudes que existem com o relacionamento chinês, vincou José Eduardo dos Santos, prende-se com o facto de este país “não estabelecer muitas condições políticas para se ter acesso à relação económica”. Existe uma relação de separação entre o comércio, a relação económica e as políticas, o que “nem sempre é assim no Ocidente”, que muitas vezes “condiciona os fluxos financeiros a determinadas obrigações, no plano político, da parte dos Estados africanos”.
Sobre a cooperação com o Brasil, o Presidente da República disse ao entrevistador da TV Bandeirantes que as relações são igualmente boas e vão ter melhorias, a julgar pela vontade política existente entre os dois países. “Os laços são muito fortes, do ponto de vista da consanguinidade, cultural e histórico”, sublinhou o Chefe de Estado.
Guerra devastadora
Na entrevista, José Eduardo dos Santos lembrou que a guerra da UNITA foi destruidora. Como exemplo, apontou a linha de caminho-de-ferro, que foi destruída fragmento a fragmento. “Era uma guerra arrasadora”, disse o Presidente, para acrescentar: “minavam quase tudo, minavam a linha de transporte de energia eléctrica, ao lado dos postos, minavam as pontes, à volta das pontes, minavam ao longo de todos os caminhos-de-ferro, campos agrícolas. O processo de desminagem foi um processo penoso e também bastante oneroso, mas não podíamos construir sem desminar, portanto o processo de reconstrução teve previamente um programa de desminagem, e que continua até hoje”, afirmou.
Em dez anos de paz, os progressos são evidentes, sublinhou o Presidente José Eduardo dos Santos. “Recuperamos as três linhas de caminho-de-ferro, particularmente a de Benguela, que tem mais de 100 quilómetros reabilitados, a via na zona sul, que é a de Moçâmedes, a do Centro-Norte, que é a de Luanda-Malange. Foi necessário reconstruir as pontes para ligar as províncias, reabilitar a rede fundamental de estradas para tornar o país numa única zona económica”, afirmou.
O entrevistador quis também saber quem eram as figuras que José Eduardo dos Santos mais admirava enquanto jovem e que lhe serviram de exemplo nos anos 50 e 60. O Presidente foi peremptório: “Agostinho Neto, Mário Pinto de Andrade e Viriato Da Cruz”. Depois esclareceu: “Era Agostinho Neto e a sua poesia, já se falava muito. Aliás, foi mais ou menos nessa época, dos anos 59 a 60, que ele regressa a Angola e se torna uma figura carismática, enfim, bastante comentada nos círculos dos jovens, estudantes. E depois, no que diz respeito à luta de libertação nacional, na ausência dele, foi Mário Pinto de Andrade, meados de 62. Aí tive contacto com outro grande dirigente do movimento de libertação nacional nessa altura, que era o Viriato da Cruz. Foram as três personalidades: Agostinho Neto, Mário Pinto de Andrade e Viriato Da Cruz, e que acabaram por liderar o movimento de libertação nacional, sendo Agostinho Neto o principal timoneiro”.
O Presidente da República falou também do futuro do investimento de empresas brasileiras em Angola e angolanas no Brasil. “Não há ainda muitos angolanos a investirem no Brasil, como se está a fazer em Portugal. Mas isso é uma questão de tempo”, garantiu.
Foto: Rogério Tuty
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VÍDEO DA ENTREVISTA EM PR
angolano admite estar há "demasiado tempo" no poder – com vídeo da
entrevista
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