José Goulão –
Jornal de Angola, opinião
É um imitador de
Blair com 20 anos de atraso, um copiador das teses de Thatcher, um bisneto dos
rapazes de Chicago que inspiraram e guiaram as gentes que serviram o carrasco
Augusto Pinochet no Chile
Não surpreende que
Matteo Renzi seja um golpista, civilizado por certo porque agora o sangue não
escorre das mãos mas das canetas, vedeta de capa fashion da Vanity Fair, feira
das vaidades que cabe em todas as línguas, um homem adequado para um anúncio da
Old Spice, enfim, um político moderno, com um programa “fluido” adaptado às
circunstâncias do mercado, vale por dizer um dirigente sem programa nem coluna
vertebral.
Matteo Renzi é o próximo primeiro ministro de Itália. Para tal demitiu um
companheiro do seu partido, o Partido Democrático, depois ter chegado à cabeça
da organização com a promessa simples de correr com a velha guarda e de ter
chamado à sede o vetusto Silvio Berlusconi, por sinal acabadinho de cair em
desgraça, condenado pela justiça, expulso do Senado. Nesse encontro
“histórico”, como costuma dizer a comunicação que julga que a História começou
há dias, o novato, “ágil e inovador” Renzi e o caduco e ressuscitado Berlusconi
combinaram o golpe: fabricar uma lei eleitoral que “acabe com a instabilidade
política em Itália” instaurando um sistema bipartidário em que os dois e os
respectivos herdeiros ou mandatados partilhem comodamente o poder político,
coisa que pertence aos monstros sem rosto da finança mundial. É mais ou menos a
fase em que estamos do golpe a que chamam florentino porque Renzi chegou da
Câmara de Florença, onde fez florescer a demagogia que o catapultou para os
actuais voos. Matteo Renzi, o autoproclamado chefe “da esquerda” em Itália – o
Partido Democrático é a ala “de esquerda” do arco político governante, o
partido único da finança em formato bicéfalo – acaba de provocar a demissão do
governo de Enrico Letta, seu companheiro de partido, e vai tomar-lhe o lugar.
A coligação com Berlusconi dará poderes constituintes à actual legislatura, de
modo a formalizar a lei eleitoral que permitirá aos eleitores a escolha simples
entre a “esquerda” e a direita do sistema económico neoliberal. Berlusconi
declara-se aliviado: assim nunca mais terá de governar aliado “à esquerda”.
Pois não: a maioria será sempre, com absoluta certeza ditada por lei, de um ou
outro. Um golpe fino, civilizado.
Quanto à “esquerda” de Renzi não há muito de inovador, desde Blair está
espelhada em vários casos como os actuais de Hollande em França e dos sociais
democratas na Alemanha. A origem política de Matteo Renzi nada tem a ver com a
esquerda, ele chega das áreas da democracia cristã e também essas pouco têm a
ver com a original, a doutrina social da Igreja é uma coisa arcaica na
política, o Papa Francisco que o diga. Para que conste, o programa do novo
primeiro ministro de Itália para tomar conta do seu partido resumiu-se a
afastar os poucos restos de comunistas e socialistas que havia desde que os
históricos PCI e PSI se diluíram, há 25 anos, nessa bagunça que é o PD à
americana, tão nova esquerda como velha direita.
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