Ilia Kharlamov – Voz da
Rússia
As “duas Ucrânias”,
a ocidental e a oriental, têm talvez uma última oportunidade para continuarem
unidas na sua viagem pela história.
Essa oportunidade é
a federalização do país ainda unido com base no respeito mútuo e na concessão
de poderes alargados às regiões. Analisando o exemplo de um dos territórios
ocidentais, o distrito de Lvov, podemos verificar quais são as diferenças entre
os ucranianos ocidentais e os habitantes do Sudeste.
A orientação
política, de mentalidades e cultural e religiosa do distrito de Lvov, que
antigamente, em conjunto com os distritos de Ivano-Frankivsk e Ternopol,
formava a Galichina ou Galícia, foi definida pela sua história. Em primeiro
lugar, pelos muitos séculos de pertença à Polônia e ao Império Austro-Húngaro.
Ao contrário de Donetsk, Carcóvia ou Lugansk, que até à revolução de 1917
pertenciam à Rússia, Lvov e seus arredores se consideram de certa forma como um
produto da civilização ocidental. Se isso é verdade ou não, podemos verificar
pelo comportamento dos ativistas do movimento Maidan e pelos combatentes de
organizações radicais neonazistas que hoje atuam na Ucrânia, as quais são
compostas por habitantes do Ocidente do país, incluindo do distrito de Lvov.
O cientista
político Nikolai Sorokin caracteriza da seguinte forma a diferença entre o
Leste e o Ocidente da Ucrânia:
“Sua identidade é
completamente diferente. O distrito de Lvov, tal como os de Ivano-Frankivsk e
de Ternopol, evoluíram durante muitos anos não como parte da grande Rússia, mas
sob influência do Vaticano, da Igreja Católica, da Polônia e da
Áustria-Hungria. Eles estiveram mais de 600 anos desligados da Rússia. Nesse
contexto, sua identidade não é ucraniana ou russa, mas é uma identidade de um
país completamente diferente. Se trata de pessoas diferentes, eles pensam e
sentem de forma diferente, eles têm estereótipos de comportamento diferente”.
O distrito de Lvov,
dentro dos seus limites atuais, só foi formado em finais dos anos de 1930 por
decreto do Presidium do Soviete Supremo da URSS. Na realidade, toda a Ucrânia
atual é um produto da “engenharia geopolítica” soviética. Atualmente Lvov com
seus arredores tem mais de dois milhões e meio de habitantes, cuja esmagadora
maioria está registada oficialmente como sendo ucranianos. A segunda etnia mais
numerosa são os russos. A economia da região não é das melhores: ela nem faz
parte das dez regiões economicamente mais importantes. Da sua população ativa,
a maior parte dos habitantes está ocupada no comércio e na agricultura. Aliás,
os radicais da Ucrânia ocidental preferem não dar atenção ao fato de eles, seus
familiares, vizinhos e conhecidos viverem em grande parte à custa de uma
Ucrânia oriental industrializada. Os nacionalistas se consideram a si próprios
como uma espécie de “patrícios”, eleitos de Deus, enquanto a população de
língua russa seriam plebeus sem direitos, nem voz, cujo lugar são as minas ou
as pedreiras. Contudo, o Sudeste da Ucrânia demonstra com convicção que não
tenciona aceitar essa situação.
O analista Dmitri
Abzalov pensa que as raízes dos problemas atuais estão no passado:
“O próprio processo
de formação da Ucrânia pressupõe diferentes orientações culturais, religiosas,
políticas e econômicas. Estava previsto que todas essas tendências seriam
digeridas pelo Estado ucraniano que iria formular o que é o cidadão da Ucrânia,
tal como foi feito pela Rússia”.
Mas isso não
aconteceu e pelas mais variadas razões. Nesse aspeto não seria demais referir
uma particularidade do distrito de Lvov: a elevada religiosidade dos seus
habitantes. A região conta com o maior número de comunidades religiosas de toda
a Ucrânia.
O lugar principal é
ocupado pelos greco-católicos ucranianos e pelos ortodoxos do Patriarcado de
Kiev, não-canônico. Também estão amplamente representados os pentecostais, os
batistas, as Testemunhas de Jeová e os Adventistas do Sétimo Dia. Nessa
variedade de correntes religiosas estão praticamente ausentes os ortodoxos tradicionais,
o que apenas comprova a diferença colossal, inclusivamente religiosa, entre as
duas Ucrânias.
Mas isso não significa de
forma alguma que elas não possam coexistir dentro de um mesmo país. No mundo
existem muitos exemplos semelhantes. O principal é encontrar uma base
mutuamente aceitável, mas isso é hoje um grande problema devido sobretudo aos
esforços dos neonazistas.
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