Pedro Tadeu – Diário
de Notícias, opinião
Um punho fechado
tem significado. Simboliza a mão que se fecha sobre a ferramenta que aperta,
bate, empurra, constrói. Simboliza o poder dos imperadores romanos que, de
polegar para cima ou para baixo, decidiam vidas de gladiadores escravizados.
Simboliza a vitória de um desportista, a luta de classes de um operário, o voo
do Super-Homem ou (não se esqueça, caro leitor) a imagem oficial do Partido
Socialista português.
A semiótica do
punho fechado é ideologicamente contraditória mas tem uma componente sempre
presente, unificadora: a força.
Os comunistas
erguem o punho fechado do braço direito. Um comunista alemão, que veio a morrer
em 1944 num campo de concentraçao nazi, Ernst Thälmann, explicou, de forma
simples, o porquê: "Um dedo pode ser partido mas cinco dedos formam um
punho fechado." O punho fechado dá força aos que são fracos.
Quando Nelson
Mandela foi preso, em 1962, era membro do Comité Central do Partido Comunista
Sul Africano. Quando, 28 anos depois, foi finalmente libertado, caminhou
lentamente, ao lado de Winnie, metros e metros, a exibir para as câmaras
televisivas e para as máquinas fotográficas vindas de todo o mundo o seu braço
direito erguido, de punho fechado.
Se escrevermos no
Google, em inglês, "punho" e "Mandela", encontramos
milhares de fotografias onde, ao longo do tempo, com cada vez mais cabelos
brancos, se documenta, incessantemente, a mesma saudação do punho fechado.
Ele era líder do
ANC e erguia o punho fechado. Ele foi eleito presidente da África do Sul e
erguia o punho fechado. Ele recebeu o Prémio Nobel da Paz e não passou a
esquecer-se de erguer o punho fechado. Ele passou a ser a personalidade mais
respeitada e admirada do mundo atual e continuava, vezes e vezes sem conta, a
erguer o punho fechado.
Mandela homenageou
toda a vida o percurso que o levou a conquistar um princípio de justiça na
África do Sul: o caminho de um homem comum que teve de usar a força, que teve
de fechar os seus cinco fracos dedos para formar um punho capaz de magoar.
Todos adoramos o
Nelson Mandela cavalheiro e tolerante, o homem decisivo que impediu que a
revolução na África do Sul se transformasse num banho de sangue. Mas, ao
contrário do que às vezes me parece ler nas milhares de elegias impressas
nestes dias de luto, recuso-me a esquecer o revolucionário que, de punho
fechado, lutou com dureza para conseguir ser, um dia, o Mandela delicodoce que
os poderosos do mundo celebram e, muito justamente, homenageiam.
PS: A semana
passada analisei um texto da Agência Ecclesia que fazia a síntese de uma
comunicação do Papa Francisco e onde aquela agência destacava o que achava ser
mais relevante desse texto papal. Por lapso, não referi a qualidade de resumo
desse texto - o que justificou a minha crónica -, o que poderia dar a ideia de
que a agência não fez outros despachos sobre o tema, o que é, obviamente, falso.
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