Jacarta, 19 mar
(Lusa) - O primeiro-ministro de Timor-Leste, Xanana Gusmão, justificou hoje em
Jacarta, na Indonésia, a compra de armas ao país vizinho evocando razões
económicas e lembrando que Timor-Leste deu "um exemplo de
reconciliação" ao mundo.
A Fundação Mahein -
Monitorização, Pesquisa, e Advocacia do Setor da Segurança criticou, em
fevereiro, a compra, invocando razões de moralidade e a qualidade do material.
"Se queremos
comprar coisas para fazer guerra, compramos todos ao Estados Unidos",
ironizou o chefe do Governo timorense, em declarações à agência Lusa, à margem
do quarto Diálogo Internacional sobre Defesa de Jacarta, na Indonésia.
O primeiro-ministro
timorense apontou sobretudo "razões monetárias" para a escolha da
Indonésia, tal como para a compra de "dois barcos de patrulha à
China".
Xanana Gusmão, que
tem também a pasta da Defesa, recordou que "mais de 70 por cento do
comércio" do país é com a Indonésia e defendeu que se a compra tivesse
tido em conta o passado, Timor-Leste teria de "comprar só as [armas] da
Austrália".
"Mas porquê à
Austrália, se a Austrália apoiou os indonésios a matarem-nos? Ora, vamos
comprar a quem?", completou, recusando-se, no entanto, a falar em feridas
do passado.
"Nós demos um
exemplo de reconciliação ao mundo", vincou Xanana Gusmão, lamentando que o
Cambodja ainda esteja "a explorar as feridas" do passado e que Israel
e Palestina nunca mais resolvam os seus problemas "por causa desta coisa
de estar constantemente ferido".
O regime ditatorial
de Suharto ocupou Timor-Leste de dezembro de 1975 a outubro de 1999, numa ação
que terá feito perto de 100 mil mortos numa população de cerca de um milhão.
Questionado também
sobre se teme que o eventual regresso de elementos das antigas milícias
pró-Indonésia que se encontram refugiados na parte indonésia da ilha de Timor
cause problemas entre os timorenses, o governante respondeu que não.
Em causa está o
facto de as autoridades de uma aldeia de Timor Ocidental, junto à fronteira,
terem começado, no final de fevereiro, a identificar e a deportar cidadãos
timorenses por causa das eleições legislativas de 09 de abril, segundo uma
notícia do jornal The Jakarta Post.
"Penso que
não. Hoje temos mais de seis a oito milhares de estudantes a virem para aqui,
portanto essa é uma questão do passado", respondeu.
Apesar de admitir
que esses elementos pró-Indonésia se sintam protegidos do outro lado da
fronteira, Xanana Gusmão sublinhou que "não se pode dizer que depois da
independência" Timor-Leste tenha fechado "as portas todas", até
porque "eles vão e vêm".
"Respeitamos
as medidas tomadas pelas autoridades da Indonésia, na medida em que precisam de
uma certa estabilidade", referiu, respondendo que os líderes indonésios
"estão todos ocupadíssimos com as campanhas" eleitorais, quando
questionado se abordou o assunto junto de responsáveis do país vizinho.
O chefe do Governo
timorense mostrou-se ainda confiante de que a disputa sobre a pequena
percentagem da fronteira entre a Indonésia e Timor-Leste por delimitar fique
resolvida em 2014, por esperar que o Presidente indonésio, Susilo Bambang
Yudhoyono, antes de terminar o mandato, em outubro, se desloque a Timor-Leste e
fale com o seu homólogo timorense, Taur Matan Ruak.
"De certa
forma, estamos todos de acordo (...) A delimitação que nos guia é o acordo que
portugueses e holandeses fizeram há anos atrás", disse, lembrando que a
discussão deve envolver as comunidades locais.
Questionado ainda
sobre os seus planos para depois de abandonar o cargo de primeiro-ministro este
ano, o líder histórico da resistência à ocupação indonésia de Timor-Leste não
se mostrou interessado em eventualmente ocupar um cargo internacional.
"Não é Timor
que precisa de mim, eu é que preciso de contribuir ainda", esclareceu,
concretizando que deseja apoiar o país "com umas ideias", enquanto
regressa ao seu "sonho", "cultivar abóboras".
AYN // VM - Lusa
Sem comentários:
Enviar um comentário