domingo, 2 de março de 2014

Angola: A NOVA PAUTA ADUANEIRA



Filomeno Manaças – Jornal de Angola, opinião

No ano em que Angola se prepara para assinalar o 12º aniversário da paz e a pouco mais de um mês de ter lugar o acontecimento, uma nova Pauta Aduaneira entrou em vigor. A princípio pode parecer que não há relação entre uma e outra coisa.

Mas se atentarmos aos factos e ao percurso da economia nacional veremos que a nova Pauta Aduaneira já reflecte e atesta que temos resultados palpáveis do grande esforço feito para o relançamento da produção interna.

A evidência mais significativa desta grande mudança e que a nova Pauta Aduaneira traduz com particular notoriedade está no facto de observarmos uma diminuição substancial dos produtos livres de impostos. Antes eram 2.576 e agora são 366. Outrossim antes uma taxa de dois por cento incidia apenas sobre 914 produtos, ao passo que agora alarga-se o leque a 1.150. Um agravamento significativo das taxas - que varia dos dez por cento a 50 por cento - recai sobre vários produtos importados, muitos deles já em produção no país ou susceptíveis de serem produzidos em quantidades suficientes para abastecer o mercado.

Dois resultados são esperados com a aplicação da nova Pauta Aduaneira. Um primeiro está relacionado com o aumento das receitas fiscais arrecadadas pelo Estado e um segundo tem a ver com o incentivo à produção nacional, que cada vez mais dá mostras de estar a aumentar e a precisar de um mercado devidamente estruturado e funcional para colocar as mercadorias ao alcance dos grandes e pequenos consumidores. É o que o Programa de Aquisição de Produtos Agro-Pecuários (PAPAGRO) tem procurado fazer, dando uma contribuição valiosa quer aos produtores/fornecedores quer aos comerciantes, não obstante existirem reclamações da parte dos primeiros que devem ser tidas em conta, porém próprias de um processo que está apenas no seu início e sinal de que os mecanismos de interacção podem e devem ser melhorados. Trata-se de uma experiência nova e impõe-se dizer que mesmo em mercados já com tradição e onde os processos de comercialização já estão devidamente consolidados ocorrem também conflitos de interesses. Mais do que apontar defeitos ao PAPAGRO - acrónimo  em relação ao qual não nutro simpatia, mas vergo-me à velha e sábia máxima segundo a qual o aspecto não faz a função, do mesmo modo que o mais importante não é o nome do programa mas sim a sua essência -, o que é de sublimar é o facto de ter dado início a um processo fundamental de estruturação do escoamento da produção agrícola, sua conservação e colocação para consumo nas grandes superfícies comerciais. É óbvio que isso não interessa a quem compra produtos fora e coloca cá a um preço mais elevado.

Voltando à vaca fria, e como exemplo ilustrativo de que cada vez mais a produção nacional está a permitir substituir as importações, é o facto de o feijão ter sido o produto cuja taxa mais subiu: em 2007 era apenas de cinco por cento e agora os importadores passam a pagar 45 por cento e o consumidor mais dez por cento. Caminhamos para uma realidade completamente nova no país, que era impensável em 2002, quando se assinou o Memorando do Luena que trouxe a paz para os angolanos, e o ambiente generalizado era o de uma Angola em escombros por causa da guerra. Uma economia a viver de fenómenos altamente especulativos, uma produção agro-pecuária em bancarrota, um país à mercê das ajudas alimentares do Programa Alimentar Mundial, milhares de cidadãos deslocados do seu habitat e impedidos sequer de se dedicar à agricultura de subsistência, milhares de crianças afectadas e a morrer diariamente devido à fome, populações inteiras votadas à indigência, tal era o cenário de há 12 anos.

Hoje temos uma economia que avança firme para a prosperidade e um Programa Integrado de Desenvolvimento Rural e Combate à Pobreza em execução que promete levar importantes mudanças estruturais ao modus vivendi da população camponesa, no sentido de melhorar a sua qualidade de vida. Levar o desenvolvimento ao mundo rural é uma forma de travar o êxodo das populações do campo para a cidade, principalmente para Luanda, que era suposto diminuir com o fim da guerra, mas que as assimetrias que a própria contribuiu em grande medida para cavar entre a capital e o resto do país serviram para o incentivar.

Da nova Pauta Aduaneira, além dos resultados indicados, o que se espera é que as entidades que velam pela fiscalização se encarreguem de acompanhar e exigir o seu cumprimento, já que é sabido que importadores e comerciantes há que se furtam ao que é de lei.

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