sexta-feira, 27 de junho de 2014

Portugal: O PS ESTÁ CHEIO DE TRALHA POR TODOS OS LADOS



Ana Sá Lopes - jornal i, opinião

A autofagia só será útil se produzir uma verdadeira catarse no partido

Lê-se 20 vezes e não se acredita. A direcção do PS decidiu não condenar expressamente o já famoso mail divulgado pelo "Correio da Manhã" e pelo "Jornal de Notícias" em que uma dirigente socialista, membro da Comissão Nacional, apela à inscrição em massa nas primárias de alegados simpatizantes de António José Seguro, quer sejam quer não sejam simpatizantes do PS - "nas legislativas votam onde entenderem, no dia 28 de Setembro temos de votar Seguro". A ausência de uma condenação firme por parte de Seguro (Miguel Laranjeiro referiu-se-lhe apenas como "iniciativa individual") lança obviamente uma suspeita sobre todo o processo de primárias proposto pelo secretário-geral e a dúvida sobre se "iniciativas individuais" deste género não estarão a ser multiplicadas por esse país fora.

O caso em si é gravíssimo, mas ainda se torna mais grave quando as declarações de dirigentes nacionais como António Galamba e Miguel Laranjeiro não o condenam objectivamente. E é evidente que a partir daqui qualquer pessoa se pode perguntar se a direcção de Seguro não estará a pactuar com o processo de arrebanhar militantes, sejam simpatizantes do PSD, do PCP ou do CDS, desde que tudo sirva para correr com "a tralha socrática" que está colada à candidatura de António Costa. O mail - e a complacência da direcção com essa peça política - é um exemplo acabado da existência de uma "tralha segurista" que não vai olhar a meios para atingir (se conseguir) os fins. Seguro respondeu ao desafio de Costa - e ao seu resultado de 31% nas eleições europeias - com o facto de se estar perante uma crise do regime (o que é absolutamente verdade) de que a mistura entre política e negócios é das mais graves manifestações (o que é totalmente verdade e no que os socialistas estão carregados de culpas). Infelizmente, ontem Seguro foi incapaz de condenar uma manifestação dessa crise de um dos seus defensores dentro do partido.

A autofagia que varre o PS e que vai continuar até 28 de Setembro só terá uma vantagem se produzir uma verdadeira catarse sobre o partido, os seus métodos, a sua história enquanto foi governo, os fenómenos de enriquecimento de alguns dos seus dirigentes e ex-dirigentes mais destacados, a promiscuidade entre partido, Estado e interesses económicos. Só dessa discussão pode sair alguma luz. O PS está cheio de tralha por todos os lados, e isso aplica-se ao passado e ao presente.

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