Folha
8, 28 junho 2014
Com
o fim do reinado do actual Presidente de Moçambique, Armando Guebuza,
multiplicam-se as informações de que o país quer afastar-se do domínio que
Angola exerce, seja a nível regional ou da Comunidade de Países de Língua
Portuguesa. Mas há quem não acredite nisso. Entendem que, afinal, tudo mão
passa de uma estratégia para sossegar os que querem menos MPLA no seio da
FRELIMO.
Por
isso, segundo o dirigente político da oposição moçambicana Manuel de Araújo,
actual edil de Quelimane, centro de Moçambique, diz que Guebuza está
“apaixonado” pelo modelo económico de Angola.
“Armando
Guebuza está a copiar o modelo angolano. Já imitamos a ‘solução final’ tipo
UNITA, ao encurralarmos Dhlakhama (RENAMO) e a filha do nosso presidente é uma
fotocópia da do Presidente José Eduardo dos Santos. Ele está apaixonado por
Angola”, disse Manuel de Araújo durante um debate no seminário “Estoril Political
Forum 2014” .
Manuel
Araújo, que é dirigente do Movimento Democrático de Moçambique (MDM),
respondia assim a uma intervenção de Fátima Roque, antiga dirigente da UNITA e
depois convertida aos dólares do MPLA, que não concordou com as opiniões dos
participantes no debate “Africa: O Futuro da Democracia”, que apontaram Angola
como “um regime totalitário”, não democrático.
“Para
mim, democracia é democracia. Ou é democracia ou não é democracia, não há
democracia da Ásia ou da África. Há democracia”, disse ainda Manuel de Araújo,
respondendo a Fátima Roque.
Para
Manuel de Araújo, formado em
Relações In ternacionais no Reino Unido, o continente
africano é pobre “em matéria de democracia” porque, entre outros factores,
existe uma complexa relação entre a pobreza e a riqueza, não se verificam
alternâncias políticas e as “oposições são vistas como um inimigo a abater”.
O
dirigente do MDM, que foi reeleito nas eleições autárquicas de 2013, falou
ainda da capacidade dos militares, no continente, em se oporem à profissionalização
das Forças Armadas dos vários países provocando, desta forma, ingerências
politicas e baixos níveis de profissionalização dos Estados.
“A
solução é a criação de imperativos através da educação e formação de elites interessadas
no bem público capazes de contrariarem os Estados autocráticos. A prática é
que os poderes capturam o Estado em nome dos interesses de uma minoria
política, militar e, em alguns casos, étnica”, disse Manuel de Araújo
criticando a falta de interesse dos “países ocidentais”, nas questões políticas
e de boa governança nos Estados africanos.
“Para
algumas poderes em África, a China é agora uma solução para as sociedades
africanas. As elites africanas, no poder, já tinham adoptado o antigo modelo
autoritário soviético com o mesmo argumento de que eram soluções. Agora existe
o apetite para o modelo chinês e não há condicionalismos para as intervenções
económicas”, criticou Manuel de Araújo.
Também
para Armindo Tambo, da Universidade Católica de Moçambique, a democracia em
África “está em processo” e assim vai continuar por muito tempo.
“Em
Moçambique ou em Angola - na prática - o que temos não é democracia. Existe uma
tendência de imposições e se formos ao concreto existe uma discrepância em termos
de investimentos. A desigualdade é um problema fulcral e tudo isto tem de se
pôr sob contextos políticos”, disse Tambo.
“A
nova geração tem de estar enquadrada na Educação para que, no futuro ou em
algum momento, possamos ter democracia”, sublinhou Armindo Tambo.
Sobre
o caso específico de Moçambique, Eugénia Gamboa, da Universidade Católica e
conselheira do ministro da Educação português, Nuno Crato, disse que a RENAMO
(Resistência Nacional Moçambicana) “não tem planos de futuro” e a FRELIMO, partido
no poder, passou a ser um executor do financiamento externo não apresentando
ideias políticas nem planos de governo.
Para
Eugénia Gamboa, a falta de investimento no ensino e a ausência de monitorização
são duas questões fundamentais que devem ser resolvidas, em Moçambique.
“Os
programas são pensados mas não são monitorizados. Por exemplo, nos grandes
desígnios de combate à SIDA houve um programa de distribuição de cestas básicas
aos doentes afectados, mas houve pessoas que se infectaram deliberadamente
para terem acesso ao cesto básico e isto é um mero exemplo de políticas onde
não há consequências”, afirmou.
O
“Estoril Political Forum 2014”
foi organizado pela Universidade Católica e teve como tema as quatro décadas da
revolução portuguesa (1974) e os 25 anos da queda do Muro de Berlim (1989).
ANGOLANOS
RUMAM PARA O ÍNDICO
O
número de angolanos que solicitam vistos para entrada em Moçambique, a partir
de Luanda, praticamente triplicou entre 2011 e 2013, de acordo com números
divulgados pela embaixada moçambicana.
Segundo
a mesma informação oficial, em 2011 os serviços consulares daquele país em
Angola registaram 1.138 pedidos de visto para Moçambique, número que subiu para
1.194 no ano seguinte. Já em 2013, esse número atingiu os 3.228 vistos, ou
seja praticamente o triplo face a 2011.
No
sentido contrário, a embaixada de Moçambique em Luanda estima que cerca de mil
cidadãos nacionais residam actualmente em Angola.
A
livre circulação de pessoas entre Angola e Moçambique “está para breve”, de
acordo com a garantia transmitida a 5 de Junho pelo ministro da Planificação e
Desenvolvimento moçambicano, Aiuba Cuereneia, que acrescentou que se aguarda
apenas pela resposta das autoridades angolanas.
Moçambique
não exige vistos aos cidadãos dos países da Comunidade para o Desenvolvimento
da África Austral (SADC, na sigla em inglês), excepto no caso de Angola, em que
essa supressão está a ser negociada desde 2007.
No
entanto, disse na mesma ocasião o governante moçambicano, a isenção da
necessidade de vistos para Angola “está para breve, as negociações estão em
curso, e na próxima reunião da comissão mista vai sair alguma coisa”.
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